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Ponto de Fuga
As pérolas do inferno
Anthony Steffen
e Clint Eastwood são parecidos: mesmo tipo físico magro e alto,
um pouco anguloso; mas Eastwood possui algo de espectral, e Steffen é mais físico
JORGE COLI
COLUNISTA DA FOLHA
Há um certo tipo de filme
que desperta paixões
em admiradores fervorosos. Não é simples definir.
Como boa parte foi rodada na
Europa, há uma expressão consagrada, mas restritiva e genérica: eurotrash, ou seja, lixo europeu. A noção de lixo, de fato,
corresponde a algumas características: filmes de baixo orçamento, sem pretensões autorais, destinados a um público
popular. Os "westerns spaghetti" (porque de origem italiana),
os "gialli" (policiais também
italianos), o terror, as fantasias
eróticas, os épicos passados na
Antigüidade greco-romana, em
que os heróis eram Maciste ou
Hércules.
Tiveram seu apogeu nos
anos 1960 e 1970. Quando
eram lançados nos Estados
Unidos, muitos atores e diretores italianos ou espanhóis
substituíram seus nomes para
enganar o público local, para
fazer crer que se tratava de produções americanas. Eram lançados e relançados, como novos, com títulos diferentes.
Esse monturo foi bom adubo: o talento, por vezes o gênio
de certos diretores aparecem
hoje com grande evidência.
Sergio Leone triunfou: irrompeu com um estilo poderoso,
renovando o gênero do western. Inventou Clint Eastwood,
que, sem ele, não seria o mesmo hoje.
Outros tiveram carreiras
mais discretas: Bava, Fulci, Argento, Freda, Jesus Franco,
Tinto Brass. Aos poucos, tornam-se mais e mais reconhecidos. Algumas de suas obras foram reconstituídas com cuidado. Trata-se de verdadeira busca arqueológica. Velhas cópias
cheias de lacunas, dubladas em
línguas diversas, fornecem
fragmentos para a restauração
possível.
A.K.A.
Daniel Camargo, Fábio Vellozo e Rodrigo Pereira são cinéfilos apaixonados que sabem
ver essas jóias com aparência
de lixo. Lançaram um livro curioso e importante. Nele, retraçam a vida e a carreira de um
ator ítalo-brasileiro, estrela
dessa cinematografia.
O pai desse artista, playboy,
corredor automobilista, pertencia à família do barão de
Teffé, cuja saga é, ela própria,
mirabolante e extraordinária.
Teve um filho natural nascido no palácio Doria Pamphili,
um esplendor que é a embaixada brasileira na Itália. O menino chamou-se Antonio Luiz de
Teffé. Depois, mudou Antonio
para Anthony e acrescentou
um esse e um ene ao sobrenome. Virou Anthony Steffen.
Nasceu no mesmo ano em que
Eastwood, 1930. Morreu no Rio
de Janeiro, em 2004.
O livro, publicado pela editora Matrix, tem o título "Anthony Steffen - A Saga do Brasileiro Que Se Tornou Astro do
Bangue-Bangue à Italiana".
Espelho
Anthony Steffen e Clint Eastwood são parecidos. Mesmo tipo físico magro e alto, um pouco anguloso. Mas Eastwood
possui algo de espectral, de
imaterial, e Steffen é mais físico, mais "encarnado", de grandes olhos tristes.
O filme "Django, o Bastardo",
dirigido por Sergio Garrone
(com roteiro do próprio Steffen, 1969, DVD New Line) é evidente precursor de "Um Estranho sem Nome", primeira
obra-prima de Eastwood como
diretor (1972, DVD Universal).
Lorde
Steffen impõe imediatamente uma autoridade aristocrática
e melancólica. É miraculoso
ver como sua presença basta
para criar uma atmosfera de
dignidade no hiper-trash "Escape from Hell" (Fuga do Inferno, 1980, DVD Troma), que se
passa numa prisão tirânica, situada nos trópicos, pretexto
para mostrar a nudez de mulheres exuberantes, bonitas como aquelas dos stripteases no
finado Teatro de Alumínio, da
praça da Bandeira, em São Paulo. Se é que essa alusão diz ainda alguma coisa para alguém.
jorgecoli@uol.com.br
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