São Paulo, domingo, 11 de março de 2001

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+ brasil 501 d.C.

Antevisões imperiais

Evaldo Cabral de Mello

Há que esperar pelo século 18 para definir a visão imperial, pressentida nas primeiras crônicas, dessa vez na pena de dois eminentes "estrangeirados", o diplomata d. Luís da Cunha e o duque de Silva Tarouca. Sua inspiração é, portanto, a oposta da de Gabriel Soares ou da do autor dos "Diálogos das Grandezas do Brasil", de vez que ela parte de uma reflexão eminentemente cosmopolita sobre a deterioração do status de Portugal no equilíbrio de poder europeu. O texto em que d. Luís da Cunha formulou a concepção de império luso-brasileiro, as célebres "Instruções" a Marco Antônio de Azevedo Coutinho, data de 1736. A designação de "Instruções", posteriormente conferida ao documento, é, aliás, equivocada, pois, ocupando então d. Luís da Cunha a embaixada em Paris, não poderia dá-las a quem era formalmente seu superior hierárquico.
A premissa de todo o seu plano é o desequilíbrio estrutural de poder entre Portugal e Espanha, decorrente da superioridade do vizinho em termos de extensão geográfica, efetivos demográficos, forças terrestres e marítimas e riqueza nacional e colonial. Do ponto de vista português, desequilíbrio tal fora remediado, até o tratado de Utrecht, pela rivalidade entre a França e a Espanha, mas essa defesa cessara de funcionar desde o momento em que os Bourbon haviam conquistado o trono de Madri, aumentando a crônica insegurança portuguesa. Desde seus dias de representante lusitano à Conferência de Utrecht, d. Luís da Cunha viera cogitando a maneira de sanar o problema.
Ele não nos diz, mas o provável é que tenha inicialmente colocado suas esperanças numa mudança do sistema europeu, de que Portugal pudesse tirar partido. Mas qualquer que ela fosse, as perspectivas não pareciam brilhantes. Nessa situação, d. Luís lançou seu olhar na direção do ultramar. "As conquistas (escreve em 1736), que supus ser um acessório de Portugal, eu as tenho pelo seu principal e ainda garantes da sua conservação, principalmente as do Brasil."

