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Sunitas protestam por vídeo de Saddam
Cenas do enforcamento revelam humilhação; presos sunitas se rebelam, e líderes da comunidade culpam americanos
Vazamento das imagens na internet acirra tensões no
Iraque; governo fecha TV pró-sunita acusada de "incitar o sectarismo"
DA REDAÇÃO
O enforcamento de Saddam
Hussein poderia ter sido o
cumprimento de uma decisão
judicial, mesmo contestável.
Mas se tornou para os sunitas
uma nova prova política da
opressão que sofrem da maioria xiita do governo iraquiano.
"Claro, ele foi um ditador,
mas foi morto por um esquadrão da morte", disse ao "New
York Times" uma não identificada sunita de Bagdá.
Essa e outras reações foram
provocadas pelo vídeo de dois
minutos, em que Saddam Hussein, pouco antes de ser enforcado, é verbalmente agredido
por guardas e carrascos xiitas.
O registro, feito por celulares, indica ofensas verbais ao
ditador e demonstra que o episódio teve pouca dignidade.
Com isso, dizem analistas, a
execução de um déspota sangüinário, em lugar de ser vista
como a virada definitiva de
uma página para a pacificação
do país, tornou-se combustível
para as tensões sectárias.
O Conselho dos Clérigos Sunitas divulgou ontem nota em
que culpa os Estados Unidos
pela execução e exorta os iraquianos a "frustrarem os planos" das forças estrangeiras.
"Foi um ato eminentemente
político" e "uma provocação
aos sunitas", diz o texto.
Amotinamento
Cerca de 300 prisioneiros sunitas de uma prisão nas imediações de Mossul se amotinaram,
ao serem ontem informados
por familiares da execução de
sábado. Suspeitos de integrarem a insurgência, destruíram
suas células, queimaram colchões e quebraram móveis. Ao
menos sete guardas e três prisioneiros ficaram feridos. Segundo familiares ouvidos pela
Reuters, uma pessoa foi morta.
As tensões que o filmete gerou levaram o primeiro-ministro xiita Nuri al-Maliki a determinar abertura de inquérito sobre o vazamento.
O "New York Times" comenta que "o enforcamento foi precipitado e deixou de lado as
normas com que deveria ocorrer. Os policiais encarregados
de manter a ordem [ao redor da
forca] passaram a gritar palavras das milícias xiitas". "Sempre falamos dos crimes de Saddam, mas estamos nos comportando da mesma forma", disse
Alaa Makki, político sunita.
As milícias xiitas são suspeitas de atuarem com o apoio de
ministros do governo. Os Estados Unidos relançaram o apelo
à reconciliação, mas "não há
nenhuma razão para que isso
venha a acontecer", disse ao
jornal americano um político
sunita não identificado.
As circunstâncias que envolveram o enforcamento do ditador se somam à marginalização
da antiga elite sunita. A associação de acadêmicos que falava
em nome da comunidade está
hoje exilada na Síria ou na Jordânia. Há um único sunita entre os 50 vereadores da Câmara
Municipal de Bagdá.
A tensão poderia ser evitada
caso o Ministério da Justiça
mantivesse para o enforcamento um cerimonial de fria eqüidistância. O episódio, no entanto, transformou-se em ato explícito do ódio xiita. O próprio
vazamento das imagens demonstra malícia partidária.
A revista "Newsweek" entrevistou Ali al-Massedy, encarregado pelo primeiro-ministro
Maliki de registrar a cena. Ele
disse ter feito um vídeo de 15
minutos e entregue imediatamente a fita ao chefe-de-gabinete do premiê.
Mas o que deveria ter sido
uma operação controlada, para
a divulgação eventual de alguns
de seus trechos, tornou-se um
ato público, em razão da internet e dos celulares aptos a captar imagens. O relato sobre
Massedy é feito pelo blogueiro
americano Michael Roston.
Governo fecha TV
O governo iraquiano determinou ontem o fechamento
por prazo indeterminado de
uma emissora de televisão pró-sunita, a Sharkiya, por "incitar
o sectarismo" religioso.
O canal é de propriedade de
um sunita radicado em Londres, e seus estúdios funcionam
no vizinho emirado de Dubai.
O porta-voz do Ministério do
Interior, Abdul Karim Khalaf,
disse que a Sharkiya havia sido
advertida por supostamente
incitar ao confronto entre facções islâmicas.
Indagado se o fechamento tinha relação com a divulgação
de cenas do enforcamento de
Saddam, Khalaf disse que "se
nos últimos três dias vocês assistissem aquele canal, vocês
veriam que ele está exortando
as pessoas à violência e aumentando a tensão sectária".
Em novembro, quando Saddam foi condenado à morte, o
governo tirou duas emissoras
pró-sunitas do ar. A Al Jazeera
está proibida, enquanto sua rival, a Al Arabiya, teve sua sucursal de Bagdá fechada por um
mês em setembro.
Com agências internacionais
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