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HISTÓRIA
Agência alterou dados cruciais a respeito de incidente que precipitou ação militar ampla dos EUA, revela historiador
Pretexto do Vietnã foi forjado, diz pesquisa
SCOTT SHANE
DO "NEW YORK TIMES", EM WASHINGTON
A Agência Nacional de Segurança dos EUA (NSA) mantém em
segredo desde 2001 a descoberta,
feita por um historiador da agência, de que agentes da NSA distorceram dados críticos durante o incidente do golfo de Tonkin, que
ajudou a precipitar a Guerra do
Vietnã. A informação é de duas
pessoas familiarizadas com o trabalho do historiador. No conflito,
ocorrido entre 1957 e 1975, morreram 58.226 americanos e mais
de 1 milhão de vietnamitas.
A conclusão do historiador representa a primeira acusação séria de que as interceptações de comunicações feitas pela agência teriam sido falsificadas de modo a
dar crédito à idéia de que navios
norte-vietnamitas atacaram destróieres americanos em 4 de agosto de 1964, dois dias após um choque anterior. Nos últimos anos, a
maioria dos historiadores concluiu que não ocorreu o segundo
ataque. Mas eles supuseram que
as interceptações feitas pela NSA
foram mal interpretadas, e não
modificadas propositalmente.
A pesquisa conduzida pelo historiador do NSA Robert J. Hanyok foi apresentada com detalhes
há quatro anos num artigo publicado internamente pela agência e
que continua interditado para
consultas externas, em parte porque os responsáveis pela agência
temem que a divulgação possa
motivar comparações incômodas
com dados falhos usados para
justificar a Guerra do Iraque, segundo um funcionário da inteligência familiarizado com o tema.
O historiador independente
Matthew M. Aid, que discutiu a
pesquisa de Hanyok sobre o golfo
de Tonkin com atuais e antigos
agentes da NSA e da CIA (a agência de inteligência dos EUA) que a
leram, disse que resolveu tornar
pública a descoberta porque acha
que ela deveria ter sido divulgada
já há muito tempo.
"Este material é relevante para
as discussões que, como americanos, temos travado sobre a Guerra do Iraque e a reforma dos serviços de inteligência", disse Aid.
A descrição que ele fez da conclusão de Robert Hanyok foi confirmada por um funcionário de
inteligência, que falou sob a condição de anonimato, já que o acesso à pesquisa segue interditado.
Ambos disseram que Hanyok
acreditou que a falha inicial na interpretação das comunicações
norte-vietnamitas interceptadas
foi provavelmente um engano honesto. Mas, após meses de trabalho de detetive feito nos arquivos
da NSA, o historiador concluiu
que funcionários de escalão médio da agência descobriram o erro
quase imediatamente, mas o acobertaram e falsificaram documentos para que parecessem
constituir provas de um ataque.
O presidente Lyndon B. Johnson citou o incidente de 4 de agosto para convencer o Congresso,
em 1964, a autorizar a ação militar
ampla no Vietnã, apesar das dúvidas que surgiram quase imediatamente em torno do ataque.
Indagado sobre a pesquisa de
Robert Hanyok, um representante da NSA disse que a agência pretende levar o material a público
no final de novembro.
Dois historiadores que já escreveram extensamente sobre o episódio do golfo de Tonkin, Edwin
E. Moise, da Universidade Clemson, e John Prados, do Arquivo
Nacional de Segurança, em Washington, disseram não ter conhecimento do trabalho de Hanyok,
mas afirmaram que suas descobertas seriam intrigantes.
"A idéia de que teria sido cometido um logro proposital pela
NSA me surpreende", disse Moise. "Mas eu me surpreendo com
freqüência." Segundo Prados, se a
conclusão de Hanyok for correta,
"isso intensifica o aspecto trágico
da Guerra do Vietnã". Além disso,
"seria mais uma prova de que as
informações dos serviços de inteligência, tão freqüentemente tratadas como o Santo Graal, muitas
vezes revelam não ser nada disso
-como aconteceu no Iraque".
Tradução de Clara Allain
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