São Paulo, quinta-feira, 01 de julho de 2004

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URBANISMO

Projetos mudariam perfil da cidade; críticos temem perda de identidade

Arranha-céus ousados vão verticalizar Londres

ALAN RIDING
DO "NEW YORK TIMES", EM LONDRES

"A Terra não tem nada a mostrar de mais belo", escreveu o poeta William Wordsworth há dois séculos, referindo-se a Londres. Mas os "navios, torres, domos, teatros e templos" que ele admirou desde a ponte de Westminster já deram lugar, há muito tempo, a uma vista mais pobre, moldada tanto pelo mau gosto do pós-guerra quanto pelos bombardeios da guerra. Agora, com uma ousadia raramente vista por aqui, Londres concluiu que chegou a hora de reparar seu horizonte.
Para isso, a cidade está literalmente buscando um novo perfil, um que se caracterize por arranha-céus de belo formato projetados por grandes nomes da arquitetura e que proclame a determinação de Londres de ser conhecida como metrópole inovadora do século 21. Até 2010, o domo majestoso da catedral St. Paul não mais será o único símbolo do centro antigo de Londres, que também vai abrigar uma nova floresta de vidro e aço. Após séculos de crescimento horizontal espalhado, a cidade finalmente começa a elevar-se em direção ao céu.
Muitos londrinos estão preocupados. Eles já temem que a cidade esteja perdendo sua identidade histórica. Para eles, a solução ideal seria a demolição dos edifícios de escritórios erguidos nos anos 60 e 70. Em lugar disso, a estratégia escolhida é cercar esses feios prédios de concreto com arranha-céus novos e elegantes, na esperança de esconder a má arquitetura. Mas essa abordagem também encerra riscos: arranha-céus vistos como ousados hoje podem parecer superados amanhã.
Ken Livingstone, que em 2000 se tornou o primeiro prefeito eleito de Londres, parece estar decidido a impor aos empreiteiros um pouco de planejamento urbano à moda antiga, mas também ele acredita que o centro de Londres precise aumentar sua densidade demográfica. Para isso, aderiu ao princípio da construção vertical.
Os arquitetos não poderiam estar mais contentes. Até recentemente, ao mesmo tempo em que projetavam arranha-céus de Nova York a Xangai, seu trabalho em Londres consistia em reformar construções já existentes, como a Royal Opera House e o Museu Britânico. Nesta primavera, com a conclusão de um edifício notável de 40 andares no centro financeiro de Londres, Norman Foster virou o epítome da nova política.
Ele não é o único. Pela primeira vez desde que Christopher Wren reconstruiu a velha Londres após o grande incêndio que devastou a cidade em 1666, arquitetos britânicos e estrangeiros ganharam o poder de transformar por completo o visual da cidade.
A City de Londres, que atua como capital financeira da Europa, é o foco do novo crescimento. A exposição "New City Architecture" (arquitetura da nova cidade), que está exibindo modelos de 21 das melhores obras concluídas e planejadas na cidade, escolheu cinco projetos de Foster e três de Richard Rogers.
Nem todos são edifícios de muitos andares. O prédio que Rogers projetou para a sede da companhia de registros marítimos Lloyds, com sua fachada de vidro e tubulações que lembram o Centro Georges Pompidou, em Paris (aliás, projetado na década de 70 pelo próprio Rogers e por Renzo Piano), não se eleva acima do horizonte da cidade.
Mas é o novo edifício de 180 metros de altura criado por Foster no endereço 30 St. Mary Axe, semelhante a um míssil agachado e que ganhou o apelido de Gherkin (pepino), que vem impulsionando a tendência à verticalização. Entre outros arranha-céus planejados ou quase prontos estão o esbelto edifício triangular criado por Rogers para a British Land Company, o Minerva Building, de Nicholas Grimshaw, com 43 andares, e o Heron Tower, de Kohn Pedersen Fox.
Mas a catedral St. Paul, que sobreviveu à blitz nazista na Segunda Guerra, não pode ser perdida de vista. Até 1950, nenhum edifício era autorizado a erguer-se mais alto do que seu domo de 90 metros de altura. Mas então começaram a surgir torres retangulares, e até mesmo a vista de frente da catedral acabou sendo obstruída por um feio edifício de escritórios. Em 1987, o príncipe Charles se queixou de que, ""no prazo de meros 15 anos, os planejadores, arquitetos e construtores da City estragaram o horizonte de Londres e profanaram o domo da catedral St. Paul".
Hoje, a autorização para a construção de arranha-céus é condicionada à preservação das vistas da St. Paul. Também é considerado importante preservar as vistas do Parlamento, em Westminster, e da torre de Londres.


Tradução de Clara Allain


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