São Paulo, domingo, 16 de setembro de 2001

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O professor Ettore Finazzi-Agrò, titular de literaturas brasileira e portuguesa na Universidade La Sapienza, de Roma, está no Brasil para o lançamento do seu livro dedicado à obra de Guimarães Rosa: "Um Lugar do Tamanho do Mundo" (ed. UFMG). Na semana passada ele falou ao Mais!, em São Paulo.
Seus estudos convergem para o "Grande Sertão". Qual a sua visão sobre o romance?
Acho que temos aí uma obra de fundação, a qual nos coloca duas perguntas básicas: 1) qual o seu lugar na literatura nacional; 2) como a história nacional entra nela. De fato, apesar de sua fama, o livro ocupa uma posição marginal na literatura brasileira: nem romance rural nem urbano, ele representa uma figura de difícil apreensão do país, em que os vários elementos aparecem misturados e sob uma veste simbólica. O Brasil é muitas coisas ao mesmo tempo, e Rosa buscou dar conta dessa complexa "identidade" com uma obra híbrida, que sempre terá algo de indecifrável.
A crítica costuma localizar na obra de Rosa o que é regional e o que é universal...
Não há como separar, nele, o particular do universal. O livro está na fronteira, na "passagem" de um para o outro. É claro que há a fala dos vaqueiros e jagunços, assim como o mito de Fausto, há a realidade da fome e da seca e uma história de amor que é quase intemporal. Tudo isso está fundido numa "obra-mundo", que Rosa inventou a partir de um código irrepetível. Mas no fundo o romance, como as grandes obras, assenta sobre elementos muito simples: "O diabo existe e não-existe?". O sr. diz que, no romance de Rosa, a história do país aparece recalcada. Por quê?
Recalcada porque não se pode situar no tempo histórico. Quanto tempo dura a fala de Riobaldo? No entanto a história brasileira está ali, cifrada e pelo avesso. "Os Sertões" se funda no fracasso de uma visão de progresso que Euclides da Cunha tinha, separando civilização e barbárie. No fundo a história é outra. É a partir daí que Rosa conta essa outra história.


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