São Paulo, domingo, 29 de outubro de 2000

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+3 questões Sobre filmes de terror

1. O que explica a atração por filmes de terror?
2. Como avalia a evolução do gênero?
3. Quais são as obras-primas?

Ivan Cardoso responde

1.
Em primeiro lugar, porque todo mundo tem medo da morte... O cinema, por ser a mais fascinante e poderosa das artes, é o grande veículo para viajarmos no tempo e no espaço... Permitindo que, no escurinho dos seus "templos", se possa experimentar sensações que nunca sonhou em viver, inclusive depois da morte... Então, assim como as igrejas estão cheias de gente querendo "ver" se garante um lugarzinho no céu, os cinemas estão lotados de pessoas querendo "ver" como é a coisa no inferno.

2.
Sendo um dos principais filões da indústria cinematográfica desde a sua origem, é natural que o cinema de terror esteja sempre evoluindo, para continuar movimentando milhões de dólares.
Aliás, sendo um gênero nitidamente comercial, poderíamos dizer que as fitas de terror são feitas sob medida para o público, uma vez que é a sua reação (dos espectadores) e a música que completam a história... Não foi à toa que Alfred Hitchcock declarou que, em "Psicose" , dirigia o público...

3.
Os 13 melhores: 1. "Drácula" (1932), de Tod Browning: fita que lançou o mestre Bela Lugosi e que é, até hoje, uma das maiores bilheterias da história; 2. "Frankenstein", de James Whale, além de ter lançado o insuperável Boris Karloff; 3. "A Ilha do Dr. Moreau" (1933), de Erle E. Kenton, com Charles Laughton em grande desempenho; 4. "The Cat People" ("Sangue de Pantera", 1942), obra-prima de Jacques Tourneur; 5. "The Body Snatcher" ("O Túmulo Vazio", 1945), terceiro e surpreendente filme de Robert Wise, em que Karloff e Lugosi voltam a se enfrentar; 6. "Os Inocentes" (1961), de Jack Clayton, arrepiante história de duas crianças órfãs que brincam com espíritos; 7. "Psicose" (1960), o grande hit de Hitchcock; 8. "O Bebê de Rosemary" (1968), trama macabra rodado no sinistro edifício Dakota; 9. Os filmes da Hammer, que marcaram época com o seu terror romântico e o grande desempenho de estrelas como Christopher Lee e Vincent Price; 10. "O Exorcista" (1973), de William Friedkin; 11. "O Iluminado" (1980), um duelo de titãs, o grande clássico de Stephen King, dirigido magistralmente pelo infernal Stanley Kubrick, com uma interpretação monstruosa de Jack Nicholson; 12. "A Hora do Espanto" (1985), divertida comédia de Tony Holland, que reciclou o cinema de terror; 13. Eu poderia citar "A Bruxa de Blair" (1999), por ter ampliado os campos da produção cinematográfica, ou "Ghost" (1990), por ter transformado o terror em "terrir". Mas fico com "Sexta-Feira 13" (1980), homenageando o pervertido Jason, Freddy Krueger, Michael Myers e outros obstinados "serials killers" que continuam deixando as telas em pânico.

Sérgio Rizzo responde

1.
É um modo seguro e confortável de sentir medo, como um pesadelo do qual fosse possível despertar quando bem entendêssemos. E talvez seja o gênero mais apropriado para explorar o potencial de fantasia do cinema. O mecanismo de identificação do público com os personagens -tanto as vítimas quanto os agressores- possibilita que aspectos inconscientes venham à tona, mas sejam vislumbrados e examinados em território neutro, fora do espectador. Não por acaso, a respeitabilidade do gênero, obtida para valer na passagem dos anos 60 para os 70, coincide com o boom da influência psicanalítica sobre a teoria cinematográfica.

2.
O sucesso dos filmes de terror, em especial os de massacre entre os adolescentes, a partir dos anos 80, e o cruzamento (algo histérico) com a comédia, originando o "terrir", figuram entre os capítulos mais recentes na história do gênero, que se desenvolveu em linhas gerais a partir de três vertentes: a sobrenatural (bruxas, vampiros, demônios, fantasmas, monstros), a psicológica (Norman Bates, dr. Hannibal) e a sangrenta (dos assassinos seriais e às vezes imortais, como o Jason de "Sexta-Feira 13"). Na primeira, são raras as ocasiões em que a ciência e os cientistas dão as caras sem desempenhar o papel de vilões, como em "Frankenstein" e "A Mosca" (1986).

3.
Uma visão panorâmica do gênero poderia começar por dois clássicos: "O Gabinete do Dr. Caligari" (1919), de Robert Wiene, e "Nosferatu" (1921), de Murnau. Depois, viria o melhor do terror americano na década de 30: "Freaks" (1932), de Tod Browning, e "A Noiva de Frankenstein" (1935), de James Whale.
A próxima parada, nos anos 50 e 60, incluiria os filmes estrelados por Christopher Lee e Peter Cushing para a produtora inglesa Hammer, além de "Psicose", de Alfred Hitchcock, e "O Bebê de Rosemary", de Roman Polanski. "O Exorcista", de William Friedkin, "Gêmeos, Mórbida Semelhança" (1989), de David Cronenberg, e "O Silêncio dos Inocentes" (1991), de Jonathan Demme, completariam a retrospectiva. Mas haveria ainda muitos sustos e aberrações a apreciar, incluindo os clássicos "primitivos" de José Mojica Marins: "À Meia-Noite Levarei Sua Alma" (1964) e "Esta Noite Encarnarei no Teu Cadáver" (1966).

Quem são

Ivan Cardoso
É cineasta, diretor de "As Sete Vampiras" e "O Segredo da Múmia", entre outros filmes.

Sérgio Rizzo
É professor de jornalismo na Faculdade Cásper Líbero e mestre em cinema pela Escola de Comunicações e Artes da USP. Escreve sobre filmes para a Folha.



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