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Chutando lata
LEDUSHA SPINARDI
"Passaria a vida desfolhando plátanos com os
olhos". Apertava a lata fétida, até a borda só sopa de
injúrias. A vespa implacável lhe brindara: ferrão de
pedras e suspiros. Destelhado sob as águas súbitas,
deixou-se ninar pelos pingos até a madrugada. Ainda
pisando os jardins incoercíveis do sonho, distinguiu o
tilintar das algemas. Peito
escalando trevas, congelado nos detalhes de metal
das fardas. Só conseguiu
pensar no primeiro verso
de Rimbaud em que embarcara: o oceano supremo
do um coração isento de
vagas amenas. Exuberância
é o que -ao contrário-
não sobra? Queima. De
dentro do camburão ainda
pôde ouvir a lata pipocar na
calçada oposta, espalhando
o caldo indecoroso.
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