São Paulo, domingo, 11 de fevereiro de 2001

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Ensaio de Gilberto Dupas faz diagnóstico do futuro
O tamanho da encrenca

André Singer
da Reportagem Local

O pequeno livro de Gilberto Dupas, "Ética e Poder na Sociedade da Informação", faz um diagnóstico ágil e inquietante a respeito do futuro. O ponto de partida é simples. A inovação tecnológica tornou-se agente de transformações gigantescas na sociedade contemporânea. Os modos de produzir, de se relacionar e até de morrer foram chacoalhados por milagres como o laser, a informática e a manipulação genética. Ocorre que a sociedade perdeu o controle sobre a dinâmica do saber científico, que, por sua vez, alimenta o contínuo surto de novidades técnicas. Para Dupas, o fluxo de conhecimento foi amplamente hegemonizado pelo capital. É nos grandes laboratórios das empresas transnacionais que se gesta hoje o amanhã de todos nós.

Consequência dramática
Isso tem uma consequência dramática: o destino da humanidade está sendo regido pela busca de lucro e poder e não pela procura do bem, verdade e beleza, critérios que dariam um sentido progressista ao avanço do conhecimento. O resultado da autonomização da ciência com respeito às determinações éticas é que o progresso pode levar à destruição, e não à realização dos sonhos de libertação humanos. Desemprego em massa em lugar de poucas horas de trabalho criativo. Miséria em meio ao luxo, e não dignidade para todos. Desastres ecológicos ali onde se havia imaginado harmonia com a natureza. O relato de Dupas a respeito do mundo criado pela tecnologia sob hegemonia do capital é dos mais sombrios. Como o autor, além de respeitado economista, tem larga experiência como consultor na área de negócios, convém prestar atenção ao que ele diz. O problema está na forma de pensar as saídas. Dupas sugere que é necessário criar uma nova hegemonia, no sentido de uma liderança moral capaz de controlar e conduzir o processo de inovação tecnológica de modo que a Justiça prevaleça sobre o interesse econômico. Quanto ao fim, nada a discordar. A questão é como tal hegemonia poderia ser exercida.

Democracia
O melhor meio até aqui inventado para a legitimação da liderança é a democracia, entendida como o sistema em que a maioria escolhe entre partidos diferentes aquele que dirigirá o Estado. Dupas endossa a democracia, mas assinala que ela passa por um momento difícil.
"Os partidos políticos e lideranças mundiais (...) estão envolvidos em clara crise de legitimidade, seja pela dissonância crescente entre discurso e práxis, seja pela crescente influência do poder econômico nos processos democráticos, tornada pública pelas amplas denúncias de corrupção e suborno."
Não há como superar os escolhos vislumbrados por Dupas sem enfrentar o problema da democracia. O livro não o faz. Tem, contudo, o inegável mérito de apontar com lucidez e fluência o tamanho da encrenca em que estamos metidos. O que não é pouco.



Ética e Poder na Sociedade da Informação
152 págs., R$ 14,00
de Gilberto Dupas. Editora da Universidade do Estado de São Paulo (pça. da Sé, 108, CEP 01001-900, São Paulo, tel. 0/ xx/11/ 232-7171).




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