São Paulo, sexta-feira, 02 de setembro de 2005

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TRAGÉDIA

Faltam comida, água, remédios e transporte; autoridades falam em "situação explosiva" e pedem ajuda imediata

Resgate em Nova Orleans tem tiros e caos

PEDRO DIAS LEITE
ENVIADO ESPECIAL A BILOXI (MISSISSIPPI)
DA REDAÇÃO


A operação de resgate e transferência de desabrigados terminou ontem em briga, tiroteio e caos generalizado em Nova Orleans, onde a tensão, o desespero e a impaciência da população em ser salva atingiram níveis alarmantes.
"Este é um SOS desesperado", disse Ray Nagin, prefeito da cidade que ficou 80% submersa após o rompimento de três diques que contêm o lago Pontchartain, após a passagem do furacão Katrina.
Em diversas áreas de Nova Orleans, equipes de resgate foram atacadas a tiros pelos desabrigados, forçando a interrupção das operações por questões de segurança. Um membro da Guarda Nacional levou um tiro na perna em briga pela posse de um rifle. Com isso, o governo estadual anunciou a chegada à cidade de 300 soldados, que estavam no Iraque, armados de fuzis e com permissão de atirar nos saqueadores.
A poucos quilômetros dali, em Biloxi (Mississippi), onde foi registrado grande número de mortos, a reportagem da Folha presenciou um cenário também caótico, com corpos pelas ruas.
Os meios de comunicação, inclusive por celular, foram cortados. Não há transporte público. Para eventuais deslocamentos, é preciso contar com a boa vontade dos que podem oferecer uma carona, cada vez mais raras devido à falta de combustível que já provoca filas nos postos.
No estádio Superdome de Nova Orleans, de onde 25 mil pessoas têm de ser transferidas para o Houston Astrodome (Texas), houve empurra-empurra e briga entre a multidão de desabrigados que tentava embarcar nos ônibus.
Segundo a governadora de Louisiana, Kathleen Blanco, cerca de 300 mil pessoas precisam ser retiradas de todo o Estado.
O chefe das operações de emergência da cidade, Tony Ebbert, alertou que a vagarosa retirada da cidade se tornou "uma situação incrivelmente explosiva" e reclamou de falta de ajuda federal.
"Essa é uma desgraça nacional. A Agência Federal de Emergência está aqui há três dias, mas não há comando nem controle. Podemos enviar quantidades enormes de ajuda para as vítimas do tsunami, mas não podemos salvar a cidade de Nova Orleans."
No Centro de Convenções da cidade, o sentimento de revolta era evidente. "Estamos largados aqui como animais. Não temos ajuda", disse o reverendo Issac Clark, 68, do lado de fora do centro, onde os cadáveres se acumulavam ao ar livre e os desabrigados reclamavam comida, água e remédios.
"Não trato meu cachorro dessa maneira. Eu enterrei meu cachorro", disse Daniel Edwards, apontando para uma mulher morta numa cadeira de rodas, coberta por um cobertor. "Você pode fazer tudo por outros países, mas não pode fazer nada por seu próprio povo. Você pode mandar seus militares para o exterior para não poder trazê-los aqui", acrescentou Edwards. "Estão nos prometendo ônibus há quatro dias."
O prefeito Nagin também pediu mais ajuda. "Estamos sem recursos no Centro de Convenções e não temos ônibus suficientes. Precisamos de ônibus. O centro não tem condições sanitárias e estamos ficando sem suprimentos."
Em Washington, o secretário da Segurança Interna, Michael Chertoff, anunciou o envio de 1.400 soldados por dia para somar-se aos 2.800 que já estão em Nova Orleans, em uma tentativa de conter os saques e a violência. Em toda a região afetada, são 28 mil os guardas enviados, na maior operação militar em uma catástrofe natural já realizada pelos EUA.
O Itamaraty informou que, até agora, não foram identificadas vítimas brasileiras nas áreas atingidas pelo furacão. A Divisão de Assistência Consular disponibilizou uma linha telefônica e um endereço eletrônico para pedidos de localização de brasileiros.


Com agências internacionais

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