Instrumentalizar o Brasil Até então, o problema se apresentara de maneira inversa, ou seja, como Portugal, enfraquecido na Europa, poderia preservar suas colônias da ambição e do poderio das grandes potências. Agora, tratava-se de instrumentalizar as colônias para reforçar a posição européia de Portugal.
A concepção tinha de parecer aos contemporâneos sutil, mas sobretudo inoperante. Com efeito, se elas necessitavam da metrópole para se defenderem, como poderiam lhe servir de trunfo internacional? A explicação de d. Luís é bem simples: devido ao ouro do Brasil, "a nenhuma potência da Europa convém que ele caia nas mãos de alguma nação que se saiba melhor que nós aproveitar das suas riquezas, pois que com todas as prodigalizamos, indo cavar nas minas para que os estrangeiros recolham as suas preciosas produções". A segurança da América portuguesa podia-se beneficiar assim do próprio equilíbrio de poder europeu, pois sua conquista por qualquer das potências subverteria esse equilíbrio, se tornando assim inaceitável.
Evidentemente, desde a primeira metade do século 16, vale dizer, da época de Carlos 5º, em que o ouro e a prata do México e do Peru afluíram crescente e regularmente a Sevilha, a Europa se dava conta com nitidez de que o controle de domínios ultramarinos poderia ser vital, como era naquele caso, para as pretensões hegemônicas na Europa. Não fora outro o suporte da chamada "preponderância espanhola", título do velho livro do historiador Henri Hauser, nem outro o alvo das potências protestantes, como a Inglaterra e os Países Baixos, quer nos seus ataques diretos a porções do império espanhol na América e na Ásia, quer nas inúmeras tentativas de cortar as comunicações marítimas entre a Espanha e a América espanhola.
Para dar exemplo de casa, a criação da Companhia Neerlandesa das Índias Ocidentais e os ataques que desferiu contra o Brasil foram advogados com base no argumento de que as possessões portuguesas ofereciam o que os estrategistas britânicos da Segunda Guerra Mundial designarão como o "soft belly" da Europa nazista, a Itália, a linha de menor resistência do sistema imperial.
Mas mesmo na dependência dos metais americanos em que se encontrava Madri para suas aventuras imperiais na Europa, o ultramar, embora vital, continuava a ser avaliado como meio, não como fim. Nem sequer ao conde-duque de Olivares, cuja assombrosa imaginação política induzia-o à formulação de planos grandiosos ou excessivamente ambiciosos, que ficavam muitas vezes no papel, ocorreria fundar a posição européia da metrópole na segurança das colônias. E isso por um motivo bem simples: essa inversão dos papéis da metrópole e da colônia não poderia ser pensada por um homem de Estado da Espanha hegemônica, mas poderá sê-lo, um século depois, por um diplomata português obcecado pela insegurança do seu país, que ele descrevia como "uma ourela de terra", um terço da qual permanecia inculta, outro, sob o controle da Igreja e o terceiro, destinado à produção de trigo para consumo nacional, o qual, aliás, era insuficiente para as necessidades dos seus habitantes. Tratava-se provavelmente da primeira vez que tal inversão ocorria a um homem de Estado europeu, um século antes de que George Canning se gabasse de haver promovido a independência do Novo Mundo para reequilibrar a balança de poder do Velho.
D. Luís da Cunha inspirara-se, aliás, em precedente familiar, o do conselho que seu bisavô, Pedro da Cunha, teria dado em 1580 ao prior do Crato, a quem tentara em vão persuadir a embarcar para o Brasil, onde, longe da cobiça e do poderio da Espanha, poderia conservar o título de rei de Portugal graças ao interesse das potências européias em negociar na América portuguesa e em impedir que Felipe 2º viesse também a possuí-lo, se tornando "muito mais formidável do que já era". Aduzia d. Luís da Cunha que, ao tempo da guerra da sucessão de Espanha, Felipe 5º recebera recomendação análoga do duque de Medina Sidônia, o qual, diante da resistência das potências marítimas à ascensão de um Bourbon ao trono de Madri, propusera que El Rei se instalasse no México.
A mesma consciência aguda da insegurança de Portugal está na raiz da visão do império luso-brasileiro, exposta por Manuel Teles da Silva em cartas ao futuro marquês de Pombal. Tratava-se de um "estrangeirado" "sui generis", pois, fugindo em verdes anos, na companhia de um irmão de d. João 5º, para Haia, onde seu pai, o conde de Tarouca, representava Portugal, fora finalmente assentar praça no Exército do príncipe Eugênio. Radicando-se na Áustria, fora feito duque de Silva Tarouca pelo imperador Carlos 6º, havendo servido de conselheiro à imperatriz Maria Teresa e de presidente do órgão que se ocupava da administração austríaca nos antigos Países Baixos espanhóis e nas possessões italianas da Casa de Áustria.

Século turbulento Quando o futuro Pombal ocupou a embaixada de Viena, se tornou amigo íntimo de Silva Tarouca, relação que sobreviveu ao retorno de Carvalho e Melo a Lisboa e à sua nomeação como ministro de d. José 1º, relação cuja importância foi posta em relevo por Kenneth Maxwell. O pai de Silva Tarouca fora colega de delegação de d. Luís da Cunha no Congresso de Utrecht, sendo plausível que as idéias do seu filho devessem algo às do velho diplomata.


O Brasil estava fadado a ter "a mesma figura na América que fazem atualmente na Ásia tantos diversos impérios", como eram a China, o Japão, a Pérsia, o mongol


