São Paulo, domingo, 28 de novembro de 2010

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Desvio no PanAmericano vem desde 2006

Há quatro anos foi feita aplicação em um CDB do banco a uma taxa três vezes superior à média de mercado

Banco Central suspeita que juros eram inflados artificialmente para camuflar o desvio de recursos da instituição

LEONARDO SOUZA
ENVIADO ESPECIAL AO RIO
HUDSON CORRÊA
ENVIADO ESPECIAL A JUIZ DE FORA

A sangria de recursos no PanAmericano ocorre desde 2006, segundo documentos em posse do Ministério Público Estadual de Minas Gerais. Naquele ano, o empresário Adalberto Salgado Júnior aplicou R$ 3 milhões num título da instituição financeira a uma taxa três vezes superior às de mercado.
Duas semanas atrás, a Folha revelou que o mesmo empresário, de Juiz de Fora (MG), mantinha como pessoa física R$ 400 milhões num outro papel do banco do grupo Silvio Santos, um CDB (Certificado de Depósito Bancário) que lhe rendia juros de 30% ao ano.
Técnicos do Banco Central suspeitam que os juros desses investimentos eram inflados artificialmente para camuflar o desvio de recursos da instituição.
No final do ano passado, a Caixa Econômica Federal comprou 35,54% do capital do banco por R$ 739,2 milhões. Ou seja, quando o governo se tornou sócio do apresentador de TV, fazia pelo menos três anos que um suposto esquema para retirar dinheiro ilegalmente do banco estava em curso.
Quando descoberta a remuneração exorbitante do CDB de R$ 400 milhões, a diretoria demitida do PanAmericano deu dois argumentos ao BC. Primeiro, disse que os juros altos se deviam às dificuldades para captar recursos após a quebra do Banco Santos, em 2004. A segunda razão seria a crise financeira internacional, em 2008.
Segundo uma autoridade envolvida na investigação, a remuneração atípica poderia ocorrer por um período curto, numa situação adversa para os bancos menores.
A descoberta da nova aplicação com rendimento acima do oferecido no mercado (também CDB), contudo, implode os dois argumentos. Ou seja, a prática era recorrente e se deu antes da crise internacional.

TAXA GENEROSA
O Ministério Público iniciou a apuração do caso a partir de uma comunicação do Coaf (Conselho de Controle de Atividades Financeiras), feita em agosto de 2007.
Chamou a atenção do órgão a alta taxa de juros paga pelo CDB do PanAmericano emitido em março de 2006: 29,9% ao ano, contra a média no mercado na ocasião de 11,5% -segundo um dos documentos da investigação.
O CDB é um instrumento usado pelos bancos para captar recursos. O investidor empresta dinheiro ao banco e recebe juros baseados no CDI -taxa cobrada nas transações entre instituições financeiras. O CDI segue a taxa básica da economia (Selic), hoje em 10,75% ao ano.
Bancos pequenos e de médio porte, como o PanAmericano, costumam pagar juros superiores ao CDI, dependendo do valor investido e do prazo. Ainda assim, uma taxa generosa chega a aproximadamente 110% do CDI, cerca de 11,5% ao ano.
No início do mês, a Caixa e o BC realizaram uma espécie de "intervenção branca" no PanAmericano, após a identificação de um rombo de R$ 2,5 bilhões na instituição.
A descoberta de uma aplicação tão extravagante somente após a intervenção é indício de que a fiscalização do BC cometeu falhas no caso do PanAmericano.
Segundo especialistas ouvidos pela Folha, a fiscalização deveria ter notado o CDB, no mínimo, pelo risco que o pagamento de juros tão altos significaria ao banco. Sem contar o histórico do titular da aplicação.
Adalberto já foi preso por crime contra a ordem tributária em 1998. Acusado do mesmo crime, envolvendo suposta adulteração de combustível em seus postos, responde a duas ações penais desde setembro passado na Justiça de Minas Gerais.


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