São Paulo, domingo, 26 de outubro de 2008

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+Cultura

Quebrando as regras

Retrospectiva em Paris traz vídeos, pinturas e fotos da coleção do diretor americano Dennis Hopper

ISABELLE REGNIER

Dennis Hopper esteve em Paris para a retrospectiva cinematográfica e a exposição "Dennis Hopper e a Nova Hollywood", na Cinemateca Francesa.
Nela, o norte-americano nascido no Kansas, em 1936, aparece como um artista completo, fotógrafo, pintor, superando amplamente sua imagem de ator diabólico e de diretor de "Sem Destino", filme emblemático dos excessos dos anos 1960 e 70.

PERGUNTA - A exposição começa com "Hotel Green (Entrance)", um "ready-made" co-assinado com Marcel Duchamp...
DENNIS HOPPER -
Em 1963 foi realizada em Pasadena (Califórnia) a primeira e única retrospectiva de Marcel Duchamp, um artista muito importante para mim. Andy Warhol, Jasper Johns, Robert Rauschenberg, Ed Ruscha, todos os artistas de Los Angeles e Nova York se reuniram para essa exposição. Duchamp estava hospedado no Hotel Green, e, na noite da inauguração, vi essa placa -"Hotel Green Entrance". O dedo apontado me impressionou, porque eu o havia visto em um de seus quadros de 1923. Munido de tesouras especiais, roubei o cartaz e o dei a Duchamp, que o assinou. Duchamp dizia que o artista do futuro não seria um pintor, mas alguém que mostraria qualquer coisa com o dedo e decretaria que era arte. É o sentido que esse dedo tinha para mim. É o que faz o fotógrafo com sua câmera.

PERGUNTA - Como conciliou suas atividades de pintor e fotógrafo?
HOPPER -
Parei de pintar depois do incêndio que destruiu meu ateliê em 1961, com todos os meus quadros. Felizmente, graças a uma exposição de minhas fotos que se realizava naquela noite, meus negativos foram salvos. Naquela época, em Los Angeles, os fotógrafos não expunham com os pintores. Os marchands eram tão retrógrados que vendiam obras de Man Ray nos fundos das galerias. Eu quebrava constantemente as regras. Como Marcel Raysse, com quem expus em 1964 em Los Angeles, eu fazia grandes fotos nas quais montava objetos. Afirmava que as máquinas iam substituir os pincéis, que eram bons para os homens das cavernas...
Desenvolvi essa retórica até 1967. Então comecei a filmar "Sem Destino" e parei de tirar fotos, de fazer arte. Recomecei a pintar nos anos 1980.

PERGUNTA - Seu retrato por Andy Warhol, cujas obras o sr. comprou desde cedo, está exposto. O sr. participou de seu filme "Tarzan and Jane Regained... Sort of". Que lembrança guarda dele?
HOPPER -
Foi o primeiro filme que Warhol dirigiu. Era ridículo, pelo menos do ponto de vista dos padrões hollywoodianos. Ele dizia: você fique aí três minutos e chega. Andy era genial para apontar com o dedo, a la Duchamp. A lata de sopa, as estrelas de cinema, a cadeira elétrica, os desastres. É isso que também era interessante em seus primeiros filmes, "Sleep", "Haircut", "Eat", "Blowjob".
Era um pouco como Roger Corman, que aproveitava tudo o que acontecia de novo. "Ah, o LSD, genial, vamos fazer um filme", e fez "The Trip" (1967).
Aqui, o gênio está em suas idéias, e não em sua implementação, a mais barata possível.

PERGUNTA - Seu filme "Sem Destino", apresentado como o pontapé inicial da nova Hollywood, simbolizada por Scorsese ou Coppola, está no centro da exposição...
HOPPER -
"Sem Destino" foi o primeiro filme independente distribuído por um grande estúdio. Eu me orgulho muito dele, e foi o único dos meus filmes que fez sucesso.
Em 1971, "The Last Movie" ganhou o grande prêmio da Mostra de Veneza, mas nunca foi distribuído adequadamente. Ficou duas semanas em exibição em Nova York, outras tantas em Los Angeles, três dias em San Francisco. Foi retirado do circuito porque eu não quis remontá-lo. Nunca foi lançado na Europa. Em 1988, fiz "Cores da Violência", com Sean Penn e Robert Duvall, mas, fora isso...
Há 16 anos tento dirigir um novo filme. É muito frustrante.


A íntegra deste texto saiu no "Le Monde". Tradução de Luiz Roberto Mendes Gonçalves. NA INTERNET - A exposição sobre Dennis Hopper fica em cartaz na Cinemateca de Paris até 19 de janeiro. Confira a programação em
www.cinematheque.fr



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