São Paulo, domingo, 15 de abril de 2001

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A ilha da razão

Reprodução
"Joseph Baretti" (1773), tela do pintor inglês Joshua Reynolds


Livro publicado na Grã-Bretanha contesta a primazia da França na formação da filosofia iluminista e afirma que Montesquieu e Voltaire foram fortemente influenciados pelo ingleses John Locke e David Hume

por Peter Gay

Em 7 de julho de 1776, James Boswell foi entrevistar o moribundo David Hume. "Ele estava magro", observou Boswell, "cadavérico e com uma aparência um tanto terrosa". Isso não deteve Boswell, que pediu ao filósofo para falar sobre imortalidade. "Ele disse que nunca tivera nenhuma crença na religião desde que começara a ler Locke e Clarke", acrescentando que "a moralidade de toda religião era má, e, fiquei convencido, não fazia graça ao dizer que, quando ouvia dizer que alguém era um religioso, concluía que se tratava de um tratante, embora houvesse conhecido alguns exemplos de homens religiosos muito bons".
Boswell continuou a assuntar. Não haveria talvez um estado futuro? "Ele respondeu ser possível que um pedaço de carvão depositado sobre o fogo não queimasse" e parecia-lhe "uma fantasia das mais irracionais que ele fosse existir para sempre". Mas a idéia de aniquilação não causava certo mal-estar a Hume? "Nem um pouco, disse, não mais do que a idéia de que ele não tenha existido, como observa Lucrécio." A isso, Boswell confessou um "grau de horror, mesclado a uma espécie de reminiscência tosca, estranha, precipitada das devotas instruções de minha excelente mãe, das nobres lições do dr. Johnson e de minhas afeições e sentimentos religiosos no correr de minha vida".
Deixando de lado quaisquer resquícios de tato, Boswell perguntou então: "Não seria agradável (sic) ter esperanças de rever nossos amigos?", e mencionou três dos amigos de Hume que tinham morrido havia pouco. Hume "admitiu que seria agradável, mas acrescentou que nenhum deles entretinha uma tal noção. Creio que disse "uma tal noção estúpida", ou "uma tal noção absurda'", e a conversa passou a assuntos menos incendiários. "Deixei-o com impressões que me perturbaram por algum tempo."
No grande debate entre fé e Iluminismo, nenhum triunfo do Iluminismo foi mais doce do que esse.

