São Paulo, domingo, 28 de novembro de 2010

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JAMES KYNGE

A economia paralela da China


A pressão inflacionária derivada das finanças informais preocupa mais que os números oficiais


A CHINA CRITICOU severamente os Estados Unidos por sua decisão de lançar uma nova operação de relaxamento monetário, de US$ 600 bilhões, temendo que isso ampliasse o dilúvio de dinheiro que vem do exterior para o mercado chinês.
Embora os influxos de capital sejam um problema para Pequim, não deveria haver dúvida de que o inchaço na base monetária chinesa e a inflação que ressurge no país são primordialmente "made in China".
Parece cada vez mais provável que os empréstimos bancários -que dispararam ao recorde de 9,6 trilhões de yuans em 2009, quando a China agiu para reflacionar sua economia- ultrapassem a meta anunciada pelo governo para 2010, de 7,5 trilhões de yuans (cerca de R$ 2 trilhões), depois que os bancos registraram um total oficial de empréstimos de 6,9 trilhões de yuans nos dez primeiros meses de 2010.
Mais preocupantes que esses números oficiais são as pressões inflacionárias que derivam do mundo subterrâneo das finanças informais. Ainda que as dimensões do sistema financeiro paralelo da China sejam incertas, não é provável que os montantes envolvidos sejam modestos.
O sistema inclui empréstimos não registrados em balanço pelos bancos estatais, dinheiro administrado por fundos "privados" e ativos de uma florescente multidão de agiotas e bancos operando sem registro.
Pesquisas do China Confidential sugerem que os ativos totais sob administração do setor de fundos privados, que opera quase sem fiscalização, principalmente em Xangai, e é formado por operadores renomados que investem dinheiro em nome de pessoas endinheiradas, podem atingir a marca do trilhão de yuans.
Os empréstimos que os bancos estatais realizaram neste ano e não registraram em seus balanços eram estimados em 2 trilhões de yuans no momento em que a Comissão de Regulação Bancária da China interveio para controlar a situação.
Mas as medidas repressivas parecem ter sido amenas. Segundo números da consultoria Use Trust, o volume de empréstimos que os bancos realizam sem registro em balanço atingiu 2,005 trilhões de yuans no terceiro trimestre deste ano, ante 1,928 trilhão no trimestre precedente. Em outubro, o montante de produtos de fundos bancários vendidos atingiu 385,22 bilhões de yuans, total inferior ao dos meses precedentes, mas ainda significativo.
Por fim, segundo pesquisas no varejo financeiro em diversas províncias, os agiotas do mercado paralelo parecem ter realizado um grande volume de empréstimos neste ano, com a saída de poupança dos depósitos formais, em que as taxas de juros reais são negativas, rumo a investimento com agiotas, que oferecem taxas anuais de retorno que variam de 12% a 120%.
Os empréstimos totais das instituições não regulamentadas podem atingir 4 trilhões de yuans em 2010.
Portanto, mesmo considerando certa sobreposição entre ativos dos "fundos privados", empréstimos de bancos paralelos e empréstimos mantidos fora do balanço de bancos estatais, os ativos da economia crepuscular chinesa podem superar 6 trilhões de yuans. Se o número for adicionado à meta adicional de 7,5 trilhões em empréstimos em 2010, torna-se claro que o surto recorde de empréstimos em 2009 não foi acaso.
São as pressões causadas por esse inchaço na base monetária, somadas à decolagem da economia rural, que servem como causas primordiais da inflação, que atingiu 4,4% anuais em outubro.
A China sabe que não pode impor disciplina a sua imensa e desregulamentada economia paralela sem sacrificar o crescimento e, no entanto, a menos que enfrente as causas primárias do crescimento da base monetária, pode fracassar em seu combate à inflação.
Pequim é capaz de responder com muitas das armas disponíveis em seu arsenal administrativo. As autoridades podem elevar de novo os requerimentos de capitalização bancária, impor novos controles de preços, reforçar barreiras ao influxo de capital e tentar regulamentar na máxima extensão possível o sistema financeiro informal. Também podem decidir elevar as taxas de juros.
Os próximos meses podem bem ser turbulentos para os investidores, em meio a sinais de desaceleração no crescimento.


JAMES KYNGE é editor do China Confidential, o serviço de pesquisa do "Financial Times" sobre a China.

Tradução de PAULO MIGLIACCI

AMANHÃ EM MERCADO:
Maria Inês Dolci



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