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São Paulo, sábado, 02 de agosto de 2003

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REINO UNIDO

Além do premiê, o ministro da Defesa, o diretor de Comunicação do governo, dirigentes da BBC e jornalistas serão ouvidos

Blair deporá em inquérito sobre cientista

MARIA LUIZA ABBOTT
DE LONDRES

O premiê britânico, Tony Blair, vai depor no inquérito que vai investigar as circunstâncias da morte do funcionário do Ministério da Defesa David Kelly, principal fonte de reportagens da rede pública BBC que acusaram o governo de ter exagerado informações dos serviços de inteligência num dossiê sobre o Iraque.
Kelly foi encontrado morto. O caso está sendo tratado como suicídio depois do vazamento de seu nome à imprensa pelo Ministério da Defesa e de ele ter prestado depoimento no comitê do Parlamento britânico que investigava a disputa entre o governo e a BBC.
O inquérito foi aberto ontem por um juiz independente -lorde Brian Hutton. Além de Blair, vão depor o ministro da Defesa, Geoff Hoon, o diretor de Comunicação do governo, Alastair Campbell, dirigentes da BBC e os três jornalistas que fizeram suas reportagens depois de conversas com Kelly, que era um dos maiores especialistas britânicos em armas de destruição em massa.
A abertura do inquérito ofuscou o que deveria ser um momento de festa para Blair. Hoje ele se torna o trabalhista que mais tempo ocupou o cargo de premiê na história do país, mas a notícia de que ele vai depor tomou conta da mídia no país ontem.
Especialistas estimam que o inquérito deva durar meses, ocupe as manchetes dos jornais e possa causar problemas para o premiê. O juiz disse que o inquérito será público, com a permissão para que jornalistas acompanhem diretamente os depoimentos.
As transcrições do que disserem as testemunhas serão postas num site criado especialmente para que as pessoas possam acompanhar todos os detalhes do caso (www.the-hutton-inquiry.org.uk).
A abertura do inquérito, com a leitura de seus objetivos, foi transmitida ao vivo pelas TVs. Lorde Hutton disse que será autorizada a transmissão do anúncio das suas conclusões. Ontem, porém, a família de Kelly pediu ao juiz que as TVs não transmitam os depoimentos. Ela não quer que o sofrimento que eles passaram se torne um "entretenimento" nacional. Lorde Hutton só deve decidir se permite a transmissão ao reabrir o inquérito, no próximo dia 11 de agosto.
Ontem, o juiz deixou claro que não pretende ser influenciado por nenhum dos lados nessa dura disputa entre o governo britânico e a BBC.
"Somente eu decidirei quais testemunhas serão chamadas", disse. Políticos que se opuseram à Guerra do Iraque pediram que o inquérito investigue também como o governo preparou o dossiê e como ele utilizou as informações dos serviços de inteligência.
Para Fenton Bresler, especialista em direito, o âmbito do inquérito é vago, havendo espaço para que lorde Hutton investigue isso, mas não está claro se isso vai mesmo acontecer. O juiz não tem poder para convocar testemunhas nem para exigir que documentos sejam fornecidos à corte. Blair já tinha dito que iria colaborar. Segundo Bresler, que lembrou que a pressão da opinião pública é muito forte, tantas coisas estão em jogo que ninguém poderá recusar-se a cooperar com o inquérito.
Blair e os demais integrantes do governo serão questionados sobre como o nome de Kelly vazou à imprensa, mas também é grande a pressão sobre a própria BBC. Ontem surgiu uma carta de Kelly a seu superior no ministério, em que ele levanta a possibilidade de o jornalista Andrew Gilligan, autor da primeira reportagem da BBC, ter "enfeitado" detalhes da conversa que os dois tiveram em um restaurante, em Londres.


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