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+(c)ultura
História oral
do punk
Edição lançada
na Inglaterra reúne entrevistas e inéditos dos
protagonistas
do movimento, como Malcolm McLaren
e Johnny Rotten
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LUDOVIC HUNTER-TILNEY
Apesar de sua brevidade e violência, o
punk vem tendo
uma vida após a
morte desproporcionalmente longa.
O movimento durou apenas
alguns anos -uma erupção
pustulosa de agitação na década de 1970- , mas gerou e ainda gera um volume enorme de
comentários.
O mais recente exemplo é
"The England's Dreaming Tapes" [Gravações do Sonho da
Inglaterra, ed. Faber, 744 págs.,
20, R$ 64], de Jon Savage.
É descrito como feito de "entrevistas, materiais inéditos e
extras" de "Sonho da Inglaterra", de Savage, publicado em
1991. Não existe relato melhor
sobre o tema, mas o leitor aborda este volume com cautela.
Ele consiste de transcrições
das entrevistas feitas pelo autor para "Sonho da Inglaterra",
apresentadas em formato simples de pergunta e resposta.
O efeito é um eco áspero da
amplitude e riqueza do livro
original, no qual Savage comparou a complexa rede de relacionamentos do punk ao "labirinto de toca de coelhos de favelas londrinas nos romances
de Dickens".
Comparado com ele, esta sequência de 744 páginas ameaça
ser ao mesmo tempo prolixa e
parca em conteúdo.
Felizmente, as dúvidas não
demoram a ser aplacadas.
Jornalista num semanário
musical britânico na época do
punk, Savage conseguiu reunir
um elenco abrangente de entrevistados quando estava escrevendo "Sonho da Inglaterra", no final dos anos 1980, e as
vozes não editadas deles, apresentadas neste novo contexto,
animam a época com a força da
história oral.
"Merdinha arrogante"
Encontramos Malcolm
McLaren lançando farpas contra o vocalista do Sex Pistols,
Johnny Rotten ("um merdinha
arrogante... vítima da moda
musical ... destituído de qualquer senso de rock and roll") e
romantizando-se, descrevendo-se como "rebelde".
Mas ele também reconhece
que o punk virou uma bola de
neve que fugiu de seu controle:
"É verdade que promovi "Pretty
Vacant" [canção dos Sex Pistols] como ideia, mas ela ganhou vida própria".
Mais tarde, Johnny Rotten
-ou John Lydon, nome para o
qual reverteu após deixar o grupo- demonstra um grau notavelmente maior de insight em
relação a McLaren:
"Malcolm gosta de dar a impressão de que é um pouco cafajeste, mas ele é mais movido
por suas ideias artísticas que
por uma sede de dinheiro."
A raiva era o sangue que injetava vida no punk. "Senti que o
punk era realmente o estertor
de morte do idealismo hippie
-hippies vestidos de buldogues", argumenta um dos entrevistados de Savage, vinculando a insatisfação niilista
com os anos 1970 e seus problemas econômicos à geração anterior e mais otimista da reviravolta contracultural.
Mas os antagonismos também eram internos.
Havia cismas no interior de
bandas, como foi o caso das lutas de poder internas dos Sex
Pistols.
Também entre bandas, já
que o Clash oferecia uma visão
mais politizada do punk.
E também entre cidades,
com Nova York reivindicando a
autoria do gênero, que só floresceu realmente quando se espalhou, como um vírus, por
Londres.
A abordagem de Savage é inclusiva. Ele cobre figuras envolvidas nas bandas do movimento, na moda, no jornalismo, nas
gravadoras e em seus redutos,
como Manchester.
Comercial de manteiga
O livro termina com dois momentos dolorosos. Um deles é
uma entrevista com a mãe de
Sid Vicious, Anne Beverley,
uma mulher complexa e geniosa que foi cúmplice na overdose
de heroína que matou seu filho
em 1979.
À época, ele estava em liberdade condicional, acusado do
assassinato de sua namorada,
Nancy Spungen.
Ela detalha a vida desastrosa
de seu filho com um misto de
orgulho e sentimento de culpa
(ela cometeu suicídio em 1996,
quando os Sex Pistols preparavam uma turnê de reencontro)
e confere uma dimensão inesperadamente trágica a Vicious,
que virou emblema do caráter
autodestrutivo do punk.
O outro momento doloroso
acontece no posfácio "Onde
eles estão agora?", no qual sabemos que Lydon, o ex-Johnny
Rotten, hoje se concentra em
sua "carreira na mídia" e faz comerciais de manteiga.
Sua trajetória -de uma criação operária londrino-irlandesa até bicho-papão dos Sex Pistols e então a vendedor de derivados do leite- enquadra à
perfeição tanto o potencial
quanto os limites da revolução
do punk. Este livro mapeia essa
trajetória.
Este texto foi publicado no "Financial Times".
Tradução de Clara Allain.
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