São Paulo, sábado, 21 de agosto de 2010

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commodities

ANÁLISE PREÇOS

Menor oferta mundial eleva preço do trigo

Após alta em 2007/8 devido ao maior consumo, agora aumento ocorre porque produção não atende a demanda


O BRASIL AINDA DEPENDE DE 50% DE IMPORTAÇÕES DE TRIGO PARA ATENDER A DEMANDA INTERNA DE SEUS DERIVADOS

PAULO PICCHETTI
ESPECIAL PARA A FOLHA

A intensidade do aumento do preço do trigo observada nas últimas semanas no mercado internacional parece ameaçar repetir a situação de três anos atrás.
Entre maio de 2007 e março de 2008, o preço da tonelada de trigo no mercado externo subiu mais de 120%. Entre junho e agosto deste ano, a elevação no preço do trigo já chega a quase 40% no mercado à vista, e a mais de 50% nos principais mercados de contratos futuros. No entanto, os dois momentos são bem diferentes.
Em 2007/8, os preços das principais commodities agrícolas no mercado externo aumentavam muito devido à forte expansão do consumo mundial (interrompida pela crise em meados de 2008) e também de um movimento especulativo de investidores nos mercados futuros.
Em 2010, esses preços ainda sentem os efeitos da incerteza com relação à intensidade da recuperação da demanda mundial.
O aumento nos preços do trigo é agora explicado essencialmente pelo lado da oferta, com a redução na produção mundial em decorrência de fatores climáticos adversos, principalmente na Rússia, na Ucrânia e no Cazaquistão.
O Brasil ainda depende de cerca de 50% de importações de trigo para atender a demanda interna de seus derivados. Assim, as condições do mercado internacional refletem no consumidor doméstico.
Um exemplo significativo é o pão francês, item de consumo diário dos brasileiros, que, de acordo com a estrutura de ponderação do Índice de Preços ao Consumidor Semanal da Fundação Getulio Vargas, tem um dos maiores pesos individuais no orçamento doméstico (cerca de 1,2%; o maior peso é o do aluguel residencial, com cerca de 5%).
Visando reduzir o impacto do preço internacional sobre o consumidor brasileiro, em 2008 o governo já havia isentado o trigo e seus derivados (incluindo o pão francês) da cobrança das contribuições para o PIS/Cofins.
No mesmo período (maio de 2007 a março de 2008) em que o trigo subia mais de 120%, o pão francês aumentou cerca de 20% no Brasil.

OFERTA MENOR
O preço do trigo no mercado internacional caiu fortemente após o início da crise, estabilizando-se em cerca de 20% acima do período que antecedeu os aumentos em 2007, enquanto o preço do pão francês continuou estável em torno do novo patamar atingido em 2008.
A alta no preço do trigo nos últimos meses já começa a pressionar o preço do pão francês no Brasil (aumento de 3,2% ao longo dos primeiros sete meses de 2010). Como a isenção fiscal sobre o trigo e seus derivados continua valendo (a princípio até o final de 2010), a margem de manobra para conter esse aumento já não é igual.
Enquanto discutem-se alternativas (como a redução da tarifa de importação de países de fora do Mercosul), qualquer impacto dos derivados do trigo sobre os índices de inflação no Brasil deve ser avaliado como decorrente de um choque de oferta.


PAULO PICCHETTI, 48, doutor em economia pela Universidade de Illinois, é professor da EESP/FGV (Fundação Getulio Vargas) e coordenador do IPC-S/Ibre/FGV).


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