Como d. Luís da Cunha, Silva Tarouca partia do pressuposto da precariedade insanável da situação do reino "vis-à-vis" da Espanha, acoplando-a à dinâmica do sistema de relações de forças na Europa. "Vivemos em século turbulento (confidenciava desalentado a Pombal em carta de 1756), no qual já vimos bem estranhos trocos (isto é, mudanças); e os que sobreviverem hão-de provavelmente ver outros."
Desde a paz de Ryjswick (1697), em 60 anos "o sistema geral da Europa" havia "mudado grandemente" ao menos "três vezes". "E pode facilmente a nosso respeito mudar-se muito mais em pouco mais de 40, que correrão até o fim do nosso século 18." O estado atual das coisas era o oposto do que vigira então.
Agora era a Casa de Bourbon que também reinava em Madri, dispondo das forças terrestres e navais mais numerosas que se haviam visto ali desde o reinado de Felipe 2º. É certo que a rainha católica, Bárbara de Bragança, mulher de Fernando 6º, era portuguesa, mas não tivera filhos, com o que a herança da coroa espanhola recairia no cunhado, o futuro Carlos 3º. Destarte, a união das coroas da França, da Espanha e de Nápoles na Casa de Bourbon parecia mais sólida e internacionalmente mais influente do que nunca.
Podia-se, portanto, dar como coisa do passado "a bela conjuntura na corte de Madri", vale dizer, os anos da amizade estreita entre os dois reinos peninsulares, cultivada após a ascensão de Fernando 6º ao trono, a qual permitira inclusive a conclusão do tratado de Madri (1750), que procurara solucionar as querelas territoriais hispano-portuguesas na América meridional. Temia Silva Tarouca que, instalado em Madri, o Bourbon de Nápoles viesse a reeditar os manejos do cardeal Alberoni, antigo ministro de Felipe 5º, visando a se apossar de Portugal, dando em compensação aos Braganças os domínios italianos da família.
"Possuindo El Rei Católico a Espanha inteira, com as suas Índias e Brasil, se faria a principal potência na Europa pela dependência em que poria pelo comércio todas as outras", graças à cumplicidade da França e da Inglaterra, que não "teriam escrúpulos de abandonar e vender Portugal a Castela para conservar e avantajar seus comércios". Particularmente preocupante parecia a Silva Tarouca "o espírito de comércio e, digâmo-lo claramente, de usurpação que reina hoje na Europa". Não era o caso de temer no curto prazo, "mas o não temê-lo agora não assegura nada para o futuro".
Nessa conjuntura, tanto para d. Luís da Cunha quanto para Silva Tarouca, o Brasil era a tábua de salvação. Desde a conclusão da paz de Utrecht, confessava d. Luís vir cultivando o que ele mesmo designa como visão, a de se mudar El Rei para o Brasil, onde instalaria a corte no Rio de Janeiro e onde tomaria o título de imperador do Ocidente. Ao secretário de Estado, d. Luís desculpava-se antecipadamente pelo atrevimento da proposta de que "um rei de Portugal trocasse a sua residência na Europa pela da América", mas cumpria decidir o que seria mais vantajoso para o monarca, se "viver precariamente esperando ou temendo que cada dia o queiram despojar do seu diadema" ou poder "dormir o seu sono descansado e sem algum receio de que o venham inquietar". Para resolver o dilema, d. Luís apelava para o segundo desequilíbrio desfavorável ao reino, o que existia entre ele e a sua colônia americana, desequilíbrio que permitiria corrigir o inconveniente do primeiro, que, como vimos, era o desequilíbrio Espanha-Portugal.

