São Paulo, sexta-feira, 04 de março de 2011

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RODOLFO LANDIM

O perigo é estar só começando


O movimento popular no Egito criou uma reação em cadeia que pode tomar o estratégico Oriente Médio

O MUNDO ASSISTIU recentemente aos movimentos populares da praça Tahrir e ao seu desfecho final em que uma longa ditadura foi finalmente derrubada. Na realidade, a importância do que ali ocorreu foi muito maior, pois criou uma reação em cadeia que pode se alastrar do norte da África para o Oriente Médio, região estratégica pela relevância para o equilíbrio do suprimento de petróleo no mundo.
É errado imaginarmos que os problemas existentes em toda aquela região são semelhantes e que a razão dos conflitos passa por uma motivação única, mas ficou claro que os regimes de governo nesses países majoritariamente muçulmanos estão se tornando insustentáveis.
É cada vez mais difícil nestes novos tempos, em que as pessoas passam a ter acesso a todo tipo de informação e conhecimento, que sejam mantidos regimes absolutistas sem praticamente nenhuma representação popular.
E, na realidade, não importa se são monarquias ou repúblicas. O fato é que os povos anseiam participar das decisões sobre o seu destino, estão insatisfeitos e querem mudanças, algo que é agravado devido aos problemas econômicos que aquelas nações vêm sofrendo.
Além de terem tido nas últimas décadas grande crescimento populacional, os países em questão tiveram boa parte de seu povo, anteriormente nômade, buscando a vida nas cidades. Consequentemente, eles vêm arcando com enormes gastos para o desenvolvimento de sua infraestrutura.
Além disso, são economias pouco sofisticadas, com elevado percentual de empregos públicos e que dependem essencialmente dos recursos provenientes da exportação de petróleo para custear as despesas crescentes de seus governos.
Os grandes interesses econômicos nessa região começaram no século passado, logo após o final da Primeira Guerra Mundial. As empresas produtoras de petróleo, principalmente dos Estados Unidos, começaram a luta pelo direito de exploração no Oriente Médio.
A região era dominada por ingleses e holandeses e, após anos de discussão, foi finalmente assinado, em 1928, um acordo entre companhias representando o interesse de Inglaterra, França, Holanda e EUA.
O território do antigo Império Otomano (Turquia, Iraque, Arábia Saudita, Síria, Qatar, Oman, Emirados Árabes e Bahrein) seria explorado por uma única companhia de petróleo por eles criada e com participação igualitária no seu controle.
Esse evento marcou a criação de um cartel de imensa influência sobre uma vasta extensão territorial, onde estavam localizadas as maiores reservas de petróleo do mundo.
O cartel durou por três décadas, até 1960, quando ocorreu o nascimento de outro cartel, a Organização dos Países Exportadores de Petróleo (Opep), que passou a contar com a participação de outros países exportadores e foi gradualmente aumentando seu poder e o controle sobre as empresas de petróleo.
Historicamente, sempre existiram duas grandes linhas de pensamento entre os membros da Opep.
Há aqueles mais levados por uma visão de curto prazo, favoráveis a elevar ao máximo o preço do petróleo para extrair imediatamente o maior benefício possível. Também há outros, defensores de preços mais moderados, que desestimulem a busca por fontes alternativas de energia.
Essa é uma posição mais simpática, porém cada vez mais difícil de sustentar devido às demandas internas de seus países. Permite mesmo a regimes ditatoriais obter o apoio de fortes aliados de democracias ocidentais para a sua continuidade no poder, algo que seria aparentemente um contrassenso.
Por enquanto, o problema ainda parece ser periférico, pois afetou mais substancialmente a Tunísia, o Egito e a Líbia, países que, somados, não deixam de ter uma produção de petróleo significativa, mas ainda relativamente pouco impactante no contexto global.
O real perigo é caso a turbulência se alastre para o coração do Oriente Médio, região responsável por cerca de um quarto da produção de petróleo do mundo e detentora de mais da metade das reservas de petróleo conhecidas, onde os efeitos poderiam vir a ser dramáticos.

RODOLFO LANDIM, 53, engenheiro civil e de petróleo, é presidente da YXC Oil & Gas e sócio-diretor da Mare Investimentos. Trabalhou na Petrobras, onde, entre outras funções, foi diretor-gerente de exploração e produção e presidente da Petrobras Distribuidora. Escreve quinzenalmente, às sextas-feiras, nesta coluna.

AMANHÃ EM MERCADO:
Fernando Veloso


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