São Paulo, quinta-feira, 01 de agosto de 2002

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RELIGIÃO

João Paulo 2º, em visita ao México, converte em santo o indígena mexicano Juan Diego, que viveu no século 16

Américas ganham seu primeiro índio santo

DA REDAÇÃO

O papa João Paulo 2º, 82, canonizou ontem, na Cidade do México, o primeiro indígena das Américas a se converter em santo. De acordo com a tradição cristã, a Virgem de Guadalupe apareceu diante de Juan Diego, um chichimeca cujo nome original era Cuauhtlatoazin -ou "águia que fala"-, em 1531.
Cerca de 8.000 pessoas assistiram à cerimônia na basílica da Virgem de Guadalupe, que é também a padroeira do país. Nas ruas, centenas de milhares de pessoas celebraram a canonização.
Embora muitos questionem até mesmo a existência de Juan Diego -padres mexicanos chegaram a pedir o adiamento da canonização por causa dessas dúvidas-, o papa enalteceu a importância do novo santo para a aproximação de conquistadores espanhóis e nativos do novo mundo.
"É com grande alegria que declaramos santo Juan Diego Cuauhtlatoazin, o inscrevemos no catálogo dos santos e estabelecemos que, em toda a igreja, seja devotadamente honrado", proclamou João Paulo 2º.
Nesse momento, os participantes da cerimônia começaram a agitar maracas e a tocar imensas conchas do mar. Além disso, o evento foi marcado por danças típicas indígenas.
Um grande retrato oficial de Juan Diego foi levado para a basílica. A imagem do santo causou controvérsia no país nos últimos dias por causa de sua representação, muito mais próxima de um conquistador espanhol do que de um indígena pobre.

História
Segundo os relatos oficiais da Igreja Católica sobre Diego, que teria vivido de 1474 a 1548, ele já era um homem extremamente espiritualizado, mesmo antes de se converter ao cristianismo.
Nascido agricultor pobre antes ainda da chegada dos colonizadores europeus, Juan Diego só se converteu aos 50 anos de idade.
Pela tradição, a Virgem Maria teria deixado com ele a imagem de uma santa morena, de compleição bem mais próxima à dos astecas do que as imagens carregadas pelos espanhóis.
Conhecida como a Nossa Senhora de Guadalupe, a imagem da santa e a figura de Juan Diego foram elementos essenciais para a conversão, muitas vezes violenta, de milhões de indígenas de toda a América Latina ao cristianismo.

Identidade
A maioria dos mexicanos liga, de modo muito estreito, a própria identidade nacional com a fé na Virgem de Guadalupe.
Os detratores da versão oficialmente aceita pela igreja chegam a dizer que toda a história foi inventada pelos espanhóis -ou pelo Vaticano- para ser usada como "arma" de catequização da população autóctone.
Outros dizem que a canonização pode ser parte de uma estratégia da Igreja Católica para tentar diminuir o crescimento das seitas evangélicas entre os indígenas mexicanos (leia texto abaixo).
Um milagre de cura por intervenção do santo foi reconhecido pelo papa João Paulo 2º no ano passado, abrindo caminho para a canonização.
Como mostra da importância política da adoração à Virgem e a Juan Diego, entre os presentes ilustres estavam o presidente do México, Vicente Fox, e a maioria de seu ministério.
O cardeal Norberto Rivera, primaz do México, disse que a canonização era de grande importância para impulsionar a luta pelos direitos dos mais de 12 milhões de indígenas no país, que tem uma população total de cerca de 102 milhões de habitantes.
Mais de 90% da população mexicana é católica.
A maioria dos indígenas no país vive na pobreza e na marginalidade. Uma parte encontra-se, inclusive, em armas, no Estado de Chiapas, sul do México.

Peregrinação
Foi a quinta visita de João Paulo 2º ao México. Aparentando cansaço, numa viagem que passou pelo Canadá e pela Guatemala, o pontífice cumpriu todas as cerimônias oficiais agendadas, mas falou sempre com voz trêmula e vacilante.
A primeira viagem internacional de João Paulo 2º como líder máximo da Igreja Católica foi justamente para o México, em 1979. Os seus esforços levaram a uma melhora nas relações entre igreja e Estado no país, depois de décadas de antagonismo e conflito. O México só estabeleceu relações diplomáticas com o Vaticano em 1992.
Está marcada para este mês uma viagem à sua terra natal, a Polônia.


Com agências internacionais


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