Império do Ocidente Para conservar seu poder na metrópole, El Rei dependia inteiramente dos recursos do Brasil e não dos de Portugal, "de que se segue que é mais cômodo e mais seguro estar onde se tem o que sobeja que onde se espera o de que se carece". Embora pudesse parecer semelhante projeto coisa precipitada ou cavilação de velho, d. Luís da Cunha, profético, rematava sua antevisão assinalando que "poderia vir algum (tempo), de que Deus nos livre, em que não seja mal lembrada".
D. Luís da Cunha levantava também a questão da autarquia que a América portuguesa podia proporcionar ao império, ponto a cujo respeito ele não compartilha o otimismo dos nossos primeiros cronistas. Era certo que o Brasil não produzia vinho, azeite nem sal (sic), mas, no tocante ao trigo, o que se cultivava na região meridional seria suficiente para as necessidades, que não eram grandes, devido ao fato de que os colonos preferiam a farinha de mandioca, da mesma maneira pela qual os habitantes do Minho, de Trás-os-Montes e das Beiras se alimentavam de milho e centeio.
Mas, se o Brasil não produzia muitos gêneros de que se dispõe na Europa, não era menos verdade que esta também carecia de muitas coisas preciosas que a colônia possuía, ao que acrescia a diferença de que as carências brasileiras podiam ser facilmente remediadas pela diligência e indústria humanas, as quais, entretanto, não lograriam jamais produzir no reino o que se produz na América, como o ouro e os diamantes. Desse modo, transformar-se-ia o Brasil no "entreposto de todas as mercadorias das outras três partes do mundo". Esse império do Ocidente, a ser estabelecido na América portuguesa, gozaria ademais da segurança geopolítica que lhe conferia a distância dos centros europeus de poder.
Inegavelmente semelhante plano comportaria riscos para a coroa, que d. Luís excogitava atalhar. Como Portugal seria governado por um vice-rei, como a Índia, a Espanha procuraria conquistá-lo, com o apoio daquela parte da nobreza do reino que não concordasse em acompanhar o monarca ao Brasil. Este poderia, contudo, se acautelar mediante a obtenção de garantia internacional da independência portuguesa, de vez que a Europa não tinha interesse no incremento do poder da Espanha, tanto mais que o comércio europeu teria passado a gozar de acesso franco aos portos brasileiros.
Outro fator de inibição das pretensões espanholas seria a probabilidade de retaliações contra a América espanhola, que se poderiam organizar do Brasil não só contra o Prata, mas contra o Peru e mais além, no rumo do istmo do Panamá. Quanto à fidelidade da nobreza do reino, poderiam servir de caução os laços de parentesco com aquelas famílias suas que se tivessem radicado do lado de cá do Atlântico. De qualquer maneira, era indispensável ao êxito do novo império chegar a acordo com Madri acerca das questões de limites na América. Nesse particular das acomodações territoriais, d. Luís propunha a troca do Chile pelo Algarve, muito conveniente aos espanhóis pelas facilidades portuárias.
Apreensivo também no tocante ao destino de Portugal na Europa, Silva Tarouca volta os olhos, como fizera d. Luís da Cunha, para o Brasil, "donde me parece que a eloquência do famoso Vieira fundava "o Quinto Império do Mundo e esperanças de Portugal'". No que, aliás, se enganava o duque, pois a visão profética do jesuíta tinha o mundo inteiro por âmbito do império português, e não apenas a América. Não deixa, porém, de ser significativa semelhante releitura dada no século 18 à concepção do inaciano e mediante a qual passavam a se fundar "na riqueza, posição e vasto do Brasil (...) as esperanças da monarquia lusitana e sua duração humanamente falando".
Como de costume, eram as dimensões continentais da colônia que fixavam a atenção do observador, de vez que elas se prestavam a "um império como o da China e ainda maior que a França, Alemanha e Hungria unidas se fossem em um só corpo".
A analogia com a China acompanha, aliás, todo o raciocínio do duque. Embora não dispusesse em Viena de mapas recentes do Brasil e descontando como inabitável e incultivável uma quinta parte do seu território, ainda assim haveria nada menos de 90 mil léguas quadradas portuguesas, comparadas às menos de 3.000 que existiriam em Portugal, o que faria o Brasil 30 vezes maior que o reino. Estimava ainda Silva Tarouca que, tendo Portugal uma população de 2 milhões de habitantes em área tão acanhada, a América portuguesa poderia proporcionalmente conter 60 milhões, o que correspondia precisamente à população estimada então para a China.

Até então, o problema se apresentara de maneira inversa: como Portugal, enfraquecido na Europa, poderia preservar suas colônias; agora, tratava-se de instrumentalizar as colônias para reforçar a posição européia de Portugal


