São Paulo, sexta-feira, 03 de setembro de 2004

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TERROR

Os réus foram julgados sob acusação de integrar a "conexão argentina" do ataque, que matou 85 pessoas, há dez anos

Argentina absolve os 22 acusados do atentado à Amia

CLÁUDIA DIANNI
DE BUENOS AIRES

A Justiça argentina absolveu ontem todos os 22 acusados de envolvimento na chamada "conexão nacional" do atentado contra a Associação Mutual Israelense Argentina (Amia), ocorrido em 18 de julho de 1994. Foi a maior ação terrorista da história do país -matou 85 pessoas. Os argumentos que levaram ao veredicto serão divulgados em 40 dias.
O mecânico Carlos Telledin, acusado de preparar a van que foi usada para explodir o edifício, está preso há dez anos, mas ainda não será solto porque está sendo investigado por roubo de carro, o que requer a sua prisão preventiva. Mas os cinco policias acusados de facilitar as operação de Telledin, presos há oito anos, serão libertados. Outros 17 indiciados sob acusação de extorsão também foram absolvidos.
"Neste momento estou estupefata. Mal posso dizer o que sinto. Vamos apelar, mas temos de esperar para saber sob quais argumentos chegaram a essa conclusão. Não responderam às provas que apresentamos", disse Marta Nercellias, advogada da Amia.
Familiares das vítimas prometeram apelar a tribunais internacionais e já preparam uma manifestação para hoje.
"Vamos denunciar o Estado argentino por encobrir o atentado, por não atuar para evitá-lo e por obstruir a investigação", disse o familiar Sérgio Bustein.
Durante os dez anos que separaram o julgamento de ontem do atentado, várias provas desapareceram, e o juiz Juan José Galeano, o primeiro a conduzir as investigações até 2002, foi afastado por ter usado US$ 400 mil de um fundo do Estado para "comprar" a confissão de Telledin.
A Side, polícia secreta argentina, sumiu com 66 fitas cassete com gravações de conversas telefônicas de Telledin, sua agenda eletrônica e vários rolos de filmes fotográficos, material que havia sido aprendido da casa de Telledin.
As investigações foram divididas em duas frentes. As relacionadas à conexão local trataram de investigar a organização do atentado e chegou a Telledin e aos policias que tiveram encontros com ele dias antes do atentado.
As investigações da conexão internacional tentam seguir as pistas dos mandantes do atentado e apontam para o Irã e para células do grupo extremista libanês Hizbollah na Tríplice Fronteira (entre Brasil, Argentina e Paraguai).
Recentemente foram identificados telefones celulares que fizeram chamadas a Telledin de locais da Tríplice Fronteira -um deles pertencia a um brasileiro.
Entre 2001 e 2003, outro brasileiro, Wilson dos Santos, cumpriu pena de três anos em Buenos Aires por falso testemunho. Duas semanas antes do atentado, ele havia avisado ao Consulado de Israel em Milão que a explosão ocorreria, mas depois desmentiu.
Em julho, a Justiça argentina encerrou, por falta de provas, o processo que investigava a acusação segundo a qual o ex-presidente Carlos Menem (1989-99) recebeu US$ 10 milhões de suborno de Teerã para não acusar o governo iraniano pela ação.
A maioria dos familiares das 85 vítimas deixou de acompanhar o processo há cerca de três meses e não assistiram ao julgamento de ontem. De acordo com Luis Szyczewsky, representante das família, o afastamento é um protesto pela maneira com que a Justiça conduziu as investigações.
"Interrogaram as vítimas durante horas e perguntaram de tudo, mas os policiais e funcionários públicos foram poupados. Nunca faziam as perguntas que queríamos e se contentavam como respostas como "não me lembro'", disse Szyczewsky.
A comunidade judaica na Argentina já havia sido alvo de um ataque de grandes proporções antes do atentado à Amia. Em 1992, uma bomba destruiu a Embaixada de Israel em Buenos Aires, deixando 29 mortos. Também nesse caso, ninguém foi punido.


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