São Paulo, quarta-feira, 04 de fevereiro de 2004

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À VONTADE

Público reage bem às mudanças do pré-candidato, e sua campanha eleitoral ganha força

Ascensão deixa senador mais relaxado

TODD S. PURDUM
DO "NEW YORK TIMES", EM ALBUQUERQUE

O senador John Kerry acabava de chegar, no sábado, a um comício no Estado do Oklahoma e estava animado: "George W. Bush achou que pudesse brincar de teatro num porta-aviões e que vocês não fossem perceber. A missão de quem já foi cumprida?". A multidão gritou de volta: "A dele". Kerry brincou: "Ninguém me disse que eu teria um público participativo aqui".
Durante muito tempo, Kerry não teve esse tipo de público, e vê-lo em campanha hoje serve para estudar o desenvolvimento de um candidato político e a psicologia das multidões. Kerry continua a dizer a maioria das coisas que vinha dizendo, mas, agora que ele é o pré-candidato democrata com mais chances de disputar a Presidência, as multidões estão reagindo da maneira como ele gostaria.
"O que vocês acharam do New England Patriots?", perguntou num comício em Albuquerque, anteontem, comemorando a vitória de seu time no Super Bowl. "É ótimo ver o pessoal da Nova Inglaterra ir ao Texas e ganhar. Isso cria um precedente muito bom." O Super Bowl foi disputado em Houston, no Texas.
Quando era menino, seu filme predileto era "Scaramouche", a história de um aventureiro na Revolução Francesa -que "nasceu com o dom do riso e o sentimento de que o mundo era louco". Durante o tempo em que era um menino solitário num internato na Suíça, um tenente da Marinha no delta do Mekong, no Vietnã, ou um senador por Massachusetts (e candidato à Presidência), Kerry raramente deixou de sentir que o mundo estava louco. Mas nem sempre o dom do riso lhe veio facilmente.
Mesmo hoje, ele jamais será visto como um sujeito muito simpático. É alto, magro e sério demais para isso. Dois anos atrás, os assessores de Kerry lhe mostraram fitas do senador John Edwards, com seu jeito extrovertido de falar, para tentar ajudá-lo a se abrir. Mesmo hoje, falta a Kerry a empatia natural que Bill Clinton possuía com as pessoas e as multidões. Mas, à medida que sua campanha ganha contornos nacionais, Kerry parece fazer reais progressos.
Em cada parada nova que faz em sua campanha, ao que parece, Kerry vem anunciando um novo apoio à sua candidatura. Em Albuquerque, foi o secretário da Justiça de Nova York, Eliot L. Spitzer. No sábado, em Oklahoma, uma voz o interrompeu: "Senador, sou o prefeito de Watonga, em Oklahoma, e eu também o apoio".
Sem hesitar, Kerry fez algo que teria sido praticamente impensável na sua fase de campanha desajeitada. Desceu do palco e abraçou Richard Hightower, o prefeito da cidadezinha vizinha, de 3.200 habitantes. Em seguida, levou-o ao palco e declarou: "Senhoras e senhores, eis meu simpatizante mais recente".
Mas nem tudo é brincadeira. Em Dakota do Norte, no sábado, quando discursava perante 600 pessoas, usando roupa casual, um homem mais velho que estava perto do palco caiu.
"Temos alguém desmaiado aqui", afirmou Kerry, descendo do palco. Momentos depois, ele disse com calma: "Senhoras e senhores, ele está bem. Ele é um veterano da Segunda Guerra e estava em pé havia tempo. Ele só precisa de um pouco de ar."
"O senhor deveria ser presidente!", gritou uma mulher.
É quase impossível dizer até que ponto a situação de Kerry melhorou por conta de seu próprio desempenho ou da repentina convicção de muitos democratas de que ele é a opção mais elegível hoje. O que é indiscutível é que ele começou a ser mais bem-visto pelas multidões.
Kerry ainda é capaz de iniciar suas frases com fórmulas ultrapassadas e ainda gosta de inversões retóricas que remetem a John F. Kennedy. Ele tem alguns tiques verbais, como dizer "literalmente" quando quer dizer "figurativamente".
Mas fala com uma convicção inabalável -e está conquistando cada vez mais seguidores.


Tradução de Clara Allain


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