Ilustrados afáveis Em "Enlightenment - Britain and the Creation of the Modern World" (Iluminismo -A Grã-Bretanha e a Criação do Mundo Moderno), Roy Porter não deixa de mencionar essa cena, ainda que de passagem. Mas seu substancial estudo não deixa dúvidas de que considera Hume um de seus heróis, não somente pelo modo como morreu, mas também pelo que escreveu. Falando como historiador profissional, ele estava determinado, diz a seus leitores, a escrever "uma obra de análise, e não de defesa ou apologia. O Iluminismo não é uma coisa boa ou má, a ser aplaudida ou escarnecida". Ele confessa que acha "afáveis" seus "ilustrados" britânicos. E por que não?
A verdade histórica raramente está no meio-termo, e, como assinalou Thomas L. Haskell numa simpática coleção de ensaios historiográficos de 1998, objetividade não significa neutralidade.
O "Iluminismo" de Porter levou tempo para ficar pronto e valeu a espera. Até bem recentemente, a maioria dos acadêmicos tratava o Iluminismo como um assunto essencialmente francês. Montesquieu, Diderot, D'Alembert, Holbach, Condorcet, Voltaire, em especial Voltaire, foram os principais atores, com talvez Adam Smith ou Kant entre os carregadores de espadas levados ao palco de maneira mais ou menos perfunctória para emprestar aos patriarcas (e a algumas matriarcas) do mundo moderno um toque de cor. Os próprios "philosophes" sabiam que não era assim.
Em suas festejadas "Cartas Filosóficas" (1734), uma crítica mordaz da França sob o disfarce de um relato de viagem à Inglaterra, um clássico citado por Porter, Voltaire declarou a si próprio e a sua geração, sem nenhuma inveja, os gratos discípulos de Newton, a seu juízo o maior homem que jamais viveu, e de Locke, esse sábio educador, empirista e persuasivo advogado da tolerância. A própria civilização inglesa, com seus valores burgueses, era para Voltaire um modelo de liberdade e racionalidade. Mesmo seu propalado tributo à Bolsa de Valores de Londres (esse respeitabilíssimo local de assembléia, onde os devotos de várias religiões negociam pacificamente entre si "et tous sont contents") sugere que Voltaire absorvera uma boa dose das entusiásticas descrições de Addison sobre a proveitosa classe dos comerciantes.
Mas, em sua visão da estirpe do Iluminismo como um assunto cosmopolita, Voltaire não arrastou a posteridade consigo. "Iluminismo" pode ser lido como um comentário moderno sobre suas cartas filosóficas, escrito para mostrar que, no essencial, Voltaire tinha razão.
Roy Porter tem combatido a galomania por umas boas duas décadas. Sua primeira publicação a tocar na crítica da cultura dominante sobre o Iluminismo apareceu em 1981, quando editou (com Mirkulas Teich) "The Enlightenment in National Context" (O Iluminismo no Contexto Nacional), uma coletânea de ensaios extremamente oportuna, na qual escreveu o capítulo introdutório, sobre a Inglaterra.
Nele, traçou de forma lapidar um programa que vem explorando desde então, a fim de alegar enfaticamente que houve, de fato, algo como o Iluminismo inglês e de contestar os historiadores -entre eles Leonard Marsak, Lester Crocker, Ernst Cassirer, R.R. Palmer- que, em suas sínteses, monografias e antologias, se mostraram cegos à realidade histórica de que a Inglaterra (ou melhor, a Grã-Bretanha) merecia ser considerada digna de ter tido uma parcela, e uma parcela importante, no movimento internacional que trouxe luz ao mundo. Conciso como era obrigado a ser nesse capítulo, ficava claro que Porter estava certo, admiravelmente certo.


Visitantes estrangeiros observavam que as ruas eram literalmente mais claras em Londres que nas capitais continentais; e luz não era só iluminação artificial, mas o dom divino que fornecia lampejos aos seres humanos


Eu ofereceria somente uma ligeira advertência em favor da "Filosofia do Iluminismo" (publicada no Brasil pela ed. Unicamp), de Ernst Cassirer, publicada originalmente em 1932, firmando-se logo como um texto definitivo. Não havia muito de realidade no texto de Cassirer, e em suas mãos, como sutilmente assinalou Porter, o Iluminismo se tornou vastos prolegômenos a Kant. Mas acho que o livro de Cassirer pode pleitear uma acusação menos devastadora que a galomania: ele é centrado na Alemanha, não na França, e não foi pensado como uma obra sobre a história da filosofia, uma disciplina que Cassirer interpretava de forma mais restrita que a maioria dos historiadores faria hoje.

