São Paulo, domingo, 28 de maio de 2006

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O sr. K. e a política alemã

BERTOLT BRECHT

O sr. K. disse: "Quando a grande burguesia e a nobreza só puderam manter o sistema capitalista mediante uma ditadura sobre as outras classes, renunciaram a muitas liberdades individuais. Como pode o proletariado esperar instituir sem uma tal renúncia a sua ditadura, sem a qual nunca poderá construir o socialismo?". "Isso é simplificar muito as coisas", disse um ouvinte. "É isso", disse o sr. Keuner, satisfeito.
"Geralmente", disse o sr. Keuner, "um assassino procura desculpar-se mostrando que tinha de cometer o assassinato para continuar vivendo. Os capitalistas alemães, que sempre voltam a fazer guerras -que, aliás, sempre são perdidas-, evitam a desculpa de que tinham de fazê-las tanto quanto evitam a peste. Por quê? Porque significaria que o capitalismo não pode existir sem guerra. O que é verdade e o motivo pelo qual ele deve ser abolido". "Isso é facilitar a argumentação para si mesmo", disse um ouvinte. "É a minha intenção", disse o sr. K.
"Sou a favor do Estado policial", disse o sr. K. "O quê?", exclamou um ouvinte, "já não tivemos um Estado policial por 12 anos?". O sr. K. respondeu: "Por 12 anos, criminosos fizeram-se de policiais contra pessoas decentes. Eles foram depostos, mas não desapareceram. Se agora as pessoas decentes se recusam a servir de policiais contra esses criminosos, o que eles farão?". "Mas e a liberdade?", disse o ouvinte. "Ela é isso", disse o sr. Keuner.


Texto extraído do livro "Histórias do Sr. Keuner", em tradução de Paulo César de Souza .


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