São Paulo, terça-feira, 25 de outubro de 2011

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ANÁLISE CAFEICULTURA

Competitividade chinesa chega ao café importado pelo Brasil

SYLVIA SAES
ESPECIAL PARA A FOLHA

As recentes notícias sobre as importações brasileiras de café torrado e moído da China têm sido motivo de muita polêmica no setor. Parte das análises lamenta o fato, relembrando saudosamente o sonho de ver 1 bilhão de chineses tomando uma xícara de café brasileiro por dia.
Outra parte minimiza o fato, reconhecendo que compramos da China pouco mais de 300 quilos em um ano, quantidade insignificante principalmente se comparada ao consumo brasileiro.
No entanto, um dado desse noticiário merece maior reflexão: o café torrado e moído exportado da China, em termos de valor, é o segundo mais caro importado pelo Brasil, perdendo somente para o da Suíça. Segundo essas fontes, foram pagos em média US$ 40 pelo quilo do café chinês, ante US$ 78 do suíço. O produto brasileiro considerado como de alta qualidade está por volta de US$ 30 o quilo.
Essa constatação é bastante intrigante, pois desmonta a crença de que a competitividade dos produtos chineses se vale das vantagens comparativas do principal fator de produção, ou seja, a mão de obra barata. Isso significa que não é a estratégia de custo baixo o fator primordial para o Brasil comprar café da China. Pelo contrário, embora esse fator possa trazer ganhos maiores para os chineses, a razão deve ser buscada pela diferenciação do produto ou pelo benefício que este traz para os consumidores brasileiros.
Por um lado, pode-se entender que o café chinês tem atributos diferenciais de qualidade para os brasileiros. Por outro, fica difícil imaginar que a qualidade do café chinês supere de forma tão expressiva a qualidade dos cafés brasileiros, permitindo aos importadores tal margem de preço muito superior ao produto nacional.
Além do mais, há forte suspeita de que o café por nós importado seja uma mistura de cafés da China, do Vietnã e, por incrível que pareça, do café brasileiro!
Isso porque a China é um importador de café verde do Brasil. Ou seja, exportamos o verde e compramos o processado das empresas internacionais fabricado com café brasileiro, pagando mais.
Entender a lógica desse mercado não é fácil. Um dos fatores citados diz respeito à estrutura tarifária: enquanto nossos importadores adotam baixas tarifas (ou isenção) para o café verde e altas tarifas para o torrado e moído brasileiro, nossa estrutura tarifária fixa relação inversa.
Tal estrutura criaria incentivos às importações, punindo as exportações. Outro motivo apontado pela indústria brasileira de torrado e moído é a dificuldade que o setor encontra para importar café verde para realizar misturas com cafés de outras origens.
Os dois motivos não parecem ser suficientes para explicar o comportamento desse mercado. Mas vale a pena investigar para entender melhor não só o fenômeno chinês como também para aproveitar nossas vantagens competitivas e nos inserirmos no mercado internacional.

SYLVIA SAES é professora do Depto. de Administração da Faculdade de Economia, Administração e Contabilidade da USP e coordenadora do Cors.


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