Convenientemente populado e civilizado, o Brasil estava fadado a ter "a mesma figura na América que fazem atualmente na Ásia tantos diversos impérios", como eram a China, o Japão, a Pérsia, o mongol e o otomano, com o que Portugal ver-se-ia suficientemente seguro em ambos os lados do Atlântico nem já voltariam à tona das intrigas diplomáticas esses projetos de trocas territoriais e dinásticas na Europa, do feitio do outrora afagado pelo cardeal Alberoni. As nações mercantes não se arriscariam a perder o comércio brasileiro, a Espanha se acharia na contingência de temer pela sorte das suas possessões americanas e, graças ao porto de Lisboa, Portugal se veria mesmo promovido à condição de potência marítima.
Cumpria, pois, dar-se por satisfeito com o que se possuía na Europa, se cuidando apenas de promover as manufaturas em que empregar a população reinol. Ao contrário de d. Luís da Cunha, Silva Tarouca não previa a transmigração da corte, que reputaria um "disparate", ao saber do rumor segundo o qual, por motivo do terremoto de Lisboa (1755), Sua Majestade planejava "ir estabelecer-se no Brasil, da parte do Maranhão".
Só faltava, por conseguinte, arranjar gente com que povoar esses vastos desertos, o que constituía a grande limitação de Portugal. Em outro dos seus textos mais conhecidos, o "Testamento Político", que endereçara ao príncipe d. José 1º, d. Luís da Cunha advertira o futuro monarca a respeito da sangria de gente que o Brasil causava ao reino, assunto que, como se sabe, se tornara especialmente preocupante desde a descoberta das minas. Segundo o diplomata, urgia povoar a colônia sem despovoar a metrópole; e para tanto não lhe parecia haver alternativa à permissão da emigração de estrangeiros e suas famílias onde bem lhes aprouvesse, sem nenhuma discriminação religiosa, mediante a doação de terras para cultivarem. D. Luís citava, a respeito, a iniciativa da coroa britânica de enviar emigrantes alemães do Palatinado às colônias da América do Norte, gente que, a seu ver, iria com maior boa vontade para o Brasil.

Tapuias e camponeses À objeção de que a ortodoxia católica sairia prejudicada d. Luís respondia com a previsão, para consumo do Santo Ofício, de que tais colonos se misturariam no Brasil às famílias de origem portuguesa, de modo que em duas ou três gerações seriam tão bons católicos romanos quanto elas. Tampouco nas "instruções inéditas" ele se estende acerca da questão, apenas referindo que os índios se limitavam ao interior do país ou serviam de criados, "como em Lisboa nos servimos de negros". Por outro lado, os tapuias do sertão diferiam dos camponeses do reino apenas na cor da pele e, uma vez convertidos ao catolicismo, eram mais "observantes dos preceitos da Igreja que os nossos paisanos".
Nesse particular, Silva Tarouca mostrava-se mais bem informado e mais pragmático. Era preciso povoar o Brasil "de qualquer modo que seja. Mouro, branco, negro, índio, mulato ou mestiço, tudo serve, todos são homens". Que entre uns e outros "haja muitos casamentos e pouquíssimos ventres inúteis", para o que se proibiria a ereção de novos conventos e controlar-se-ia severamente o número do clero regular ali existente. Seria de grande utilidade levar colonos alemães, como os ingleses estavam fazendo na América do Norte, desde que fossem católicos, pois o correspondente de Pombal era partidário de um império unitário, com uma só religião, uma só língua, a portuguesa, e uma só lei, mas esta exclusivamente formulada para a América portuguesa, uma espécie de "Codex Brasiliano", de vez que Sua Majestade poderia se reputar "um novo fundador", dada a inexistência de "pacta conventa" entre ele e os súditos da colônia.
Quanto ao sistema educacional, "muitíssimas escolas", mas nada de universidade. Outra medida destinada a manter a união entre metrópole e colônia consistia numa doação generosa de terras, senhorios e comendas às famílias principais do Brasil, desde que convenientemente limitados. Sendo o império da China "antiquíssimo", nada pareceria "mais novo que o querer fazer de tão diversos selvagens, tapuias, negros, mulatos, uma China do Brasil! E contudo não seria absolutamente impossível", malgrado haver tardado Portugal a se dar conta da "verdadeira importância da nossa porção da América", da qual só agora se cuidava graças ao zelo do marquês do Pombal.


Evaldo Cabral de Mello é historiador, autor de, entre outros, "Rubro Veio" e "O Negócio do Brasil -Portugal, os Países Baixos e o Nordeste, 1641-1669" (Topbooks). Ele escreve mensalmente na seção "Brasil 501 d.C.", do Mais!.


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