São Paulo, domingo, 28 de junho de 1998

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Edição está ameaçada


Herdeiros de Lobato entram na Justiça contra Brasiliense


especial para a Folha

Os herdeiros dos direitos autorais dos livros de Monteiro Lobato -36 títulos entre literatura infantil e adulta- tentam, há dois meses, entregar uma notificação de ação judicial à responsável pela Ed. Brasiliense, Yolanda Prado. Segundo essa notificação, os herdeiros consideram "rescindido o contrato assinado por Lobato em 1945 para publicação de sua obra integral, por quebra de cláusulas contratuais".
Na Brasiliense, informa-se que Yolanda Prado se encontra em estada prolongada nos EUA, "em conversas com vários editores, para publicação de novas séries e autores". A editora, cujo catálogo tem cerca de 1.500 títulos, enfrenta dificuldades financeiras desde a morte prematura do antigo diretor, Caio Graco Prado, em 92. A empresa tem fechado livrarias e seu balanço do ano de 95 aponta prejuízo de mais de R$ 400 mil.
Inusitadamente, o contrato de Lobato com a editora é "ad infinitum", ou seja, sem prazo de validade. O escritor morreu três anos após a assinatura, sem rever cláusulas. Tinha confiança ilimitada no amigo Caio Prado Jr., e em 46 chegou a se tornar sócio da editora. Por artes da inflação, suas quotas se tornaram irrisórias 20 anos depois.
As causas da atual apelação judicial são as seguintes, segundo os herdeiros: "Impossibilidade de obter demonstrativos de venda com respectivos documentos comprobatórios, principalmente em vendas por atacado, e ocorrência de títulos com menos de 200 exemplares em estoque, vários chegando a zero". Está sendo solicitada uma peritagem na contabilidade e no estoque da editora.
Além disso, "existe a profunda decepção da família com a incapacidade de a Brasiliense reeditar a obra infantil de Lobato, com novas ilustrações e diagramação, neste ano consagrado à memória do autor; as muitas reuniões para esse fim mantidas em 96 e 97 foram inconclusivas e o valor de marketing para a nova edição também não foi confirmado, ao passo que no próprio contrato dos anos 40 o sempre visionário Lobato já estipulava verba considerável para "propaganda'", diz Jorge Kornbluh, diretor da "Monteiro Lobato Licenciamentos Ltda." e casado com Joyce Campos, neta do escritor. "Conhecedoras da situação da Brasiliense, as cinco maiores editoras do país nos procuraram recentemente. Apesar de nosso respeito por Danda (Yolanda) como pessoa e intelectual, a obra de Lobato não tem recebido o tratamento que merece", diz ainda Kornbluh.
Respondendo, nesta semana, em nome de Yolanda Prado, perguntas formuladas pela Folha, a vice-presidente da Brasiliense, Maria Teresa B. de Lima afirmou que a empresa não tem conhecimento da atual ação legal: "Esta é uma triste notícia. Os herdeiros já nos acionaram uma vez, pelos mesmos motivos, e perderam na Justiça. A Brasiliense cumpre rigorosamente o contrato com os herdeiros da família Lobato". Sobre as vendas atuais da série infantil, ela informa que quatro dos títulos atingiram "mais de 50 mil exemplares vendidos, cada um, do final de 94 ao final de 97". A marca é bem próxima daquela alcançada pelos best sellers contemporâneos da área infanto-juvenil, como "O Mistério do Cinco-Estrelas" (de Marcos Rey, Ed. Ática); mas fica aquém de um autor descrito por sua editora (Moderna) como "o Lobato de nossa época": Pedro Bandeira vende uma média de 50 mil exemplares de cada título em apenas um ano.
"Nosso plano maior é continuar honrando o contrato firmado entre Caio Prado Jr. e Lobato em 27 de junho de 1945. No próximo Dia da Criança, pretendemos lançar os dois primeiros volumes da coleção "Rocambole', adaptações da série infantil de Lobato com ilustrações coloridas de Moacir Rodrigues, e ainda uma edição comemorativa de "O Presidente Negro'", defende-se a Brasiliense.
As relações com a editora são apenas uma parte dos negócios geridos pela "Lobato Licenciamentos", que detém também direitos sobre o uso dos personagens do escritor, incluindo o Jeca Tatu. Entre os vários contratos que mantém, há o de exclusividade de montagens teatrais da obra infantil no Estado de São Paulo, até 1999, para o teatro Imprensa (SBT). A primeira adaptação, "No Reino das Águas Claras", está com 90% dos assentos ocupados e tem aprovação da família. Há também o licenciamento para CD-ROMs do "Sítio do Picapau Amarelo" (Pam Ltda.) e até mesmo propostas de construção de um parque temático.
As cessões da obra e personagens de Lobato abrangem ainda a Internet. Receberam chancela os sites www.lobato.com.br e www.monteirolobato.art.br.
Em parceria com a família de Lobato, a Fundação Banco do Brasil e a construtora Odebrecht patrocinam este ano o "Projeto Memória", com uma exposição itinerante ("O Brasil Encantado de ML"), videodocumentário (em produção), programação visual de agências do BB e outras realizações. (AM)



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