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Conservador veterano vira "centrista" na campanha da França
Presidente de partido da base governista, ex-ministro François Bayrou desafia bipolaridade da política francesa
Conquistando eleitores em comícios no interior do país, o presidenciável da UDF ameaça tirar a candidata socialista do segundo turno
JOÃO BATISTA NATALI
DA REPORTAGEM LOCAL
François Bayrou, 55, é por
enquanto a única grande surpresa da campanha presidencial francesa. Ele aparece em
terceiro lugar em todas as pesquisas e ameaça com seu crescimento a segundo colocada, a
socialista Ségolène Royal.
Poderá disputar o segundo
turno com o candidato do bloco
de centro-direita, Nicolas Sarkozy, a quem a seguir derrotaria -e faria o mesmo com Ségolène, segundo o instituto BVA.
O primeiro turno das eleições é em 22 de abril; o segundo
turno, em maio.
Bayrou não chega a ser um
desconhecido. Já havia disputado as eleições presidenciais
de 2002. Chegou na quarta colocação, com 2 milhões de votos (6,8%). Tanto quanto agora,
apresentou-se como um "centrista", sem vínculos com a esquerda ou com a direita do presidente Jacques Chirac.
Mas não é bem assim. Ele foi
ministro da Educação entre
1993 e 1997, em governos chefiados por Édouard Balladur e
Alain Juppé, do mesmo bloco
que Chirac e Sarkozy. É deputado na Assembléia Nacional
desde 1988, com exceção de um
curto triênio com mandato no
Parlamento Europeu. Seu partido, a UDF (União pela Democracia Francesa), integra a base
parlamentar do premiê Dominique de Villepin, embora ele
tenha pessoalmente votado algumas vezes contra o governo.
Por tática ou convicção, Bayrou passou a considerar a UDF,
da qual é presidente desde
1999, uma espécie de terceira
via liberal. O partido, criado pelo ex-presidente Valery Giscard
d'Estaing (1974-1981), talvez
até tivesse essa vocação. Mas a
bipolarização da política francesa tem sido mais forte que a
debilidade das ideologias. A
UDF transporta o conservadorismo em seu código genético.
Mas Bayrou é um personagem singular. Não tem a sofisticação dos intelectuais ou tecnocratas parisienses. É um letrado do interior. Nasceu no sudoeste, perto da fronteira com a
Espanha. Formou-se em literatura e passou no dificílimo concurso da "agrégation", espécie
de cátedra do secundário.
Aos 23 anos já lecionava e tomava conta da pequena propriedade rural da família. É católico praticante, casado e tem
seis filhos e dez netos.
Num país que valoriza a erudição, é bem-visto porque publicou uma dezena de livros e é
um dos biógrafos do rei francês
Henrique 4º (1598-1610) -que,
pelo Édito de Nantes, deu liberdade de culto aos protestantes.
Consome muita literatura e
poesia. E também gosta muito
de cavalos. Tem um haras na
pequena fazenda que herdou.
Esse conjunto de atributos
não justifica suas crescentes intenções de voto. Sua candidatura cresceu com pequenos comícios de província. Os eleitores
acreditam que ele sabe ouvir.
Se eleito, promete governar
possivelmente com a coalizão
centrada na UDF, nos socialistas e na UMP, remotamente
herdeira de Charles de Gaulle.
Essa "união entre contrários", já existente na Itália, quebra tabus muito sólidos na política francesa depois de 1958,
data da Constituição da 5º República. É algo sedutor, mas
também gera temores.
Bayrou se identifica com o
eleitorado politicamente correto, adversário do racismo e da
restrição aos direitos dos gays.
Ele também vende a imagem
de uma França que não precisaria mexer na rede de proteção trabalhista para enfrentar
de modo competitivo a globalização -intenção atribuída a
Sarkozy.
Bayrou é um caso muito recente para se tornar objeto de
livros e ensaios. Mas já é, no mínimo, um caso interessante.
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