São Paulo, quarta-feira, 01 de novembro de 2000

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CONTAGEM
Famílias devem esconder filhos fora da "cota"
Seis milhões de pessoas realizam na China o maior censo da história

CALUM E LIJIA MCLEOD
DO "THE INDEPENDENT", EM PEQUIM

Um exército de 6 milhões de recenseadores entrou em ação na meia-noite de ontem para chegar a um total mais preciso da população da República Popular da China. Até 10 de novembro, vão vasculhar os povoados e os arranha-céus do país para compilar o maior censo da história.
Mas até funcionários do governo admitem que os números do censo podem ficar milhões de pessoas aquém da cifra real, já que muitos pais preferem ocultar a existência de um segundo ou mesmo terceiro filho dos draconianos planejadores familiares.
A contagem de cabeças já começou nas regiões mais frias. Os recenseadores no planalto tibetano e nas regiões setentrionais da Mongólia Interior e de Heilongjiang começaram mais cedo seu esforço para contatar as massas, atravessando montanhas, pradarias, desertos e nevascas.
Mas os acidentes geográficos e o mau tempo não constituem os maiores desafios enfrentados pelo quinto recenseamento realizado na China desde 1949. O adversário mais implacável dos recenseadores é a desonestidade.
"Na economia planejada, não havia privacidade. Agora vivemos numa economia de mercado, e as pessoas querem proteger seus segredos", diz o diretor de população do Birô Nacional de Estatísticas chinês, Zhang Weimin.
Os segredos de Liu Zongwei estão jogando baralho no quarto de dormir da família, que também faz as vezes de depósito e fica nos fundos da minúscula loja dele. Liu Fang e Liu Fei, 8 e 7 anos de idade, figuram entre as pelo menos 18 mil chamadas "crianças negras" da capital chinesa, cujo número chega a mais de 5 milhões em todo o país. O apelido se aplica a toda criança não registrada.
Quando os recenseadores chegarem a Mentougou, na periferia de Pequim, Liu vai esconder Fang e Fei e declarar apenas a irmã mais velha das crianças, Liu Xiaoli, 12, que vive com sua avó no povoado natal de Liu, na Província de Shandong. "Por que eu as declararia? Seria um convite a problemas."
Para o estatístico Zhang Weimin, trabalhadores migrantes como Liu e nascimentos "excedentes", ou ilegais, são grandes dores de cabeça. Desde o fim da década de 1980, a sociedade chinesa vem se tornando mais móvel e difícil de controlar -e contabilizar.
Os primeiros resultados do censo serão divulgados em fevereiro de 2001. A previsão é que ele indique a existência de pouco menos de 1,3 bilhão de pessoas -22% da população mundial, que a China tem de alimentar com 7% das terras aráveis do mundo.


Tradução de Clara Allain



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