São Paulo, sexta-feira, 03 de janeiro de 2003

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Greve ainda não "cansou", afirmam analistas

ROGERIO WASSERMANN
DA REDAÇÃO

Após um mês de greve geral, sem nenhum sinal de que o governo de Hugo Chávez vá ceder à pressão oposicionista, os organizadores da paralisação não dão mostras de que poderão abandonar o movimento, na avaliação de analistas consultados pela Folha.
"As pesquisas mostram que o apoio à greve geral aumentou ao longo do mês", diz Alfredo Keller, do instituto de pesquisa Alfredo Keller e Associados. Segundo levantamentos do instituto, 16% dos venezuelanos diziam apoiar totalmente a greve geral em seu início. Na semana passada, esse índice já havia subido para 54%.
As declarações do líder oposicionista Américo Martín, um dos dirigentes da Coordenação Democrática (organização que reúne partidos, organizações e entidades da oposição) -que anteontem anunciou uma suspensão "parcial" da greve, com o retorno ao trabalho dos pequenos comerciantes-, também não foram consideradas uma mostra de cansaço da oposição.
"Sua declaração parece ser mais uma estratégia política, para alertar sobre a ampliação do movimento a partir da semana que vem, quando recomeçam as aulas e termina o recesso tradicional do Ano Novo", diz a analista Maria Teresa Romero, da Universidade Central da Venezuela.
Para ela, a próxima segunda-feira será o grande teste da paralisação. "Com o fim do recesso, vamos ver se as atividades começam a se normalizar ou não", diz ela, acrescentando que os sinais dos últimos dias "parecem indicar que a greve vai seguir igual".
Os analistas consideram que a oposição concentra todas as suas fichas na paralisação da indústria de petróleo, o setor mais sensível da economia venezuelana, responsável por 80% das exportações do país. "A greve no setor petrolífero é fundamental para a oposição", diz Romero. "O governo diz que está tudo normal, mas, ao mesmo tempo, seus porta-vozes dizem que as tentativas de solucionar a crise, como a chegada de um navio com gasolina do Brasil, foram paliativas", diz.
Para ela, se a proposta da oposição de boicotar o pagamento de impostos for seguida, será "um coquetel molotov contra o governo". "Com as exportações de petróleo paralisadas e o pagamento de impostos estancado, o governo, sem receita, teria de queimar ainda mais reservas internacionais, agudizando a já grave crise econômica", afirma.
"A paralisação no comércio não tem muito sentido prático, porque não afeta o governo como a paralisação no setor petrolífero", diz Alfredo Keller. "Por necessidade de fluxo de caixa, os pequenos comerciantes não podem ficar parados", afirma.
Para ele, "o governo comete um erro de estratégia ao dizer que a situação está normal". "Agindo assim, ele entram em contradição com as evidências e perde credibilidade", afirma. Segundo ele, a última pesquisa realizada por seu instituto mostrou que as posições do governo perdem apoio até mesmo entre os simpatizantes de Chávez -70% dos chavistas já consideram que uma saída eleitoral é a melhor solução para a atual crise política no país.
O governo procura manter sua base de apoio, concentrada principalmente entre a camada mais pobre da sociedade, atendendo-a de maneira privilegiada durante a atual crise. Para contrapor o desabastecimento provocado pela greve geral, o governo vem organizando grandes mercados populares nos bairros mais pobres, além de priorizar os postos de gasolina das zonas mais populares na hora de distribuir combustível.
Segundo Keller, há uma espécie de "auto-racionamento" promovido pelos consumidores que apóiam a greve geral. "Eles estão consumindo menos combustível e menos alimentos, porque consideram isso também uma atitude política de contrariedade ao governo", diz.



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