São Paulo, domingo, 27 de setembro de 2009

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"Diplomacia do pingue-pongue" ajudou a "détente"

Encontro de esportistas facilitou projeto de reaproximação entre EUA e China

DE WASHINGTON

Em conversa recente com a Folha, Edward Luttwak, analista do conservador Center for Strategic and International Studies, disse que, depois dos fracassos republicanos do Iraque e do Afeganistão, só um democrata progressista como Barack Obama poderia atacar militarmente o Irã. Da mesma maneira, afirmou ele, só um republicano conservador pôde reaproximar os EUA da China comunista no auge da Guerra Fria (1945-91).
O republicano em questão foi Richard Nixon (1913-94), que visitou o país em 1972, o primeiro presidente norte-americano a colocar os pés na República Popular. O californiano assumira a Casa Branca em 1969 e dela sairia em desgraça, em 1974, ao renunciar na esteira do caso Watergate.
No meio-tempo, no entanto, lançou o que seria a pedra fundamental para a restauração diplomática dos dois países, ocorrida sete anos depois. Foi numa visita que resultou num comunicado conjunto em que se determinava que nenhum dos dois países nem qualquer outra potência poderia buscar a hegemonia naquela região.
Uma das ações que antecederam o encontro e ajudaram a vendê-lo ao público foi o que ficou conhecido como "diplomacia do pingue-pongue", primeiro relatada como um fortuito encontro de esportistas em Tóquio, em abril de 1971, onde os times de tênis de mesa dos EUA e da China participavam de um torneio.
Um dia, uma das estrelas da delegação americana, Glenn Cowan, teria entrado por engano no ônibus da delegação chinesa e tido uma recepção fria. A exceção foi a estrela do time comunista, Zhuang Zedong, que, compungido pela situação do colega, mostrou-se amistoso, lhe dando uma pintura. Mais tarde, Cowan agradeceu dando uma camiseta com o símbolo da paz ao chinês.
Quando o relato da história chegou a Pequim, o regime comunista convidou a delegação norte-americana para uma visita oficial ao país, a primeira do tipo desde a revolução comunista. Décadas mais tarde, numa palestra na Califórnia, em 2007, Zhuang Zedong confessou que, embora a orientação oficial então fosse mesmo evitar contato com os americanos, Mao Tse-tung havia lhe dito pessoalmente que buscasse uma aproximação com eles.
A visita dos esportistas aconteceu e encantou o mundo. Tênis de mesa à parte, o fato é que o dirigente chinês procurava meios de estreitar contatos com Washington pelo mesmo motivo que Nixon tentava se aproximar de Pequim: ambos os governos queriam diminuir a influência da então União Soviética no país.
A chegada do presidente norte-americano aconteceu entre 21 e 28 de fevereiro de 1972, quando Nixon foi recebido por Mao e se reuniu algumas vezes com o então primeiro-ministro, Chou En-lai. Ela veio na esteira de uma visita então secreta do assessor de Segurança Nacional e depois Secretário de Estado de Nixon, Henry Kissinger, que desviou para Pequim durante viagem ao Paquistão, em julho de 1971.
Considerado o autor intelectual do encontro e o homem mais influente da política externa americana por quase uma década e sob dois presidentes, Kissinger fora preparar o terreno para a visita oficial. Ele se encontraria de novo com Mao em 1973, segundo documentos tornados públicos no ano passado.
Então, já com a saúde afetada, o dirigente propôs em tom de brincadeira que a China exportasse 10 milhões de mulheres para os EUA. Elas não vieram, mas nas décadas seguintes o país exportaria tudo o que os EUA quisessem comprar.
(SÉRGIO DÁVILA)


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