São Paulo, terça, 1 de julho de 1997.



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ANÁLISE
Ásia é a região mais bem-sucedida do século

do enviado especial

Se o século 19 foi a era dos imperialismos, a humanidade gastou o século seguinte em guerras, genocídios e revoluções, tentando construir uma nova ordem mundial. O desmonte do entulho colonial ainda não acabou, nem suas feridas estão cicatrizadas. Mas a transição capitalista na China, cujo marco simbólico mais forte é a retomada de Hong Kong, confirma a Ásia como a região mais bem sucedida do século 20 na transição para um sistema econômico pós-colonial.
Depois do Japão e da Coréia do Sul, a China é a terceira potência emergente capaz de superar o "círculo vicioso da miséria" que ainda paralisa as sociedades da África e da América Latina.
Mas essa transição não se fez contra os antigos colonizadores, e sim com a sua ajuda. Como Japão e Coréia do Sul, a China do século 20 é uma criação do capitalismo ocidental, um fruto da Guerra Fria, em que a grande derrotada foi a União Soviética.
O sucesso do Japão deve muito à prioridade dos EUA no pós-guerra, que era conter a expansão soviética. A Coréia do Sul também se beneficiou das tropas americanas e da Guerra do Vietnã. Finalmente, na terceira batalha da guerra anticomunista, a aliança estratégica com a China nos anos 70 abriu as portas para o modelo atual de "um país, dois sistemas".
A cerimônia histórica de ontem desafia as ideologias e mistura sentimentos de júbilo e vingança, a vitória do capitalismo e a sobrevivência do comunismo, a força da globalização e a reafirmação do nacionalismo.
Entre as grandes bandeiras do século 20, apenas uma sai desse episódio inequivocamente fragilizada: a da democracia.
A China que transita para uma forma híbrida de capitalismo é a mesma do massacre na praça Tiananmen. E as potências do Ocidente, diante das enormes oportunidades comerciais vislumbradas num mercado de 1,2 bilhão de habitantes, legitima um regime comunista tão ditatorial quanto o soviético, contra o qual bateram-se nas últimas décadas.
O paradoxo maior da superação do colonialismo e do círculo vicioso da miséria na Ásia, entretanto, é fruto do próprio sucesso sequencial de Japão, Coréia do Sul e China. Há entre essas potências regionais uma disputa silenciosa pela vanguarda do chamado "século do Pacífico".
O império britânico, na sua fase de apogeu econômico e prosperidade colonial, forjou a "Pax Britannica". Os EUA, na fartura desenvolvimentista dos anos 50 e 60, festejou a sua própria versão de "Pax Americana".
A "Pax Asiática", por enquanto, não tem fiador seguro nem um sistema equilibrado. Para cada uma dessas sociedades milenares, com vastas populações e Estados fortes, o sucesso capitalista ocidental é um episódio de curta duração, e o futuro, a rigor, mal começou. (GILSON SCHWARTZ)



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