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Nizan Guanaes

Manhã de Carnaval

O sonho do Brasil não é só o básico, é o luxo; a base da pirâmide não sonha em ser a base, sonha para cima

A palavra luxo no Brasil tem carga política compreensível num continente de imensas desigualdades. Mas, se políticos e intelectuais brasileiros querem distância da palavra luxo, sintomaticamente o povo pensa o contrário, como mostra de maneira clara a maior tradução do pensamento popular, o Carnaval.

Durante quatro dias, o povo investe suas economias para brilhar luxuosamente nas escolas de samba. Ele gosta de se vestir de rei, de princesa, de rainha, de conde, tudo com muita lantejoula, paetês, caudas imensas.

Isso faz do desfile da escola de samba uma disputa de ritmo, criatividade, mas também de quem mais luxuosamente se apresenta. Essa realidade é refletida claramente na frase de nosso maior carnavalesco, o eterno Joãosinho Trinta: "Quem gosta de miséria é intelectual, o povo gosta é de luxo".

A crítica comum ao mercado de luxo é comparar o preço de uma bolsa ao salário mínimo, ao que se compraria em cestas básicas, esquecendo-se muitas vezes de lembrar quantas famílias a produção daquela bolsa emprega, os tributos que gera.

A França, um dos países mais associados ao mercado de luxo, é também dos mais associados aos direitos dos trabalhadores, a valores igualitários.

O luxo atrai milhões de turistas à França, contribui para as exportações, é parte relevante da carga de tributos. As marcas de luxo divulgam a França, assim como o nosso luxuoso Carnaval divulga o Brasil.

O Carnaval foi inventado por europeus, mas explodiu no Brasil. Ele diz muito da brasilidade, de nossa capacidade inventiva, de nossa vocação para a rua, alegre, solar.

Festejamos mesmo quando não tínhamos razão de festejar, quando o luxo era "fake". Mas o luxo evoluiu com o país, a evolução econômica que está levando milhões ao mercado de consumo.

Na cesta básica do brasileiro começaram a aparecer demandas que não são só a cesta básica.

O sonho do Brasil não é só o básico, é o luxo. A base da pirâmide não sonha em ser a base, sonha para cima, o sonho é para cima. É um sonho de luxo e beleza, porque os dois caminham juntos. Pela passarela da moda e pela passarela do samba. Com uma exuberância que é natural no Brasil, nas nossas mulheres, nas formas de nossa natureza.

E o Brasil não será só mercado de consumo de luxo. Temos tudo para nos impor como mercado criador e produtor. O Carnaval mostra essa vocação. Antes, não havia condições econômicas para isso e não aconteceu. Hoje, marcas brasileiras já são presenças nesse universo, como Fasano e Osklen.

Mas o mercado de luxo no Brasil tem três desafios:

1) Fugir da visão terceiro-mundista e maniqueísta do luxo que opõe cesta básica a Chanel.

2) Construir marcas dentro do imaginário brasileiro celebrando nosso "way of life", o passado brasileiro, a alma, o sonho.

Como Ralph Lauren construiu uma marca americana dentro do imaginário americano, celebrando a realidade americana. É preciso cultivar o modo de ser brasileiro dentro do luxo, trabalhar nossas potentes originalidades.

3) Vencer os desafios industriais e tributários para existir como negócio.

O mercado de luxo precisa fugir do maniqueísmo para ser respeitado pelo establishment e tentar condições políticas de competir globalmente. Não pode ser associado só à ostentação e ao desperdício, precisa ser respeitado como gerador de riqueza e emprego, que fortalece o artesão e a pequena empresa.

A Copa de 2014 e a Olimpíada de 2016 representam, juntas, a maior oportunidade de exposição global do Brasil, um cenário altamente propício para as marcas brasileiras, para criarmos marcas dentro do nosso imaginário.

Cada vez mais o mundo quer ser brasileiro. Nosso estilo de vida agrada ao mundo. O Brasil não odeia ninguém. O Brasil, tirando o futebol, não quer derrotar ninguém. O Brasil é sorriso, e o mundo quer sorrir.

O Brasil não quer dominar o mundo, o Brasil quer conquistá-lo, seduzi-lo.

Não somos apenas um mercado emergente, somos também um estilo emergente.

Vamos agora transformar essa folia em energia empreendedora.

NIZAN GUANAES, publicitário e presidente do Grupo ABC, escreve às terças-feiras, a cada 14 dias, nesta coluna.

AMANHÃ EM MERCADO:
Mario Mesquita

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