São Paulo, domingo, 03 de setembro de 2000


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VIZINHO EM CRISE

País terá problemas para monitorar possível invasão causada pelo conflito colombiano, diz especialista britânico

Analista vê falhas do Brasil na fronteira

IGOR GIELOW
COORDENADOR DA AGÊNCIA FOLHA

O conflito colombiano vai se espalhar para os países vizinhos, obrigando algum tipo de acerto entre os governos e os Estados Unidos. Por sua política antiintervencionista, o Brasil pode assistir em breve a uma invasão de seu território amazônico -e não está 100% preparado para isso.
A opinião não é de nenhum chefe de Estado mais exaltado presente ao encontro dos presidentes sul-americanos, encerrado anteontem, ou de algum militar linha-dura. É do coronel reformado Terence Taylor, diretor-assistente do IISS (sigla inglesa para Instituto Internacional para Estudos Estratégicos).
Fundado em Londres em 1958, o IISS foi um dos primeiros e é o mais prestigioso núcleo de estudos internacionais e militares da Europa pós-Guerra.
Taylor descarta o ""cenário Vietnã" alardeado pelo presidente venezuelano, Hugo Chávez. Segundo ele, a política de ""vítimas-zero" (entre os seus) dos EUA vai impedir quaisquer ações militares na linha de frente. ""O Plano Colômbia é basicamente de treinamento. O uso de tropas é quase nulo. Além disso, a situação é muito mais complexa do que a de um Sudeste Asiático dividido entre EUA e União Soviética."
No raciocínio de Taylor, a pressão será grande sobre as Farc e outros grupos rebeldes. ""Com certeza haverá um movimento para fora das fronteiras. É inevitável que eles se espalhem."
Com isso, segue ele, governos vizinhos terão de lidar com a infiltração. E isso significará, provavelmente, novos acordos com os Estados Unidos. ""O próprio Clinton, na Colômbia, já acenou com essa ajuda aos vizinhos", disse.
E o Brasil? ""Por sua posição de força no continente, creio que será difícil aceitar inicialmente um acordo com os EUA. Houve relutância até na Colômbia", afirmou Taylor, ressaltando não estar emitindo um juízo de valor. Mas, diz ele, o Brasil não parece estar preparado para o desafio.
O problema, diz Taylor, não são as tropas. O Brasil tem hoje 22 mil homens na região amazônica. ""É impossível patrulhar o solo numa floresta. Tudo passa pela capacidade de monitoramento por radar e por observação aérea. E nisso o Brasil está atrasado", diz Taylor, municiando involuntariamente os defensores do projeto Sivam (Sistema de Vigilância da Amazônia).
O fato de a Embraer estar preparando versões de observação eletrônica do jato regional ERJ-145 para a FAB vigiar a Amazônia pode amenizar o problema, mas talvez não em tempo hábil.
Para Taylor, mais cedo ou mais tarde será necessária alguma colaboração entre os EUA e o Brasil. "Só não é possível dizer quando e como será isso."
Para exemplificar as dificuldades, ele cita a negociação na Colômbia. ""Até agora não há uma aceitação plena do plano lá. Grupos mais à esquerda são totalmente contra, e a direita paramilitar e militar também se vê ameaçada porque os EUA estão exigindo a adoção de códigos de direitos humanos na região", diz, referindo-se à fama pouco honrosa do Exército colombiano e das milícias conservadoras em respeito aos direitos do cidadão.
Ele vê outros problemas com o plano. O US$ 1,3 bilhão aplicado imediatamente não contempla outros aspectos senão o militar. "A aplicação é desigual, faltam investimentos sociais junto às populações das áreas afetadas. Além disso, nada se faz em relação às rotas que levam a droga para fora do país", disse.
Com 2.000 membros, o IISS é um dos poucos locais na União Européia onde o tema Colômbia é levado a sério. Taylor critica duramente a posição olímpica dos europeus na questão.
"Fico decepcionado com a posição da Europa. Nós, como mercado consumidor (de drogas), somos tão responsáveis quanto os EUA na solução desse problema. Mas nossos governos fingem que não é com eles", afirma Taylor, que em abril participou de uma megaconferência militar em Bogotá.
Lá ele criticou a posição do governo Andrés Pastrana. "Ele cedeu demais ao permitir os bolsões rebeldes. O que ganhou em troca? Nada. Ele é quem deveria estar numa posição de força."


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