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São Paulo, sexta-feira, 04 de abril de 2003

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Mídia iraquiana é mais madura que americana, diz editor da Al Jazeera

FABIANO MAISONNAVE
DA REDAÇÃO

Desde o início da guerra, a disputa pela opinião pública mundial entre o presidente George W. Bush e o ditador Saddam Hussein tem sido quase tão importante quanto as batalhas.
No centro desse conflito está a rede de TV estatal Al Jazeera, do Qatar. Responsável pela transmissão de imagens de civis iraquianos mortos, prisioneiros de guerra e corpos de soldados americanos, a emissora mudou a imagem da guerra, principalmente se comparada com a Guerra do Golfo (1991), marcada pelas imagens de luzes verdes nos céus de Bagdá.
A audiência se multiplica junto com seus problemas. Ontem, dois jornalistas da emissora foram proibidos de transmitir da capital por ordem do governo iraquiano. No dia anterior, o hotel de onde a emissora transmitia em Basra, no sul do Iraque, fora atacado por mísseis americanos.
Em entrevista à Folha, Abdulaziz al Mahmoud, 42, editor-chefe do site Aljazeera.net (cuja versão em inglês está fora do ar após ser atacada por hackers), disse que sua empresa é independente e que a mídia iraquiana é mais "estável e madura" do que a americana. A seguir, trechos da entrevista feita por telefone a partir do Qatar.
 

Folha - O site em inglês da Al Jazeera ficou no ar durante apenas um dia. Um de seus editores acusou o Pentágono pelo ataque. Há alguma evidência disso?
Abdulaziz al Mahmoud -
Não, ele não deveria ter afirmado aquilo. Não há nenhuma evidência de quem atacou o nosso site.

Folha - Bush e o premiê Tony Blair reclamaram da cobertura da Al Jazeera. De que forma essas pressões afetam o trabalho diário?
Al Mahmoud -
Estamos sob uma enorme pressão, mas a política da Al Jazeera é mostrar a guerra de ambos os lados. Mostramos prisioneiros de guerra iraquianos sendo maltratados por soldados britânicos, corpos mutilados de crianças, mas também mostramos o outro lado da guerra, até mesmo prisioneiros de guerra e soldados americanos mortos.

Folha - Muitos analistas ocidentais consideram que os EUA estão perdendo a "guerra da propaganda" contra o Iraque e que a Al Jazeera tem um papel fundamental nisso. O sr. concorda?
Al Mahmoud -
Eu entendo esse ponto de vista. No início do conflito, eles disseram que havia um levante em Basra. Nosso correspondente na cidade entrevistou várias pessoas, andou pelas ruas e não encontrou nada contra Saddam Hussein. Isso mostra que eles mentem.

Folha - Ao se contrapor à estratégia americana, o sr. concorda que isso favorece o Iraque?
Al Mahmoud -
Não, se o Iraque mentir, nós mostraremos. Se o Iraque disser que os EUA estão a 100 km de Bagdá, mas estiverem a 50 km, nós mostraremos isso.

Folha - Como o sr. analisa a cobertura da mídia americana?
Al Mahmoud -
O patriotismo está em alta nos EUA, veja o que aconteceu com Peter Arnett, despedido depois de conceder entrevista à TV iraquiana, que não é nenhuma área proibida. Se alguém é entrevistado pela CNN ou BBC, também é expulso pelo governo iraquiano? Nesta guerra, a mídia iraquiana está mais estável e madura do que a mídia americana.

Folha - A Al Jazeera pertence ao governo do Qatar, que apóia os EUA. Como é a relação entre a emissora e o governo?
Al Mahmoud
- O governo não interfere na emissora, pois sabe que o sucesso da Al Jazeera vem disso.


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