São Paulo, sexta-feira, 02 de setembro de 2005

Texto Anterior | Próximo Texto | Índice

ANÁLISE

Um grande desafio político para Bush

ERIC LESER
DO "LE MONDE", EM BATON ROUGE, LOUISIANA

Na quarta-feira, 31 de agosto, o prefeito de Nova Orleans, Ray Nagin, e a governadora da Louisiana, Kathleen Blanco, não escondiam sua irritação diante da lentidão com que o governo do presidente George W. Bush estava reagindo à catástrofe no sul do país.
Eles criticavam os departamentos e as agências governamentais por terem esperado pelo menos dois dias para compreender a extensão da tragédia e o Exército por não ter agido mais rapidamente para fechar os rombos nos diques que permitiram que a água invadisse mais de 80% de Nova Orleans.
Bush, freqüentemente acusado de tirar férias demais, interrompeu as férias que passava em sua fazenda em Crawford, no Texas, para retornar a Washington, anteontem, onde concedeu uma entrevista coletiva à imprensa para destacar ao mesmo tempo a extensão dos danos humanos e materiais e os esforços empreendidos por seu governo para enfrentar o drama.
O que está em jogo, para o presidente, é considerável. Ou ele reencontra um pouco da estatura de "comandante-em-chefe" adquirida após os ataques terroristas de 11 de setembro de 2001 contra o World Trade Center e o Pentágono, ou então sua popularidade -que já está baixa, tanto que as últimas sondagens apontaram que apenas 40% dos eleitores se disseram satisfeita com sua atuação- continuará a cair.

Iraque, Nova Orleans
A situação política de Bush tende a piorar especialmente se a crise humanitária na Louisiana e no Mississippi continuar a se agravar. Muito antes da chegada do furacão Katrina, vários Estados já se queixavam de não poder mais contar com a Guarda Nacional, maciçamente utilizada no Iraque, em casos de urgência.
Esses temores foram confirmados diante das cenas de saques repetidos e de caos em Nova Orleans, cenas que as autoridades foram incapazes de evitar, mesmo tendo enviado, anteontem, 3.500 soldados adicionais à cidade inundada.
Neste momento, aproximadamente 3.800 integrantes da Guarda Nacional do Mississippi se encontram no Iraque, além de 3.000 do Louisiana.
A situação se tornou tão chocante aos olhos da opinião pública que na noite de anteontem, numa decisão polêmica, o Pentágono autorizou o almirante Timothy Whitaker, que dirige o comando militar do norte, a enviar tropas da ativa para restabelecer a ordem em Nova Orleans.
Legalmente, apenas o presidente pode autorizar o uso de unidades regulares do Exército em operações como essa, em virtude da lei federal que regulamenta a ação contra as insurreições.
Outro teste importante foi o do novo Departamento da Segurança Interna, que, concebido para combater o terrorismo, se debate contra problemas burocráticos intermináveis.

Trunfo político
Mas a catástrofe pode também se transformar em trunfo para a Casa Branca se fizer a Guerra no Iraque e a oposição ao conflito passarem para o segundo plano.
Ela pode, também, levar o país a unir-se, por algum tempo, em torno da reconstrução dos Estados do golfo do México, reconstrução essa que vai se tornar uma causa nacional. Em várias ocasiões George W. Bush já se descreveu como administrador de crises, e foi essa imagem, especialmente, que lhe permitiu ser reeleito em 2004. Os americanos confiaram nele e em sua capacidade de protegê-los.
Para a administração americana, a equação política talvez dependa sobretudo das conseqüências econômicas do furacão, especialmente seus desdobramentos sobre o preço da gasolina nos postos de combustível.
Se a gasolina continuar por muito tempo a ser vendida por mais de US$ 3 o galão (3,7 litros) em vários Estados, isso terá conseqüências imediatas para o poder de compra dos americanos, para o consumo, e assim por diante, terminando por incidir sobre o desemprego -tema que por muito tempo deu munição aos opositores de Bush.
Nesse caso, a Casa Branca correrá o risco de perder o único elemento do qual podia se gabar: o fato de ter arrancado o país da recessão e, nos últimos dois anos, ter garantido um crescimento econômico sustentado e a criação de 3 milhões de empregos.


Tradução de Clara Allain

Texto Anterior: EUA aceitam ofertas de ajuda internacional
Próximo Texto: Terror: Revolta marca 1 ano do massacre de Beslan
Índice


Copyright Empresa Folha da Manhã S/A. Todos os direitos reservados. É proibida a reprodução do conteúdo desta página em qualquer meio de comunicação, eletrônico ou impresso, sem autorização escrita da Folhapress.