Debate com os galomaníacos Porter retornou a sua causa ao se voltar para a história social no ano seguinte. Em seu espirituoso e em nada obsoleto "English Society in the Eighteenth Century" (A Sociedade Inglesa no Século 18, ed. Penguin, Reino Unido), ele devotou somente alguns parágrafos à ambiência ilustrada no país, mas com bons resultados. "Os pensadores do iluminismo", escreveu, "advogavam a afirmação e a liberdade individuais.
Pensadores liberais, de filósofos abstrusos como Locke a popularizadores como Addison e Goldsmith, repudiavam o cego tradicionalismo, rejeitando a teologia calvinista de seus colegas a respeito do pecado original e da corrupção do homem, mas desprezando igualmente o irracionalismo "romano" e a prostração ante o "ipse dixismo" papal. A religião liberal e otimista da "intelligentsia" afirmava o livre-arbítrio, a salvação para todos, a bondade dos seres humanos e sua capacidade de progresso. Cada indivíduo, acreditavam, tinha direito à autonomia moral e à auto-realização".
Esse catálogo fornece um resumo do novo livro de Porter, embora esta última obra seja, é claro, bem mais aprofundada. De início, "Iluminismo" retoma, por vezes com os mesmos alvos e as mesmas palavras, o debate com os galomaníacos. Outro texto preliminar, "The Enlightenment" (O Iluminismo, ed. Palgrave, Reino Unido), um "tour de force" de 1990 no qual sintetizou as suas divergências com outros historiadores em bem menos de cem páginas, merece nota aqui. Ninguém pode dizer que Porter não se preparou de corpo e alma para este novo livro.
Esse livro é, no melhor sentido da palavra, um reconhecimento de seu terreno: a Grã-Bretanha do século 18. Na visão de Porter, o Iluminismo foi muito mais um estado de espírito que uma doutrina filosófica, uma capacidade madura de tolerar o dissenso e preferir debater a matar. Ele cita o visitante Montesquieu: "Estou aqui num país que mal parece o resto da Europa. Essa nação é apaixonada pela liberdade (...), cada indivíduo é independente". Porter concorda em substância com essa avaliação e regala-se particularmente com a referência de Montesquieu à "paixão" pela liberdade. O Iluminismo inglês vivia numa atmosfera informal. "Mais para uma comunhão de homens sociáveis do que para uma facção ou uma conspiração, o Iluminismo derivou sua coerência na Grã-Bretanha em boa parte de uma aceitação comum de imagens e expressões -era tanto uma linguagem quanto um programa."
O que transformou as convicções de alguns filósofos naturais, políticos de mentalidade liberal e sacerdotes contrários ao entusiasmo religioso popular numa atmosfera de opinião? Para responder a essa pergunta, Porter acha necessário integrar a história das idéias à história política e social. A exemplo de seu grande professor, J.H. Plumb, ele vê os 50 anos seguintes à restauração de 1660 como uma época em que a estabilidade política chegou ao país aos poucos, com muitas indecisões e contingências.

Transformar o mundo Não que homens de idéias estivessem ausentes da cena. Porter tem algumas páginas de apreço a John Locke, o "filósofo habitualmente vigilante", que foi radicalizado pelos acontecimentos por ele testemunhados e que, no novo regime que assumiu após a Revolução Gloriosa (que depôs o rei Jaime 2º, em 1688-9), participou da remodelação econômica e política do país como conselheiro dos "whigs" (liberais) e mais tarde como superintendente do fisco e membro da Câmara de Comércio. Um século e meio antes de Marx clamar por tais homens, Locke foi um filósofo que trabalhou não só para interpretar o mundo, mas também para transformá-lo.
O advento da estabilidade na Grã-Bretanha, portanto, não desdenhou os intelectuais. Antes pelo contrário; o que Porter, num capítulo inicial, chama "limpar o terreno" exigia uma profunda remodelação não só das instituições, mas (de modo ainda mais fundamental) das idéias. E essa remodelagem está no centro de quase todos os capítulos desse livro. Quer escrevessem sobre religião ou política, ciência ou psicologia, os britânicos da época tinham de remontar aos primórdios e sacudir, em muitos casos até descartar, as autoridades em que os seus antecessores haviam confiado. Locke foi um dos primeiros pensadores a reconhecer que, só porque algo existiu por longo tempo, isso não é argumento a seu favor, aliás talvez seja um argumento contrário.
Porter faz pouco dos ajustes psicológicos do passado ao futuro, mas capítulo a capítulo propicia ao leitor imaginar quão lento, quão fortemente obstado deve ter sido o processo. Afinal, para a maioria das pessoas na maior parte do tempo, o que existe é cômodo precisamente porque existe. Até o Iluminismo, na Grã-Bretanha e em outras partes, os próprios revolucionários minimizavam ou negavam as inovações que esperavam introduzir. Nas disputas entre cristãos na época da Reforma (início do século 16), os católicos zombavam dos protestantes com a pergunta: onde estava a sua igreja antes de Lutero? Ao que os protestantes retrucavam: estava onde a sua não está, na Sagrada Escritura -numa palavra, é mais velha do que a de vocês.
Até o final do século 17, aliás, a própria palavra "inovação" era um insulto universal; quem já leu os pregadores conservadores entre os puritanos americanos recordará essa censura. Foi o Iluminismo, com a Grã-Bretanha à frente, que alterou esse quadro.
Para os práticos filósofos do século 18, orientados para o futuro, os grandes sistemas de seus precursores do século 17, para não falar de sistemas mais antigos, que remontavam a Platão, pareciam pouco mais que verbosidade vazia. Cassirer reconheceu a rebelião dos "philosophes" contra o sistema em sua "Filosofia do Iluminismo", uma boa razão entre muitas para não menosprezar inteiramente esse livro. Hume formulou a questão de forma abrupta: devemos nos livrar de praticamente toda a filosofia passada.
"Se examinamos rapidamente as bibliotecas, convencidos desses princípios (do pensamento tradicional), que estrago faremos? Se tomarmos nas mãos qualquer volume de teologia ou metafísica escolástica, por exemplo, perguntemos: "Contém ele algum raciocínio abstrato a respeito de quantidade ou número?". Não. "Contém algum raciocínio experimental a respeito de assuntos de fato e existência?" Não. Entregue-o então às chamas, pois não poderá conter nada senão sofistaria e ilusão." Esse convite à queima de livros é tão familiar quanto qualquer passagem na filosofia moderna. De fato, Porter cita uma quantidade de velhos expedientes que a maioria quase sabe de cor. Mas, ao situá-los no contexto de seu argumento, mostra que eles preservaram o seu poder de informar e por vezes o de chocar.

