São Paulo, sexta-feira, 03 de setembro de 2004

Próximo Texto | Índice

CÁUCASO

Rússia descarta "no momento" uso da força na Ossétia do Norte para tentar libertar centenas que continuam presos

Terroristas soltam 26 dos reféns da escola

DA REDAÇÃO

Os terroristas que invadiram uma escola de Beslan, na república russa da Ossétia do Norte, soltaram ontem 26 crianças e mulheres. As negociações prosseguem para libertar as centenas de reféns que estão no prédio cheio de explosivos. A Rússia descartou "no momento" o uso da força.
"Nossa principal missão é salvar a vida e a saúde dos reféns. Todas as ações de nossas forças serão devotadas à resolução dessa missão", afirmou Putin, que cancelou uma viagem à Turquia. Valery Andreyev, chefe da FSB (ex-KGB, a polícia secreta soviética) na Ossétia do Norte, disse que "não se cogita no momento a opção pela força. Haverá um longo e tenso processo de negociação".
Ontem à noite, o porta-voz do governo regional, Lev Zugaivev, disse que sua estimativa de que havia 354 reféns pode ter subdimensionado o total. Em Beslan, muitos acreditam que o número é bem maior. "Putin: pelo menos 800 pessoas estão como reféns", dizia um cartaz erguido por um manifestante. A escola tem cerca de 900 alunos, de 7 a 17 anos.
Os seqüestradores deixaram algumas crianças e a diretora da escola usar o telefone. Em conversas com familiares, elas disseram que a situação é "suportável".
A espera dos parentes atrás da cerca montada pelas forças russas, cuja distância impede a visão da escola, foi marcada por sons de tiros e de explosões de granadas jogadas de dentro da escola.
A decisão dos terroristas de soltar um grupo de reféns aconteceu após negociações com o ex-presidente da Inguchétia Ruslan Aushev, que chegou a entrar no prédio e acompanhou a saída das 11 mulheres e 15 crianças. Aushev é um dos maiores críticos da política de Putin para a Tchetchênia.
Outro negociador, o pediatra Leonid Roshal, que participou das conversações com os separatistas tchetchenos que invadiram um teatro de Moscou em 2002, descreveu a soltura como uma "grande vitória". "Mas se você olhar para o quadro completo, é uma gota no oceano. Ainda há muito trabalho pela frente."
Roshal disse que os terroristas continuam sem permitir a entrada de água e comida no prédio. O negociador acredita que um fim trágico para a crise pode produzir "uma guerra entre povos fraternos". "Apelo à sabedoria dos inguchétios, ossétios e tchetchenos para evitar uma guerra."
O norte do Cáucaso está há muito tempo dominado pela falta de confiança e de paz. A Ossétia, de maioria religiosa ortodoxa, é a principal base de apoio da Rússia na luta contra os separatistas da república vizinha Tchetchênia, predominantemente muçulmana. No início dos anos 90, centenas foram mortos em um conflito territorial entre ossétios e os vizinhos inguchétios -cuja etnia é mais próxima da dos tchetchenos.
Os seqüestradores exigem em troca da vida dos reféns a saída das tropas russas da Tchetchênia e a libertação de rebeldes presos na Inguchétia em junho. As exigências e o modo de operação levam a crer que os terroristas sejam separatistas tchetchenos, mas até agora o ataque ainda não foi reivindicado por nenhuma organização. Segundo o ministro Dzantiyev, o grupo de cerca de 20 terroristas que tomou a escola é composto por caucasianos (tchetchenos, inguchétios e ossétios) e russos. Andreyev, da FSB, disse que vários já foram identificados.
O Kremlin mantém uma posição dura em relação à Tchetchênia por temer que, se a república integrante da Federação Russa conquistar sua independência, outras na região passarão a exigir maior autonomia ou mesmo a separação.
"Hoje é a Ossétia do Norte, com o problema vindo da Inguchétia e da Tchetchênia. Amanhã pode ser Kabardino-Balkária ou Daguestão. A Rússia não se sente forte no norte do Cáucaso. Há muitos problemas", disse Alex Rondeli, analista político da Geórgia.
O Itamaraty divulgou nota ontem em que "condena a recente escalada de ações terroristas verificada em território da Federação da Rússia".


Com agências internacionais e jornal "Financial Times"


Próximo Texto: "Esses bastardos têm de morrer", afirma parente
Índice


Copyright Empresa Folha da Manhã S/A. Todos os direitos reservados. É proibida a reprodução do conteúdo desta página em qualquer meio de comunicação, eletrônico ou impresso, sem autorização escrita da Folhapress.