São Paulo, quinta-feira, 02 de abril de 2009

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Grupo é "usina ideológica" do kirchnerismo

DE BUENOS AIRES

O ex-presidente da Argentina Néstor Kirchner (2003-2007), líder do Partido Justicialista (peronista, do governo), dizia anteontem em um ato na periferia pobre da Grande Buenos Aires: "Não podemos voltar à restauração conservadora".
A expressão não veio do acaso, mas do Carta Aberta, um grupo de intelectuais e artistas que defende o legado da era Kirchner, iniciada por Néstor e hoje conduzida por sua mulher, a presidente Cristina Kirchner. "Restauração conservadora ou aprofundamento da mudança" é o título do quinto documento público do grupo, lançado ontem em Buenos Aires.
"É, ele (Néstor) leu a carta", disse à Folha Ricardo Forster, professor da Faculdade de Ciências Sociais da Universidade de Buenos Aires e fundador do grupo. Para ele, a Argentina vive a "ofensiva de uma direita agromidiática" que "bloqueia estradas e agita conspirações".
O Carta Aberta surgiu em março de 2008, em meio ao conflito do governo com o setor rural. "Vimos que, mais do que um protesto social, havia uma busca de deslegitimação do governo", diz Forster.
Em pouco tempo, o grupo passou a municiar os discursos oficiais. A primeira carta, de abril de 2008, falava de um "clima destituinte" no país, em razão dos protestos rurais. Na semana passada, Néstor instou os ruralistas a deixarem a "ladainha destituinte".
Para a revista "Notícias", de perfil opositor, trata-se da "usina ideológica" do governo, que comporta "um pouco de tudo": de "peronistas cinquentões a radicais (militantes da União Cívica Radical) arrependidos".
A crise rural derrubou a popularidade de Cristina (hoje em cerca de 30%), sobretudo na classe média urbana. Forster diz que é "sempre bom ter cuidado com pesquisas, construções politico-ideológicas". Afirmou que as eleições legislativas deste ano "vão mostrar um governo muito menos debilitado do que se supunha".
Para o Carta Aberta, a Argentina está dividida entre defensores de modelos antagônicos: a política de redistribuição de renda promovida pelos Kirchner e o modelo agroexportador de inspiração neoliberal.
Do bunker principal saem defesas das principais medidas da era Kirchner, como o julgamento dos crimes da ditadura e a estatização da Previdência privada. Mas há espaço para críticas às estatísticas oficiais de inflação e de pobreza, sob suspeita de manipulação. "Uma dívida do governo é revisar o funcionamento do Indec (o IBGE local)", diz Forster.
O grupo faz reuniões quinzenais na Biblioteca Nacional. Em dezembro, Néstor foi ao brinde de fim de ano.
A influência do grupo não se restringe ao plano ideológico. Ele teve participação na redação do projeto oficial de uma nova lei que vai regular o futuro das comunicações e atinge o maior grupo de mídia do país, o Clarín, crítico do governo.


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