São Paulo, domingo, 01 de maio de 2005

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MEMÓRIA

O hoje coronel Steve Hasty, 53, travou o que é considerado o derradeiro confronto norte-americano no Vietnã

"Último marine" foi salvo por um temporal

PEDRO DIAS LEITE
DE NOVA YORK

Era pouco depois do meio-dia do dia 29 de abril de 1975 quando o telefone do consulado de Can Tho, no delta do rio Mekong, tocou. Os helicópteros já haviam começado o resgate que ficou famoso na Embaixada dos Estados Unidos em Saigon, e a ordem era de evacuação imediata. Aos 23 anos, Steve Hasty comandava o grupo de seis marines que defendia o consulado e travou o que é considerado o último confronto americano no atoleiro vietnamita.
Trinta anos depois, o hoje coronel Hasty, 53, conta que foi salvo pela chuva, no trecho mais perigoso do trajeto de 15 horas rio abaixo. ""Tínhamos saído há poucas horas, quando sofremos uma emboscada, com lança-granadas e muitos tiros. Mas estávamos muito bem armados, não acho que eles esperavam, e conseguimos fugir", relata.
"Quando nos aproximávamos da parte mais estreita do rio, em que estaríamos em grande perigo novamente, de repente o céu se fechou e começou uma chuva tão intensa que você não podia ver a frente do barco se estivesse na parte de trás. O inimigo não podia nos ver, e o som da chuva batendo no rio era tão alto que encobriu o som do nosso motor", conta.

"Encobertos pelo temporal"
"Então conseguimos passar pela parte mais perigosa da viagem encobertos pelo temporal. Na hora que a chuva parou, já estávamos no trecho mais aberto, bem mais seguro. Não havia repórteres lá em baixo em Can Tho como havia em Saigon, então muito poucas pessoas sabem dessa história", diz. Além dos seis marines, estavam 12 diplomatas norte-americanos e cerca de 300 vietnamitas em fuga dos comunistas.
"Infelizmente em Saigon perdemos dois marines mortos e um ferido", afirma Hasty, que chegou ao Vietnã em 1972, quando a guerra já entrava no ponto crítico para os EUA.
Passadas a emboscada e a chuva, o barco navegou até as três horas da manhã do dia 30 de abril, quando chegou a um navio comercial, que os transportou e depois os entregou a uma embarcação da Marinha dos EUA. Ontem essa fuga completou 30 anos.
Desde o Vietnã, Hasty já esteve em mais de dez guerras ou confrontos, como intervenção na Somália (1993) e as duas guerras do Iraque. Formado em relações internacionais pela Universidade George Washington e com mestrado em segurança interna e estudos estratégicos, o coronel não vê o Vietnã como uma lição, minimiza os efeitos da guerra no imaginário norte-americano e fala que, "se as pessoas não querem se ajudar, você não pode fazer isso por elas".

Sem traumas
"Eu até tenho alguns traumas, mas não específicos, estive muito na guerra desde então. Algumas pessoas superestimam o impacto que o Vietnã teve nos EUA".
Com a linguagem típica dos filmes de guerra, ele fez uma reprimenda quando questionado sobre o Exército: "Na América, nunca confunda um marine [fuzileiro naval] com um soldado. O soldado ficará muito feliz se for chamado de marine. Mas o marine ficará furioso".


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