São Paulo, quinta-feira, 01 de julho de 2004

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IRAQUE SOB TUTELA

Mais magro e cansado, ex-ditador passa a ser criminoso comum; pena de morte deve ser reinstaurada

Saddam é levado a tribunal iraquiano

Saeed Khan/France Presse
Iraquiano lê jornal local que publicou fotomontagem de Saddam entre dois soldados dos EUA


DA REDAÇÃO

Os EUA passaram ontem ao Iraque a custódia legal sobre Saddam Hussein. O ex-ditador, que comandou o país com mão de ferro por 24 anos, foi levado a um tribunal criado especialmente para julgá-lo. A corte poderá condená-lo à morte.
O indiciamento de Saddam, capturado em dezembro no Iraque, e de 11 de seus colaboradores por crimes contra a humanidade -estima-se que 300 mil pessoas tenham sido mortas por seu regime- é o primeiro ato do governo interino, empossado segunda. Ele é soberano, segundo a ONU, apesar dos 160 mil soldados estrangeiros que seguem no país.
Segundo Salem Chalabi, coordenador do tribunal, o ex-ditador, de 67 anos, parecia fisicamente bem, embora mais magro e cansado. "Ele disse "bom dia" e indagou se poderia fazer algumas perguntas. Disseram-lhe que ele teria de esperar até amanhã", afirmou, acrescentando que Saddam trajava roupas típicas árabes e permaneceu sentado. Já os demais acusados pareciam nervosos ou mesmo hostis. Ali Hassan al Majid, o "Ali Químico", tremia.
"Hoje, às 10h15 (horário local), a República do Iraque assumiu a custódia legal de Saddam Hussein", anunciou o gabinete interino. Mas os acusados seguirão sob guarda dos EUA, em um local não revelado, até que as forças iraquianas tenham condições de mantê-los em segurança. Os procedimentos ocorreram em local secreto por temor de ataques. Os acusados foram levados um a um a uma sala onde eram avisados sobre a mudança de status -de prisioneiros de guerra dos EUA, passam a criminosos comuns no Iraque. Hoje, se apresentam a um juiz para ouvir as acusações.
A Promotoria pretende indiciá-los pelo envolvimento em seis episódios: a repressão violenta de um levante xiita após a Guerra do Golfo (1991), a invasão do Kuait (1990), o massacre curdo (1988), o uso de armas químicas na cidade curda de Halabja (1988), o extermínio de 5.000 membros do clã Barzani (1963) e a guerra contra o Irã (1980-1988) -durante a qual o Iraque teve apoio americano.
O presidente interino iraquiano, Ghazi Yawer, declarou ao jornal árabe "Asharq al Awsat" que o gabinete vai reinstaurar a pena de morte, suspensa durante a ocupação americana. Na véspera, o premiê Iyad Allawi afirmara que o tema ainda estava em discussão.
As audiências foram o primeiro passo de um processo legal extenso, que poderá levar anos. Chalabi crê que os primeiros julgamentos ocorram só em 2005.
O assessor de Segurança Nacional do Iraque, Mouwafak al Rubaie, referiu-se ao caso como "o julgamento do século", dizendo que o processo será "justo" e "televisionado". "Todo mundo vai assistir a esse julgamento, e nós vamos mostrar ao mundo que o novo Iraque é um exemplo."
Mas, enquanto o novo governo se esforça para passar uma imagem de controle e soberania, a insurgência segue ativa. Um ataque com morteiros a uma base próxima ao aeroporto de Bagdá feriu seis soldados da Força Multinacional, e, em Basra (sul), a polícia desarmou um carro-bomba perto do local de um desfile de policiais.
Em Fallujah (oeste), um ataque aéreo americano matou quatro pessoas, segundo moradores. Os EUA disseram que o ataque foi realizado após "múltiplas confirmações do Iraque e da inteligência multinacional".

Com agências internacionais

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