Ruas mais claras Ele faz bom uso das conhecidas citações em algumas das páginas mais prazerosas de "Iluminismo", aquelas dedicadas à metáfora (e realidade) da luz. Quase inevitavelmente cita o dístico de Pope sobre o maior dos homens já vivos:
"Nature, and Nature's Laws hid in Night,
God said, Let Newton be! And All was Light".
("A natureza e as leis naturais ocultavam-se na noite,
Deus disse: Que Newton seja! E tudo se fez luz.")
Esses tão citados versos ajustam-se à perfeição ao argumento de Porter; visitantes estrangeiros observavam que as ruas eram literalmente mais claras em Londres que nas capitais continentais. E luz não era só iluminação artificial, mas o dom divino que fornecia lampejos a seres humanos em busca de "ver" quais tarefas havia à frente e como solucioná-las. Lâmpadas eram tanto mundanas quanto simbólicas. "A luz do conhecimento", cita Porter a exclamação de William Young, está "agora irrompendo universalmente sobre o mundo!". Claro, entendia-se (ao menos na Inglaterra) que naquele país a luz era mais forte que em qualquer outro lugar.
Porter avança sistematicamente de um campo a outro e sustenta seu raciocínio pelo puro acúmulo de provas: a racionalização da religião, da ciência, da política, da psicologia. Enquanto não procede de forma abertamente cronológica, seu livro transita da primeira parte do século para seu final, do reino do bom senso para o surgimento da sensibilidade, do domínio "whig" no início da época para as respostas conservadoras e evangélicas ao iluminismo por volta de 1800. Como tentou captar uma atmosfera -e foi admiravelmente bem-sucedido-, não podia usar uma abordagem mais formal. Necessariamente o mundo "real" está muito presente ao longo do texto: a espantosa proliferação de livros e panfletos, a divulgação de informações científicas por meio de palestras em cafés, a nova concepção da história e da política.
Em suma, depois desse livro, será um ideólogo perverso, altamente sectário, quem continuar a negar a existência e a força do iluminismo britânico. Mas a própria persuasão de Porter induz a uma questão maior. Ele próprio não a formula diretamente, mas a estimula com o título do breve capítulo final, "Lasting Light?" (Luz Duradoura?).
A questão nos lembra que, em décadas recentes, virou moda depreciar o iluminismo como o mundo de panfletários sonhadores estupidamente apegados à teoria do progresso, a-históricos em seu desdém pelo passado e compromissados com um racionalismo frio, prosaico. Esse veredicto condenatório remonta aos românticos alemães. Dois séculos atrás, o pintor romântico Philipp Otto Runge achava "uma vergonha que tantos seres humanos esplêndidos tivessem de sucumbir à miserável mentalidade do chamado iluminismo e da filosofia". Hoje, quando alguém fala do "projeto iluminista", um termo que revela instantaneamente o partidarismo de quem o emprega, sabemos que se trata de um modo de declarar toda a empreitada um fracasso.
Contra-argumentos, por mais bem-fundamentados que tenham sido, não ajudaram muito. Quem se dá ao trabalho de ler os grandes textos do iluminismo, quer britânicos ou americanos ou europeus continentais, pode reconhecer a injustiça dessas acusações: a teoria do progresso foi uma especialidade do século 19, ao passo que Voltaire escreveu seu poema sobre o terremoto de Lisboa e o "Cândido" para ridicularizar a teoria da perfectibilidade; historiadores iluministas (com destaque para os ingleses Gibbon e Scot Hume) talvez tenham sido injustos e parciais em seu tratamento da Idade Média, mas sua contribuição à ciência da história foi decisiva ao secularizarem as causas que fazem as coisas acontecerem no mundo; e o racionalismo dos "philosophes" era em geral prudente, não uma difamação das emoções, mas sim uma crítica polêmica (e ponderada) da superstição.
