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Descoberta foi no século 19
HELIO SCHWARTSMAN
especial para a Folha
A localização exata de Tróia foi
durante séculos um mistério.
Quem a achou foi o alemão Heinrich Schliemann (1822-1890), homem de negócios, aventureiro,
fundador da moderna arqueologia grega e uma das figuras mais
controversas de sua época.
Em meados do século 19 a arqueologia engatinhava. Ir a campo
soava quase como injúria para os
acadêmicos, que travavam debates bizantinos sobre se Tróia existiu ou não e se houve de fato uma
guerra ali. Uns poucos historiadores e arqueólogos, como Ernst
Curtius (1814-1896) e Alexander
Conze (1831-1914), escavavam em
busca da cidade, mas escavavam
no lugar errado, no povoado de
Bunabarschi, a cerca de 15 km do
que mais tarde foi reconhecido como local da Tróia homérica. É aí
que intervém Schliemann.
Schliemann conta que tomou ao
pé da letra as indicações da "Ilíada" e concluiu que a cidadela de
Príamo só podia ficar na elevação
de Hissarlik. Em 1871, uma nova
expedição, e, em 1873, mais uma,
na qual ele finalmente encontra,
no local em que previra, as muralhas e o tesouro do rei Príamo, que
ele contrabandeia para fora do
Império Otomano.
Novas escavações de Schliemann, junto com Wilhelm Dörpfeld, revelaram nove estratos (camadas de assentamentos humanos) no local. O primeiro, Tróia 1,
muito mais antigo que a Tróia homérica, remonta à Idade do Bronze, cerca de 3.000 anos a.C. A cidade descrita na "Ilíada" corresponde aos estratos 6 e 7 (1900 a
1100 a.C.). Os estratos 8 e 9 são,
respectivamente, os das colônias
grega (700 a.C. até 85 a.C.) e latina,
mais conhecida como Novo Ílion
(85 a.C. até 324 d.C., quando a cidade entrou em declínio.
Hoje aceita-se que a Guerra de
Tróia realmente ocorreu, na primeira quadra do séc. 12 a.C. Teria
sido ocasionada por uma disputa
comercial entre aqueus (gregos) e
troianos (frígios dos Bálcãs, aparentados aos gregos), que terminou com a vitória dos primeiros.
Schliemann admite que, em suas
escavações, acabou destruindo
importante material arqueológico. Seus críticos dizem que o que
ele destruiu era inestimável, além
de acusá-lo de falsear dados para
que se adequassem melhor a suas
teses e de roubar material de sítios
pertencentes a outros.
Em termos de método, a inovação de Schliemann, além de ir a
campo e levar a sério fontes antigas como Homero, foi dar mais
atenção à estratigrafia, a análise
das camadas arqueológicas em um
sítio. Além disso, em seus artigos
para o "The Times" e "The Daily
Telegraph", ele popularizou a arqueologia. As pessoas acompanhavam suas aventuras com o
mesmo entusiasmo com que se
acompanha uma novela hoje.
(HELIO SCHWARTSMAN)
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