São Paulo, quinta-feira, 28 de outubro de 2010

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VINICIUS TORRES FREIRE

Bolha: paranoia ou mistificação?


Depois da guerra cambial, bolha de países emergentes ocupa o topo das paradas de fofocas das finanças


O BRASIL vivou um estouro de bolhinha em setembro, outubro de 2008. Bola de chiclete se comparada à americana. Foi a bolha dos derivativos cambiais, que quebrou grandes empresas e avariou outras dezenas. Em suma, as empresas faziam dívida a fim de, na prática, apostar na valorização eterna do real. A coisa era "secreta", ocorria fora dos mercados regulados e passou sob as pernas do Banco Central. Houve certo tumulto e pânico, mas o problema passou longe dos bancos maiores. Enfim, o governo arrumou um tutu para os quebrados e ajudou a consolidar uns novos oligopólios.
Bolha graúda mesmo é aquela que arrasta uma economia inteira. Começa com uma onda de superinvestimento num negócio, a princípio, promissor. Evolui graças a dinheiro barato ou inventado por meio de instrumentos financeiros complexos. A seguir vem uma inflação de preços mais ou menos localizada.
Os ativos ou negócios da bolha então parecem se transformar numa cornucópia de dinheiro. Investidores fazem dívidas a fim de entrar no negócio e aproveitar a sua rentabilidade superestimada. O negócio se torna mais e mais caro, mas no delírio da bolha quase ninguém é capaz de enxergar que jamais entregará o retorno esperado.
Logo abaixo da "guerra das moedas", a "bolha dos emergentes" é o assunto da moda. Bolha de commodities. Bolhas de Bolsas e imóveis. O fato de os EUA virem a despejar em breve mais meio trilhão de dólares na economia vai marcar a disparada final da bolha? Ou só uma inflação controlável de ativos?
No Brasil, a torrente de dólares por ora nos preocupa mais devido ao câmbio. Parece não haver bolhas. Pelo menos, não temos nem mercados e instrumentos financeiros sofisticados e grandes o bastante para inflar bolhas (afora o de moedas). No mínimo, não temos instrumentos bons para detectar os sopros da morte. O mercado imobiliário parece aquecido e caro, mas isso está longe de ser condição de bolha.
Mas os países do Leste Asiático estão nervosos com a possibilidade de bolha (e com a valorização de suas moedas também, claro).
Por exemplo, o discurso das autoridades econômicas sul-coreanas é, sem tirar nem pôr, idêntico ao das nossas. Discutem a volta da tributação dos investimentos de "estrangeiros" na dívida pública deles e, em última instância, controles administrativos de capital ("causa distorções, mas o mercado financeiro está distorcido"). Cingapura, China, Malásia estão com medo de bolhas.
Cada vez mais relatórios de bancos estrangeiros, americanos, europeus e japoneses, tratam de bolha. Alguns recomendam aproveitá-la antes que acabe, caso das commodities. Outros dizem que as Bolsas, mesmo a do Brasil, estão caras (essa métrica é sempre duvidosa, mas são alguns bancos que o afirmam).
Um sinal da bolha imobiliária nos EUA entrou no radar das finanças já em 2002. A bolha começou a estourar em 2006, embora então nem houvesse consenso de que se lidava com uma bolha. Quando ficou evidente que a bolha explodia, entre 2007 e 2008, dizia-se que o efeito seria limitado. Pois é.
As bolhas, pois, parecem transparentes, invisíveis, impossíveis ("desta vez é diferente"). Após as crises dos 1980 (Japão), 1990 (Ásia) e 2000 (EUA), o mundo parece mais escaldado. Mas está mesmo?

vinit@uol.com.br


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