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FAZENDO A MÍDIA
USO RADICAL
DA BLOGOSFERA
FEZ DESTA
ELEIÇÃO
A 1ª A PÔR
EM CRISE
A DEMOCRACIA
REPRESENTATIVA
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EUCLIDES SANTOS MENDES
COLABORAÇÃO PARA A FOLHA
Os meios de comunicação deram à
campanha norte-americana atenção e espaço poucas vezes vistos numa disputa
eleitoral. Mas, para a professora da Escola de Comunicação
da Universidade Federal do
Rio de Janeiro Ivana Bentes, a
mídia não "elegeu" o democrata Barack Obama. "Mesmo seduzida por ele, a mídia não tem
fidelidade a nenhum candidato", diz na entrevista abaixo.
FOLHA - Por que a crise financeira e
a eleição presidencial nos EUA monopolizaram a mídia mundial por
várias semanas, mesmo havendo
hoje um acesso inédito a múltiplos
meios de informação?
IVANA BENTES - Os dois "fenômenos" andam juntos.
A eleição de Obama e a crise
financeira apontam para um
cenário de co-dependência global em que as crises, celebrações e lutas explodem as fronteiras nacionais e trazem o vislumbre do que poderia ser, potencialmente, uma mídia e uma
democracia globais e também
um "presidente das multidões".
A eleição do primeiro presidente negro dos EUA foi uma
resposta ao Estado militarizado de Bush e ao terrorismo econômico dos mercados financeiros. Só que a mídia não politiza
a crise financeira, apresentada
na TV como se fosse uma "catástrofe natural".
A "resposta Obama", de uma
mudança possível, seduz eleitores, a mídia e o imaginário
global diante desse terrorismo
de Estado e de mercado.
FOLHA - Até que ponto os meios de
comunicação contribuíram para alavancar a imagem do candidato democrata?
BENTES - Não foi a mídia que
elegeu Obama, mas, sem dúvida, a sua biografia e a postura
"cool", de um afro-americano
que, nos discursos de campanha, saudou negros e brancos,
gays e héteros, hispânicos, africanos, as mulheres etc.
Ao mesmo tempo, a mídia e o
próprio Obama apelaram para
a imagem do "pós-negro", para
um multiculturalismo esvaziado de conflitos. É claro que isso
seduz, simbolicamente, num
país tão atravessado por clivagens raciais e com uma política
tão dura contra os "outros".
Mas ninguém foi "manipulado" pela mídia. Mesmo esse
multiculturalismo soft, diante
da era de intolerância e racismo
do governo Bush, tem um poder simbólico grande.
Mas, mesmo "seduzida" pela
novidade, a mídia não tem "fidelidade" a nenhum candidato.
Basta ver o exemplo brasileiro.
Lula começou o primeiro mandato na bancada do "Jornal Nacional", com telebiografia celebratória de sua trajetória, tão
fabulosa quanto a de Obama, e,
quatro anos depois, quase foi
destituído na crise político-midiática, antes da reeleição.
FOLHA - As novas mídias, sobretudo a web, tiveram papel central na
campanha. Após esta eleição, o que
muda na relação da mídia tradicional (jornal, TV, rádio) e das novas mídias com a política?
BENTES - Os eleitores de Obama
mobilizaram a blogosfera.
O candidato teve recorde de
doações pela internet para sua
campanha, sendo financiado
pelos próprios eleitores, fato
inédito.
Respondeu a acusações postando vídeos no YouTube, disseminando imagens no Flickr,
mensagens diretas para os celulares dos eleitores e mensagens instantâneas no Twitter,
seguidas por milhões na rede.
A possibilidade de uma "democracia participativa" (apesar
do caráter representativo e indireto do sistema de votação
nos EUA) surge nessa forma
potencial de uso das redes sociais, de relacionamento e compartilhamento.
Por meio delas, o eleitor
constrói a informação, intervém nos discursos, reage contra a mídia tradicional, repercute, interage e se mobiliza numa forma de ativismo que coloca em xeque a centralidade da
mídia tradicional e da democracia representativa.
TVs e jornais tiveram que se
associar à internet, ao YouTube, fazer debates on-line com a
participação dos internautas.
Um dos primeiros fatos midiáticos na campanha de Obama surgiu quando uma eleitora
escreveu o nome do candidato
no traseiro, criou um jingle divertido e postou esse vídeo de
"agitprop" no YouTube, obtendo milhões de cliques de atenção na mídia global.
Num só ato, sublinhou a caretice do marketing político
tradicional e apontou para uma
questão decisiva: cultura política descentralizada, heterogênea e novas formas de ativismo.
FOLHA - Obama seria o "Príncipe
Eletrônico" (conceito pautado na relação entre política e mídia) preconizado pelo sociólogo Octavio Ianni?
BENTES - Obama me parece estar num lugar de passagem, em
que está em jogo a crise da democracia representativa, a
emergência de uma democracia participativa, a descrença
no mercado financeiro, a crise
do Estado-nação, dos nacionalismos e "soberanismos", a
emergência de uma democracia global.
No que nos diz respeito, ele é
o devir-periférico do mundo.
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