São Paulo, sábado, 18 de dezembro de 2010

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"Retomada dos EUA é prioridade global"

Para ex-nº 2 do FMI, enquanto país não voltar a crescer de 3,5% a 4%, economia mundial estará "imobilizada"

Stanley Fischer, presidente do banco central de Israel, afirma que o Brasil precisa criar demanda interna

MARCELO NINIO
DE JERUSALÉM

Num país habituado a conviver com a incerteza, o economista Stanley Fischer sobressaiu em Israel como sinônimo de estabilidade.
Presidente do Banco de Israel (banco central) desde 2005, Fischer é considerado o principal responsável pela passagem da economia israelense pela crise global sem grandes arranhões.
Apontado como o melhor banqueiro central de 2010 pela revista "Euromoney" e entre os seis com nota máxima pela "Global Finance", Fischer acha que é hora de tirar do papel as regras estabelecidas após a crise para regular o sistema financeiro.
"Algumas regras sobre liquidez dos bancos só vão entrar em vigor em 2019. É muito tempo", disse, em seu gabinete em Jerusalém.
Fischer, 67, nasceu na Rodésia do Norte (hoje Zâmbia), mas fez carreira nos EUA. Professor do MIT (Massachusetts Institute of Technology), foi o orientador de doutorado do atual presidente do Fed (o BC americano), Ben Bernanke.
Fischer não compartilha a preocupação brasileira de que o estímulo aplicado pelos EUA criará uma guerra cambial. Para ele, o mais importante é que a economia americana volte a crescer.

 


Situação global
A situação ainda é muito incerta nos países desenvolvidos do Ocidente. Nos EUA, só agora o crescimento parece estar finalmente retomando. Na Europa ocidental, a situação é complexa. Mas outras partes do mundo estão indo muito bem, incluindo o Brasil e, claro, a Ásia. Até parte da África está indo bem.
Ninguém sabe em que velocidade os EUA crescerão, mas há sinais de melhora e suponho que, como resultado do estímulo fiscal e monetário, veremos um crescimento econômico gradual em 2011.

Dólar e guerra cambial
Quando os juros de curto prazo estão em zero [como nos EUA], não é por aí que você faz política expansionista. O que o Fed tenta ao comprar títulos de longo prazo do governo americano é reduzir os juros de médio prazo, como os de dez anos. É só outra forma de fazer política monetária. Não são medidas voltadas para a taxa de câmbio.
Se todos no mundo mantivessem a taxa de câmbio versus dólar constante, ainda assim haveria medidas expansionistas nos Estados Unidos, porque eles estão tentando reduzir os juros de médio prazo, que afetam hipotecas e planos de investimento de mais longo prazo.
Se tivermos paciência, no fim veremos um crescimento mais rápido da economia americana. Se eu tivesse que escolher entre: situação a) os EUA crescem 2% e Israel tem um período tranquilo com sua moeda; e situação b) os EUA crescem 3,5% e nós temos problemas lidando com o câmbio, eu optaria pela situação b. Enquanto a economia americana não voltar a um crescimento razoável, de uns 3,5% ou 4% por alguns anos, a economia global estará, se não imobilizada, danificada. Essa é a prioridade.

Rumo à Ásia
Israel é muito dependente de exportação para os EUA e para a Europa, e ambos estão crescendo lentamente. Para mim está claro que o movimento deve ser em direção à Ásia. E claro, ficaríamos felizes em fazer mais negócios com a América Latina.
Economia forte
A saída é fazer produtos melhores e ser mais eficiente. O Brasil teve um câmbio bem acima de R$ 2 por um bom tempo. As empresas brasileiras estão indo bem, os exportadores são muito bem-sucedidos. Mas, no fim das contas, eu digo algo que tenho certeza que as autoridades brasileiras também sentem: todos querem ter uma economia forte com uma moeda fraca. E isso não é possível.

Bolha imobiliária
Sem dúvida uma das missões dos bancos centrais é identificar bolhas. Acho que nós já vimos o suficiente dos resultados da visão de que os BCs não devem afetar a bolha. Essa estratégia foi bem-sucedida nos EUA depois da bolha da internet. Mas em 2007, 2008, 2009 essa não foi uma estratégia bem-sucedida. Não queremos que haja um crescimento excessivo seguido de um crash.

Ação coordenada
Os esforços do Comitê de Estabilidade Financeira e do Comitê de Basileia têm sido notáveis em produzir regulação e acordos. Agora é preciso implementar. Algumas regras sobre liquidez dos bancos só vão entrar em vigor em 2019. É muito tempo.

Brasil
Nós somos 7 milhões [de habitantes], o Brasil quase 200 milhões. A tarefa do Brasil é mais simples, porque a sua economia é relativamente mais fechada. Todos nós estamos habituados a usar a exportação como motor de crescimento, e felizmente vocês têm matéria-prima para exportar para a China, o que vai ajudá-los. Mas não se pode confiar nas exportações, como antigamente. É preciso criar demanda interna.


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