São Paulo, Sábado, 01 de Janeiro de 2000


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MONTANHA RUSSA
Presidente russo põe em seu lugar o premiê Putin para antecipar eleições e evitar devassa anticorrupção
De surpresa, Ieltsin renuncia

Associated Press
Após a sua renúncia, o ex-presidente Boris Ieltsin cumprimenta Vladimir Putin (primeiro à esq.), que assumiu interinamente o cargo


JOÃO CARLOS ASSUMPÇÃO
enviado especial a Moscou

O presidente Boris Nicolaievitch Ieltsin, 68, surpreendeu ontem os russos ao anunciar, em discurso transmitido pela TV estatal ORT, que renunciava à Presidência do país. Seu mandato terminaria em agosto de 2000.
"Estou indo antes do tempo estabelecido", afirmou Ieltsin, que foi substituído no cargo pelo premiê Vladimir Putin, que fica no cargo pelo menos até a realização das eleições presidenciais. Inicialmente programadas para junho, elas deverão acontecer, como prevê a Constituição em caso de renúncia presidencial, dentro de 90 dias. O mais provável é que sejam realizadas em 26 de março.
O presidente em exercício, herdeiro escolhido por Ieltsin, é apontado como favorito para vencer as eleições.
Ieltsin, eleito em 1991, época em que a Rússia ainda era parte da União Soviética, enfrenta, desde 1995 -quando passou duas semanas hospitalizado com problemas cardíacos e de circulação-, sérios problemas de saúde.
Mas não são só os problemas de saúde que o preocupam. Se não fizer o sucessor em 2000, corre o risco de ver seu governo, com acusações de corrupção, sofrer verdadeira devassa. Putin assinou ontem decreto que proporciona imunidade a Ieltsin e à sua família em relação a eventuais processos por corrupção.
A escolha da data para a renúncia -véspera do ano 2000- não foi casual. Ieltsin disse em seu discurso que o objetivo é fazer a Rússia iniciar uma nova era com "novos líderes políticos". Ele não anunciou o que pretende fazer no futuro.
Ontem mesmo Ieltsin transferiu todas as suas funções para o premiê e presidente em exercício, inclusive o controle sobre o arsenal nuclear -o segundo maior do mundo, atrás apenas do dos EUA.
No discurso em que anunciou seu afastamento do cargo, Ieltsin chegou a pedir desculpas por algumas de suas ações enquanto presidente, referindo-se, em especial, à forte crise econômica que atingiu o país em 1998.
Segundo analistas políticos locais, a renúncia de Ieltsin vai ajudar Putin na campanha presidencial. Afinal, acreditam eles, quanto mais cedo forem as eleições, maiores serão as chances do premiê. Arquiteto da investida na contra os separatistas muçulmanos da Tchetchênia, Putin tem altos índices de popularidade.
Desconhecido em agosto, quando foi nomeado por Ieltsin para o lugar de Ievguêni Primakov, Putin fez o ieltsinismo renascer. O apoio dos russos à ação na Tchetchênia aumentou o poder dos governistas na Duma (câmara baixa do Parlamento) após a realização das eleições em dezembro.
Putin viajou à Tchetchênia hoje e entregou medalhas a soldados envolvidos na ofensiva anti-separatismo.
Nos últimos dias, no entanto, o premiê tem recebido críticas da oposição, já que o governo prometera dominar Grozni, a capital tchetchena, até ontem.
Como isso não aconteceu, políticos contrários à ofensiva militar começam a dizer que as baixas no exército russo serão maiores do que o esperado.
Yuri Lujkov, prefeito de Moscou e adversário de Ieltsin, afirmou que a tomada de Grozni será mais complicada do que se esperava. "Os tchetchenos conhecem muito bem a região e terão vantagem nos últimos confrontos."
A festa de virada do ano em Moscou teve a renúncia de Ieltsin como tema de conversas e como palco principal, a Praça Vermelha, que esteve completamente lotada. Uma multidão não parava de dançar. Faltando cerca de 15 minutos para a meia-noite, soldados russos tiveram de criar uma barreira diante da praça para impedir a entrada de mais gente.



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