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MISSÃO NO HAITI
Comandante Heleno afirma que EUA, Canadá e França querem que soldados do Brasil ajam com mais força
"Recebo pressão por violência", diz general
RANIER BRAGON
DA SUCURSAL DE BRASÍLIA
O comandante da missão da
ONU no Haiti, o general brasileiro Augusto Heleno Ribeiro Pereira, afirmou ontem que sofre pressões de países como os Estados
Unidos, Canadá e França para ser
mais "robusto na utilização da
força" como forma de controlar a
situação no país, que entrou em
sua mais recente crise após a queda de Jean-Bertrand Aristide em
fevereiro.
Também ontem, o ministro
Celso Amorim (Relações Exteriores) fez duras críticas aos países
desenvolvidos, que estariam mais
preocupados com os problemas
do Haiti que podem afetá-los, como o tráfico e ondas migratórias,
do que com a nação caribenha em
si.
Heleno, que participou de audiência pública na Comissão de
Relações Exteriores da Câmara,
disse que vem resistindo à opinião desses países, que teriam
uma concepção de força de paz
diferente da do Brasil -esta é a
maior missão envolvendo militares brasileiros desde a Segunda
Guerra Mundial.
"Recebo muita pressão para
usar a violência, para ser mais robusto na utilização da força, principalmente dos países mais interessados na área e cuja atuação de
força de paz difere da nossa", afirmou o general, enquanto exibia
um slide com os nomes dos Estados Unidos, Canadá e França,
além da inscrição "outros países"
e "população local" como integrantes do grupo de pressão.
Segundo ele, sua atuação tem sido de ponderação. "Sou expert
em utilizar a violência, sou pago
para utilizar institucionalmente a
violência, mas, se extrapolar, sei
que serei cobrado por meu próprio país", declarou.
A missão das Nações Unidas no
país caribenho, aprovada em
abril, conta atualmente com um
contingente militar estrangeiro de
4.790 soldados, sendo que a maior
força, com 1.198 integrantes, pertence ao Brasil.
Na comissão da Câmara, o general afirmou que espera contar
até o final do ano com os 6.100 soldados previstos inicialmente na
formação da força de paz e pediu
aos congressistas que aprovem o
envio de mais uma infantaria brasileira, com 365 homens, e uma
companhia de engenharia, com
mais 150 soldados.
"Canção de ninar"
Sobre o tiroteio que ocorreu
próximo ao local que recebia anteontem a visita do secretário de
Estado norte-americano, Colin
Powell, Heleno afirmou que tudo
não passou de coincidência.
"Aquela favela é brava [se referindo a Bel Air, em Porto Príncipe, capital do Haiti]. Tive informações que a Polícia Civil jordaniana reagiu pomposamente a alguns tiros e houve aquela barulhada. Mas barulho de fogo faz
parte da canção de ninar das
criancinhas de lá, não houve nada
de mais", afirmou.
O general fez uma ampla exposição da atual situação social, econômica e comportamental que vê
no Haiti, afirmando, entre outras
coisas, que há uma convivência
"harmônica" entre a população e
o lixo. Ele cobrou a efetivação dos
programas humanitários no país,
que estariam presos a entraves
burocráticos, como forma de a
ação militar ter efeito.
"Os projetos de desenvolvimento não decolam, essa é minha
grande briga desde que cheguei
lá", afirmou, explicando que os
países cobram mais segurança
para iniciar os projetos. "Defendo
que a realização dos projetos aumentará a segurança", disse,
acrescentando que essa é uma posição defendida pelos países sul-americanos.
Heleno não quis opinar sobre o
tempo em que as tropas brasileiras devem permanece no país caribenho, mas disse que declarações de que o Brasil abandonará o
Haiti se a situação se agravar não
têm o seu respaldo. "Se depender
de mim, o Brasil não vai sair se a
situação se agravar. Estou ali para
correr riscos e gosto de correr riscos", disse.
Por fim, o general apontou que
há outro grande problema a ser
enfrentado: o desarmamento e inserção social dos ex-militares,
além do enfrentamento a grupos
rebeldes e criminosos, ações que
estariam sendo dificultadas pelo
fato de a ONU não permitir que
suas missões desenvolvam serviços de inteligência.
Sobre os ex-militares, Heleno
disse que o problema é mais grave, já que eles contam com simpatia popular, o que dificulta qualquer tentativa de atuação.
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