|
Texto Anterior | Próximo Texto | Índice
UM ANO DEPOIS
No aniversário da volta ao controle chinês, o território enfrenta recessão, enquanto Pequim ganha prestígio
China exibe mais ganhos do que Hong Kong
JAIME SPITZCOVSKY
Editor de Exterior e Ciência
Um ano depois do retorno de
Hong Kong ao controle chinês, o
governo em Pequim contabiliza
mais motivos para comemorar do
que a população da ex-colônia britânica. Enquanto um dos pólos
mais importantes da economia
asiática mergulha em recessão, a
China atravessa um momento político especialmente propício.
Não se confirmaram as previsões, às vezes catastróficas, de que
a "mão de ferro" de Pequim estrangularia a democracia em
Hong Kong, apesar da fórmula
"um país, dois sistemas". De
acordo com o esquema costurado
por Londres e Pequim em 1984, a
ex-colônia manteria seu sistema
liberal e capitalista por pelo menos
50 anos.
Às vésperas da devolução, em
97, o governo chinês enfrentava as
acusações de ser uma entidade desacostumada com a convivência
democrática que contagiaria
Hong Kong com o vírus da intolerância.
Na terça-feira, um militante anti-Pequim queimou um retrato do
presidente chinês, Jiang Zemin,
diante de policiais. Não foi incomodado.
A imprensa de Hong Kong sobrevive como uma das mais vibrantes da Ásia. Também a emblemática homenagem aos mortos na
repressão em 1989 ao movimento
pró-democracia da praça Tiananmen, em Pequim, ocorreu no mês
passado sem incidentes.
Se no atacado a China respeita as
liberdades políticas, ainda existem
problemas no varejo. O principal é
o Parlamento local, eleito por um
mecanismo que garante maioria
às forças pró-Pequim, num projeto destinado a garantir tranquilidade ao governador Tung
Chee-hwa, afilhado político de
Jiang Zemin.
Também resta como ameaça a
lei de sedição, ainda em debate. A
imprensa de Hong Kong teme
uma legislação que pode considerar "traição" críticas a Pequim.
No entanto, a China de Jiang
emite sinais de uma tímida liberalização, como exemplifica a viagem de Clinton ao país. As críticas
da Casa Branca a Pequim foram
transmitidas pela TV chinesa ao
vivo, num fato inédito.
O respeito da China à maioria
das liberdades civis de Hong Kong
também fortalece a estratégia de
Jiang para Taiwan. Ontem, o presidente voltou a oferecer o modelo
"um país, dois sistemas" para a
reunificação com a "ilha rebelde", um objetivo estratégico para
Pequim.
A fórmula também vai reger a
volta de Macau, hoje sob administração portuguesa, ao controle
chinês em dezembro de 1999. Taiwan, no entanto, afirma que aceita
a reunificação apenas depois de a
China se democratizar.
A pressão sobre Taiwan aumenta, enquanto a China recupera
prestígio internacional. Além do
sucesso, até agora, da fórmula
"um país, dois sistemas" e da
reaproximação com os EUA, Pequim ganha credibilidade ao atuar
como uma das raras âncoras de estabilidade no cenário turbulento
da economia asiática.
Recessão
Apesar da pressão provocada
pela depreciação das moedas em
países vizinhos, a China não desvalorizou o seu yuan. A posição
chinesa também contribui para
recuperar a confiança na economia de Hong Kong, pois Pequim
promete atuar no sentido de
apoiar a ex-colônia britânica e evitar um quadro econômico pior do
que o atual.
"A turbulência ainda não acabou. A economia de Hong Kong
ainda vai enfrentar dificuldades
durante certo tempo", declarou
ontem Jiang Zemin.
Ironia da história: em anos passados, Hong Kong despontou como motor principal das reformas
pró-capitalismo na China. Hoje, a
China ajuda a manter o capitalismo de Hong Kong.
Vítima da crise asiática, Hong
Kong enfrenta o maior índice de
desemprego em 15 anos, e sua economia mergulhou em recessão
(veja quadro nesta página). Neste
aniversário, não há tantos carros
Rolls-Royce, tanto champanhe e
caviar como nas festas em julho do
ano passado.
Texto Anterior | Próximo Texto | Índice
|