São Paulo, Domingo, 24 de Outubro de 1999
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DIÁLOGOS IMPERTINENTES

As portas do destino

MARIO SERGIO CORTELLA
especial para a Folha

Mais de um século após a ocidental explosão do cientificismo e da procura obsessiva por uma explicação cada vez mais racionalizada dos caminhos da humanidade, este final de milênio ainda se curva aos ditames do misterioso e do incompreensível na vida humana. Aproveitando a idéia de que, talvez, tudo "esteja escrito nas estrelas", nós as consultamos na noite de 28 de setembro, durante duas horas, numa conversa sobre "O Destino", tendo como debatedores a psicanalista e socióloga Anna Veronica Mautner e o jornalista e matemático Cláudio Weber Abramo.
Oitavo programa da série/99 dos "Diálogos Impertinentes" -já no seu quinto ano como promoção conjunta Folha, do Sesc (Serviço Social do Comércio) e da Pontifícia Universidade Católica de São Paulo-, "O Destino" aconteceu no Tuca (Teatro da Universidade Católica) na capital paulista, com transmissão nacional ao vivo pela TV PUC, e teve ainda a medição de Nelson Ascher, articulista da Folha.
Questão primordial: as ocorrências vivenciais trilham prévios caminhos ou são casualmente originadas? Anna Mautner ponderou: "Acho que é casual, mas tudo o que tem variação tem, também, um lado de constância; o que chamamos de destino tem o aspecto da constância e tem o aspecto das variáveis, das diversidades. Não é o obrigatório; é o possível". Abramo, por sua vez, foi enfático: "Nossas vidas são, essencialmente, um amontoado de situações caóticas que se superpõem umas às outras, e os acontecimentos ocorrem de forma muito descontrolada".
Não seria, então, a preocupação com o destino a expressão de uma necessidade religiosa em forma de narrativa existencial, sobre a qual as pessoas querem projetar os fatos e a própria vida como uma coisa que tem começo, meio e fim?
Abramo afirmou: "Não compreendo muito bem o pensamento religioso; para mim é um contra-senso completo que alguém possa manter crenças injustificadas de maneira geral. O ser humano se caracteriza pela racionalidade e esta exige que se pesem as evidências e que as opiniões das coisas sejam assumidas nessas evidências".
De qualquer forma, como lembrou a psicanalista Anna Mautner, há nisso tudo uma fronteira muito móvel, "em certas circunstâncias tem-se mais ou menos livre-arbítrio, isto é, possibilidade de participar do que vai ocorrer e, ao mesmo tempo, existem outras coisas sobre as quais eu não tenho nenhuma possibilidade".
Ainda bem; mantivemos o bom astral...


Mario Sergio Cortella é professor do departamento de teologia e ciências da religião da PUC-SP e autor de "A Escola e o Conhecimento" (Inst. Paulo Freire/Cortez).


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