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São Paulo, sábado, 01 de novembro de 2003

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ESTUDO

Sistema não resolve problemas econômicos da população e perde apoio, mas ainda é visto como vetor do desenvolvimento

AL está infeliz com democracia e mercado

DA REDAÇÃO

A democracia e a economia de mercado estão intimamente ligadas ao desenvolvimento para a maioria dos latino-americanos, mas apenas uma parcela pequena da população se diz satisfeita com o modo como as duas coisas funcionam hoje em seu país.
Uma pesquisa conduzida entre 18 de julho e 28 de agosto deste ano com 18.638 pessoas em 17 países e divulgada ontem pela organização Latinobarómetro, sediada no Chile, que estuda a opinião pública na região, mostra que só 28% dos latino-americanos estão satisfeitos com a democracia, embora 53% sigam apoiando o sistema e 64% acreditem que ele seja o único a levar ao desenvolvimento.
Em relação à economia de mercado, o índice de satisfação é ainda menor: 16%, embora 57% a apontem como único sistema econômico compatível com o desenvolvimento de um país. A grande maioria da população, diz o estudo, não se sente incluída no mercado e tampouco crê que ele tenha lhe trazido benefícios.
Um dos grandes motivos da insatisfação com o mercado é o alto índice de desemprego na região. O problema foi apontado como o mais grave por 29% dos entrevistados, aparecendo na frente de itens como pobreza e corrupção.
Além disso, 54% dizem ter medo o desemprego. Nesse ranking, o Brasil é o segundo país, com 63% da população temendo perder o emprego -a Guatemala é o primeiro, com 66%. Outro item relacionado é a porcentagem de pessoas que disseram ter grandes problemas financeiros: 23% (quase um quarto dos entrevistados).
O estudo ressalta que, embora ainda forte no continente, o apoio à democracia vem caindo: de 1996, o primeiro ano em que a pesquisa foi realizada, a 2003, passou de 61% a 53%. O nível atual é menor do que os 56% do ano passado (embora a queda esteja dentro da margem de erro da pesquisa, de 2,8% a 4,1% dependendo do país). Além disso, nunca tanta gente se declarou insatisfeita com o modelo democrático: 66%, contra 60% no ano passado.
Dos entrevistados, apenas 38% declararam apoio a seu governo, a quem 63% deles atribuíram a responsabilidade pelos problemas econômicos -o presidente Luiz Inácio Lula da Silva teve um dos maiores índices de aprovação, 62%, atrás apenas do argentino Néstor Kirchner (86%) e do colombiano Álvaro Uribe (65%).

Instabilidade
O estudo desvincula a situação econômica da satisfação com a democracia, mostrando que países com uma situação pior ou que acabaram de emergir de uma crise muitas vezes apóiam mais o modelo do que outros de situação econômica mais estável.
"As idas e vindas econômicas e políticas não conseguiram desmantelar a democracia na América Latina", disse Marta Mori, uma das diretoras do Latinobarómetro. "Parece haver consenso de que sem democracia não é possível atuar no mundo globalizado."
Entretanto o grupo chileno aponta para uma crescente visão da democracia ou do mercado como "incompetentes" abrindo espaço para a instabilidade política na região.
Um exemplo contundente é o da Bolívia, onde um levante popular que eclodiu com base na insatisfação com o mercado -a proposta governamental de exportar gás aos EUA e ao México usando o território chileno- e com a democracia -queixas da falta de representatividade indígena no gabinete, quando os índios perfazem 60% da população- resultou na queda do presidente Gonzalo Sánchez de Lozada, há duas semanas.
Uma das conclusões mais preocupantes do estudo é a de que 52% da população da região, ainda que a maioria se declare favorável à democracia, não se importaria em ser submetida a um governo não-democrático contanto que ele resolvesse os problemas econômicos do país. Essa acepção é especialmente forte no Brasil, onde 65% dos entrevistados concordaram com ela -apenas o Paraguai e a Nicarágua apresentaram índice mais elevado.
O Brasil e o Paraguai são, aliás, os únicos países em que mais da metade da população se diz não-democrata: 55% no primeiro e 60% no segundo. Na região como um todo o índice é de 39%.


Com agências internacionais

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