São Paulo, quinta-feira, 02 de setembro de 2010

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VINICIUS TORRES FREIRE

Alerta amarelo nas contas externas


País depende cada vez mais de investimento externo em ações e renda fixa; cai o investimento "produtivo"

EMPREGO, SALÁRIOS, vendas do comércio e crédito vão bem e crescendo. Apenas o crescimento da indústria rateou e deu para trás nos últimos três meses, mas ainda é cedo para saber o que se passa. O investimento em novas instalações produtivas parece que também -vamos ter noção mais clara quando sair o PIB do segundo trimestre.
Os gastos do governo vão muito bem. Ou melhor, mal, ainda muito longe da meta de "poupança" que o próprio governo estipulou para este ano. O superavit primário anda pela casa de 2% do PIB. No final do ano, deveria ser de 3,3% do PIB.
Os brasileiros gastam mais no exterior, empresas estrangeiras remetem mais lucros, pagamos mais juros do que em 2009. As importações crescem mais do que as exportações -o saldo comercial diminui.
O Brasil está gastando mais, por todos os poros visíveis e quantificados. Além das despesas com serviços no exterior, importamos o que a produção doméstica não dá conta de ofertar e, além do mais, aquilo que o real forte nos dá vontade de consumir.
Como se sabe, a conta dessas transações brasileiras com o exterior, a conta de transações correntes, está mais e mais no vermelho. O deficit em transações correntes passou de 1,54% do PIB em 2009 para 2,51% do PIB em 2010 (o acumulado nesses anos até julho).
Não é nada dramático. O país costumava quebrar quando o deficit externo chegava perto de 4%, não tinha tanta moeda forte estocada como agora (reservas internacionais) e a economia era mais esculhambada. Uma economia mais estável e com contas mais em ordem pode financiar seu deficit externo mais tranquilamente. É o que se diz (se o mundo lá fora não quebrar).
Investimentos estrangeiros na produção são tidos como um modo saudável de financiar tal deficit. Mas esse tipo de investimento vem caindo desde 2008. Até meados de 2009, andou pela casa de 2,7% do PIB. Em julho, o investimento estrangeiro direto estava em 1,4% do PIB (no acumulado de 12 meses).
Como o deficit externo foi a 2,2% do PIB (também em 12 meses), é preciso algo mais para equilibrar a conta. Sim, tem vindo dinheiro, e até de sobra. O Banco Central continua a acumular reservas em moeda forte.
Porém, a conta financeira do balanço das contas externas brasileiras tem dependido cada vez mais dos "investimentos em carteira", em ações e em títulos de renda fixa.
O investimento estrangeiro em ações e títulos negociados no país foi a 2,6% do PIB (em 12 meses). Tal tipo de investimento é mais instável. Por exemplo, foi a 3% do PIB em fevereiro e em março. Era nulo em julho de 2009. Ficou "negativo" (saiu do país) na primeira metade de 2009, ainda de crise braba lá fora, e quando o dólar ainda valia uns R$ 2,30 (agora vale apenas R$ 1,70: é o que se chama de real forte).
Mas o dinheiro vai continuar entrando assim? O preço das ações de empresas brasileiras não é tão mais atrativo, embora as nossas taxas de juros teratológicas sejam uma isca num mundo (rico) de juro zero. Em tese, deficit externos crescentes podem ser um espantalho para o investidor externo.
A julgar pela história costumeira do Brasil, começamos a entrar na zona de alerta amarelo das contas externas. O mundo mudou? Mudamos nós?

vinit@uol.com.br


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