São Paulo, domingo, 23 de agosto de 1998

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CONEXÃO AMERICANA
Ex-policial teve aulas da CIA em São Paulo
O curso especial

especial para a Folha
e do "Notícias Populares"

Erwing de Barros, 41, advogado e ex-policial civil de São Paulo, contou à Folha que agentes norte-americanos se aproximaram das polícias civil e militar de São Paulo e da Guarda Civil Metropolitana às vésperas do Movimento de 1964. "Tivemos um curso especial na cidade ministrado por um norte-americano chamado Peter Costello. Todos nós da polícia fomos informados de que ele era um agente da CIA. Aí tive a primeira prova pessoal de que a CIA estava no Brasil para ficar", diz Barros.
O ex-policial guarda em uma gaveta do escritório César Rodrigues, onde trabalha, no Brooklin (zona sul de São Paulo), diploma do curso ministrado pelo norte-americano que ele alega ser da CIA, emitido pela Secretaria de Segurança Pública de São Paulo e assinado, em 12 de março de 1964, pelo então secretário e coronel do Exército Adélvio Barbosa de Lemos. Segundo Barros, foram levados à Academia Militar do Barro Branco (zona norte de São Paulo) os 40 melhores homens das polícias militar, civil e da Guarda Civil de São Paulo. "Peter Costello, da CIA, era um senhor de uns 60 anos de idade, cabelos brancos, bem-falante, que tinha cursado a academia norte-americana no Panamá", conta.
Entre os assunto ministrados estavam "segurança de autoridades, sobre como conter grandes multidões, como se infiltrar em aparelhos e sobretudo como saber notar os mais idealistas no meio de um grupo", ele enumera.
Barros lembra que os 40 policiais destacados para o curso passaram por vários testes antes de serem submetidos às classes -de provas físicas a exames no detetor de mentiras, aparelho que tecnicamente é chamado de polígrafo. "Esse foi o último exame, e o mais delicado. Queriam saber se os participantes do curso não estavam escondendo alguma ideologia comunista. Foi o exame a que mais se ativeram."
Barros, que chegou a ser segurança particular no Brasil do estilista francês Pierre Cardin, em 1982, atravessou a década de 60 como um dos agentes especiais do Departamento Estadual de Ordem Política e Social (Deops). Ele era solicitado pela Oban para buscas e apreensões de subversivos. A imagem de Barros ganhou as páginas de todos os jornais e revistas do Brasil em 1968. Naquele ano, munido de um ancinho e um cabo de vassoura, conduziu à prisão os principais líderes da União Nacional dos Estudantes (UNE), no 30º congresso da entidade, em 1968, em Ibiúna (SP). Na episódio, mil estudantes foram presos.
"Prendemos os líderes, José Dirceu, Luís Travassos e Vladimir Palmeira. Obtive um efeito psicológico muito forte, pois, em vez de usar armas, usei um ancinho e um cabo de vassoura. Nunca torturei, não consto de nenhuma lista de torturadores. Na hora de lavrar o flagrante eu sumi por três dias da polícia. Disse que estava doente. Ficaram loucos comigo. E ganhei a simpatia dos estudantes. Chegaram até a me mandar um bilhete, pedindo que eu me tornasse informante das esquerdas dentro da polícia. Não topei isso, da mesma forma que nunca topei torturar", diz Barros.



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