Afinal, os "philosophes" encontraram justificativa para duas emoções básicas que o cristianismo condenara como pecados: orgulho e luxúria. E David Hume declarou que a razão é e deve ser escrava das paixões.
Contudo a questão permanece: valeu a pena todo o dispêndio de energia dos "philosophes"? Seus ataques à irracionalidade dirigiam-se principalmente contra os estragos causados ao longo dos séculos pelas crenças e práticas religiosas. Uma vez estabelecida a verdade sobre a falibilidade da Bíblia e o absurdo de aceitar pueris contos de fadas como revelações, esperavam eles, estaria franqueado o caminho a uma vida mais razoável, menos insensível. Sem dúvida, a confiança dos "philosophes" nos poderes benéficos da razão era excessiva. Aprendemos que as tiranias seculares podem ser tão assassinas quanto as religiosas, e que o filisteísmo pode florescer em meio à alfabetização universal. Não que os danos causados pela política de massas e o poder de demagogos carismáticos fossem admiráveis para os "philosophes"; quase nenhum deles era um democrata. Mas eles não estariam preparados para o modo como uma imprensa livre pode ser prostituída nas mãos dos barões da mídia -ou para a estupidez dos intelectuais e seus anseios pelo poder.
Nos últimos parágrafos de "Iluminismo", Porter cita o louvor do crítico e escritor William Hazlitt ao dramaturgo e ator Thomas Holcroft (1745-1809): "Acreditava ele que a verdade tinha uma superioridade natural ao erro, se ao menos pudesse ser ouvida; que, uma vez descoberta, ela haveria, deixada a si mesma, de se difundir e triunfar, e que a arte da imprensa não apenas aceleraria a sua eficácia, mas evitaria aqueles acidentes que tornaram até agora o progresso moral e intelectual tão lento, irregular e incerto". Esse feixe de convicções, conclui Porter, é um resumo preciso dos ideais pelos quais se pautou o iluminismo britânico. Confessadamente essas idéias eram um pouco ingênuas.
E no entanto a razão é sempre melhor que a irracionalidade, a moderação sempre melhor que o fanatismo, o liberalismo sempre melhor que o autoritarismo. Se esses três princípios ilustrados estão sujeitos ao fracasso, ou ao menos a se comprometerem no embate de opiniões e interesses egoístas, eles continuam as únicas diretrizes aceitáveis para a sobrevivência humana e humanitária. Claro que precisam ser refinados, combinados a um juízo dos conflitos perenes, tanto conscientes quanto inconscientes. Mas nenhuma dessas dificuldades deve dar a suas alternativas nenhum ponto de apoio em nosso pensamento. O iluminismo britânico acreditava nisso; Roy Porter (com algumas cuidadosas reservas) acredita nisso. E eu também.

Onde encomendar
"Enlightenment - Britain and the Creation of the Modern World" (ed. Allen Lane, 484 págs., 25 libras), de Roy Porter, pode ser encomendado, em SP, à livraria Fnac (tel. 0/ xx/ 11/ 3097-0022) e, no RJ, à livraria Leonardo da Vinci (tel. 0/xx/ 21/ 533-2237).

Peter Gay é professor emérito de história na Universidade Yale (EUA), autor, entre outros, de "Freud - Uma Vida para Nosso Tempo" (Companhia das Letras) e "Mozart" (Objetiva). O texto acima foi publicado no "The Times Literary Supplement".
Tradução de José Marcos Macedo.




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