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PONTO DE FUGA
Museu
JORGE COLI
especial para a Folha, em Nova York
Os objetos de Gio Ponti como que flutuam sem gravidade, e sua arquitetura também.
O arranha-céu da Pirelli, em
Milão, lâmina aérea que ele inventou com Nervi, é uma resposta inefável à violência autoritária e pesadona do prédio da
PanAm, em NY, obra triste da
velhice de Gropius. Em 1970,
Gio Ponti projetava a Catedral
de Taranto, derivada, sem citar, de transparentes estruturas góticas, e o Museu de Arte
de Denver, no Colorado, torre
que acena tanto para as construções pré-colombianas da
Mesa Verde, quanto para uma
imaginária fortaleza medieval.
São dois edifícios que precedem a sensibilidade pós-moderna, mas que dão um baile
em muita arquitetura superficial de hoje. Dentro do museu,
os espaços abrem-se nos recortes estratégicos das janelas.
Os curadores respondem às
nuanças do arquiteto e inovam. Como numa casa confortável, cada sala traz poltronas,
sofás, mesinhas. Em vez de dispor as coleções de modo comportado e enfadonho, por país
e por época, como se faz desde
o século 19 numa tradição que
nem o "novo" Louvre ousou
interromper, as obras vêm por
afinidades indizíveis, desrespeitando a cronologia. Numa
parede, ao lado da pompa barroca de Largillière, a Elizabeth
Taylor de Warhol. Numa outra, Bouguereau dialoga com
Matisse.
Entre si, as obras fazem
emergir compreensões silenciosas, desdenhando os habituais textos nas paredes, didáticos e patéticos. A museologia,
essa falsa ciência, é como o
samba de Noel: não se aprende
no colégio.
Museu 2 - O J.P. Getty Center, em Los Angeles, é um dos
núcleos de pesquisa essenciais
em história da arte, com imensos recursos financeiros. Suas
novas instalações, no cimo de
uma colina, foram chamadas
de "o projeto do século". É o
único museu no mundo com
um trenzinho dentro, que leva
as pessoas até o alto. Richard
Meier é o arquiteto. Desde pelo
menos Barcelona, Atlanta e
Frankfurt, que reincide em
museus. Mas sua arquitetura,
celebrada e premiada, é, em
verdade, indiferente às coleções, aos ambientes, às proporções. O branco virou sua marca
registrada, e o aspecto exterior
do conjunto situa-se entre a clínica de luxo e o shopping center. Quadros e esculturas, antes, inseriam-se alegremente
na absurda e ostentatória "villa" do milionário Getty, pertinho de Malibu. Hoje, as enormes salas no alto da colina,
com iluminação zenital e cores
que parecem escolhidas de
propósito para assassinar as
obras, não possuem sequer a
respiração ampla dos museus
de outrora. Tudo se passa numa frieza indiferente, numa
falsa modernidade, acadêmica
e sem inspiração.
Museu 3 - San Francisco possui um novo museu de arte
contemporânea, concebido
pelo arquiteto ítalo-helvético
Mario Botta. É um sinal definitivo na cidade, edifício horizontal dividido por um cilindro chanfrado. Dentro, no alto
do grande tubo oco, uma frágil
passarela pode provocar vertigens. Botta emprega suas conhecidas faixas horizontais,
aqui em luxuoso mármore negro. Tudo isso forma um prelúdio grandiloquente para as
salas muito banais, que ficam
nos fundos, abrigando as
obras.
Museu 4 - Os inúmeros museus americanos de várias cidades, construídos antes da Segunda Guerra Mundial, falam
todos uma linguagem clássica
muito nobre, às vezes um pouco dura, mas sempre grandiosa. São coleções antológicas,
inspiradas no "Met", de NY,
onde haverá, sem falta, uma
bela seleção asiática, africana,
medieval e do Renascimento,
além do Monet, do Cézanne,
do Rothko e do Pollock de
plantão. Muitos incorporam
claustros medievais ou salões
barrocos inteiramente transplantados de mosteiros e palácios europeus.
Jorge Coli é historiador da arte.
E-mail: coli20@hotmail.com
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