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Entrevista / Chen Guangcheng

Mesmo depois de acordo, ainda me sinto em perigo

ATIVISTA CEGO CHINÊS QUE ESCAPOU DE PRISÃO DOMICILIAR NO MÊS PASSADO RELATA À FOLHA DETALHES DE SUA FUGA ESPETACULAR

Embaixada dos EUA em Pequim, 2.mai.2012/Associated Press
Chen Guangcheng numa sala da embaixada americana, antes da transferência ao hospital
Chen Guangcheng numa sala da embaixada americana, antes da transferência ao hospital

DE PEQUIM

Presente à primeira prisão do ativista cego Chen Guangcheng, em 2005, o jornalista americano Philip Pan escreveu que, enquanto ele gritava por ajuda de dentro de um carro, só havia algumas dezenas de testemunhas, na maioria transeuntes que não o conheciam.

Sete anos depois, "se o aparato de segurança chinês agir contra Chen agora, o mundo inteiro estará vendo" compara Pan, em artigo no jornal "The New York Times".

Pivô de um dos momentos mais difíceis nas relações entre as duas maiores potências mundiais nos últimos anos, Chen, 40, está há nove dias isolado no hospital Chaoyang, em Pequim, resguardado por dezenas de agentes.

Dali, ele espera viajar para Nova York (EUA), onde pretende estudar direito e descansar de uma rotina de prisão e maus-tratos só interrompida quando protagonizou uma fuga espetacular de sua prisão domiciliar, na área rural da província de Shandong. Ao chegar a Pequim, refugiou-se na embaixada americana por quatro dias.

O advogado autodidata se notabilizou por defender mulheres vítimas de abortos e esterilizações forçados.

Condenado a 4 anos e 3 meses, deixou o cárcere em 2010, mas ficou em prisão domiciliar por 19 meses, mesmo sem nenhuma medida judicial. Ele falou à Folha por telefone.

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Folha - Como é a sua rotina no hospital?
Chen Guangcheng - O meu pé está engessado, não consigo me mover. Eu ainda não fui informado sobre quando o tratamento vai acabar. Não posso receber visitas, ainda não vi nenhum amigo. Mas a minha mulher e os meus filhos estão bem, comigo.

Acha que ainda corre perigo?
Estou numa situação melhor. Mas há perigo, sim.

Você ficou dois anos sem encontrar o filho mais velho, de dez anos. Por quê?
Os bandidos não deixavam o meu filho voltar pra casa. Ele ficou na casa da avó dele.

Qual foi o momento mais difícil da sua fuga?
Foi quando eu escalava o quinto muro e quebrei meu pé. Não consegui me mexer nem me levantar. Tive de passar por sete muros. Já passara por quatro, havia mais três. Muito difícil. Mas me levantei, não podia voltar.

O que aconteceu a sua família após a descoberta da fuga?
Minha família sofreu muito. Pessoas foram até minha casa e prenderam a minha mulher na cadeira por mais de 24 horas. Depois a levaram até a polícia. Ela ficou confinada lá por 58 horas.

E a sua mãe [que ainda está na cidade natal]?
Eu não sei, ela não quis me contar.

Foram os maus-tratos à família que o fizeram mudar de ideia de ficar na China?
Isso faz parte. Mas o que mais importa é que quero me recuperar; não descansei nada durante sete anos. Fiquei confinado em casa e não consegui estudar muito.
Decidi ir aos Estados Unidos estudar por dois motivos. Primeiro, não penso em pedir asilo. Segundo, no momento em que saí da embaixada, o acordo entre China e EUA entrou em vigor. Então, tenho direito à liberdade de entrar na China ou sair dela. Com isso, tomei a decisão.

Está satisfeito com o que o governo chinês decidiu?
Por enquanto, não posso dizer que estou satisfeito ou insatisfeito. O governo tem muitas coisas a fazer. Eles falaram que iriam a Shandong investigar. Eu ainda estou esperando.

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